Conselho Internacional de Museus decidiu adiar votação de polémica definição de museu
O ICOM é uma organização não governamental, criada em 1946, dedicada à preservação e divulgação do património natural e cultural mundial, tangível e intangível
Mais de metade dos membros do Conselho Internacional de Museus (ICOM em inglês) decidiram sábado, em Quioto, no Japão, adiar a votação de uma polémica definição de museu com o objetivo de promover mais debate e atingir um consenso.
Contactado pela agência Lusa, Luís Raposo, presidente do ICOM-Europa, que participou na assembleia geral do ICOM-Mundial, revelou que 70,49% dos membros votaram a favor do adiamento da controversa definição.
A proposta, apresenta pela presidência do ICOM-Mundial, foi publicada em meados de Agosto no sítio ´online´ do ICOM Portugal e introduz novos conceitos, nomeadamente de “dignidade”, “transparência”, “inclusivo”, e “igualdade”, que vão para além do modelo vigente, com mais de cinco décadas.
Estava previsto que a definição - que tem estado a gerar controvérsia e a dividir o setor - fosse votada hoje, último dia da conferência geral do ICOM, a maior organização internacional de museus e de profissionais de museus, composta por comités nacionais de 118 países membros.
Luís Raposo disse à Lusa que, na assembleia geral de ontem, 396 optaram por adiar a votação e 157 por votar já: “Tratou-se de uma assembleia geral muito viva, muito participada, que durou quatro horas até à votação final”, comentou o arqueólogo português.
Reeleito esta semana para um segundo e último mandato no cargo, Luís Raposo tem sido porta-voz de um movimento no seio do ICOM que propôs o adiamento da discussão e votação da proposta.
O ICOM é uma organização não governamental, criada em 1946, dedicada à preservação e divulgação do património natural e cultural mundial, tangível e intangível, através de orientações de boas práticas seguidas por mais de 44 mil membros em todo o mundo.
“Nós apresentámos uma moção a pedir que essa votação fosse adiada pelo menos um ano, para que os membros do ICOM pudessem apresentar outras propostas, já que o assunto é muito complexo, e a nova definição não é consensual”, disse o museólogo, acrescentando que a proposta podia, a ser aceite, “criar uma situação bastante negativa de divisão” na instituição.
Um grupo de 28 países, incluindo Portugal, e também a Alemanha, França, Irão, Canadá, Argentina e Espanha, entre outros, apresentou a moção que pediu esse adiamento.
A proposta de adiamento hoje aprovada dá indicação ao conselho executivo do ICOM de promover mais debate, tenho em conta as observações feitas na assembleia geral e reunir nova assembleia extraordinária logo que possível, tendo em vista alcançar consensos.
De acordo com Luís Raposo, há uma proposta para que decorra em Paris, em junho de 2020.
“Penso que tomámos a decisão mais acertada, aquela que é suscetível de preservar a unidade do ICOM e de reforçá-lo na sua independência, profissionalismo e luta pela democracia cultural em todo o mundo”, sustentou.
“A nossa ideia é também fazer alterações à atual definição, mas não tão radicais”, disse, defendendo que “a nova definição deve continuar a centrar-se na missão primordial dos museus, que é a sua atividade original, e não estar carregada de ativismo e ideologia”.
A nova definição de museu surgiu da iniciativa da atual presidente do ICOM Mundial, a museóloga turca Suay Aksoy, que, depois de tomar posse, criou um grupo de trabalho com o objetivo de pensar em perspetivas do futuro dos museus, ao nível do pensamento estratégico.
Sobre este processo, e sobre a votação de hoje, numa declaração inscrita no sítio ´online´ desta organização não governamental, a presidente Suay Aksoy, considera que este foi “um dos mais democráticos processos na história do ICOM”.
“A discussão continua, e o trabalho com os comités internacionais e internacionais vai prosseguir com a implementação e assimilação de novas ideias que irão, provavelmente, surgir na nova definição que será proposta”, indicou.
Para Suay Aksoy, que se empenhou nesta mudança, a votação de hoje “não é o fim, mas apenas outro início neste processo de redefinição”, e apelou a todos os membros que participem.
Suay Aksoy defende que “é responsabilidade do ICOM estar atento aos desenvolvimentos sociais, políticos e económicos, e ter em consideração os muitos desafios atuais e futuros dos museus”.
Acrescenta que a presidência executiva lançou a proposta de redefinição do que é um museu devido à “necessidade de uma atualização, que a ajuste aos tempos atuais”.
O grupo de trabalho proposto pela presidência mundial dedicou-se durante dois anos no projeto, realizando centenas de sessões informais e recebeu mais de 250 propostas anónimas, “sobretudo com teor mais ativista do que técnico, e, além disso, os comités nacionais do ICOM nunca foram formalmente consultados”, criticou Luís Raposo em declarações anteriores à Lusa, para justificar a oposição.
A actual definição de museu, que data dos anos 1970, diz que “o museu é uma instituição permanente sem fins lucrativos, ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, investiga, comunica e expõe o património material e imaterial da humanidade e do seu meio envolvente com fins de educação, estudo e deleite”.