Os insatisfeitos do sofá
A inteligência artificial que promete uma nova revolução na sociedade, quando mal utilizada, é mais um passo para a desvirtuação
A comunicação e as notícias disseminam-se em segundos. No bom e no mau. Talvez por isso seja comum hoje em dia dizer que o maior luxo é passar despercebido. Ser-se discreto. É tal a força da palavra, do que é escrito e que fica, do que se diz e do diz que disse que fomos aprendendo a ser cautelosos no discurso. Num mundo carregado de fake news, de invenções e deturpações da realidade é muitas vezes muito ténue a linha que separa o que é verdadeiro do que é falso, do que se passou mesmo assim ou foi fabulado. A inteligência artificial que promete uma nova revolução na sociedade, quando mal utilizada, é mais um passo para a desvirtuação, para a montagem e a disfunção da realidade. São os tempos que correm e aos quais temos que nos adaptar. A verdade é que quem tem uma imagem pública, está permanentemente sujeito ao escrutínio chegando por vezes ao ponto da devassa da sua vida privada. Pouco importam os meios para se atingirem os fins desejados e atropelam-se todos os fundamentos e valores para se conseguir algum destaque ou promoção.
É por isso tão importante para quem se expressa publicamente mas também para quem assume posições de relevo em empresas ou instituições a facilidade ou indiferença com que se convive com a crítica. É aliás parte fundamental para o sucesso e para a própria sanidade mental, saber diferenciar aquilo que são críticas construtivas, opiniões fundamentadas ou pontos de vista diferentes, é assim que se constrói e desenvolve uma sociedade, através da discussão e do debate de ideias. Outra coisa bem diferente são aqueles que usam e abusam da ofensa pessoal, da destruição da imagem dos outros só pelo gozo ou para conseguirem esconder frustrações ou falta de interesse de vidas sensaboronas e desinteressantes. As redes sociais permitem muito isso, com a vantagem de se poderem escudar atrás de perfis falsos ou de personagens inventadas. É o tempo dos que não assumem as suas posições e que se refugiam na crítica gratuita fugindo à responsabilidade dos seus próprios atos e dos exércitos de bots que mais não são do que identidades inventadas com o propósito de espalhar falsidades e de inquinar a opinião pública através de comentários e publicações com um intuito bem definido.
São os insatisfeitos do sofá e os que se escondem atrás de computadores que pouco mais fazem do que criticar e estabelecer narrativas sobre a vida dos outros, criar histórias e invenções, desculpando assim parte dos seus próprios fracassos e insucessos. Há quem passe parte da sua vida apenas e só focado no que os outros fazem, encontrando aí motivação para as suas próprias vidas. Isso faz com que seja cada vez mais complicado darmos a nossa própria opinião sobre os temas, sobretudo os fraturantes. Porque a sociedade se encontra cada vez mais extremada e porque através do ódio e da vontade em mandar abaixo só porque sim, instiga alguns revoltados a lançar suspeitas e atoardas só com o intuito de desestabilizar.
A vacina para isto é desprezo e indiferença. Não deixa no entanto de ser estranha a forma como as pessoas criam ódios por outras que nem conhecem só porque têm uma opinião diferente. A rede social X (antigo Twitter) é o exemplo máximo do que escrevo. É um destilar de ódio permanente entre uns e outros, hordas de carneiros a tentar rebentar com a imagem de quem não conhecem, notícias falsas a rodos e ofensas pessoais, lançando suspeitas e expondo informações da esfera privada prejudicando e rotulando.
E esse rótulo por vezes fica, por muito que não seja verdade. E há quem fique
com a vida estragada à conta desse tipo de mentiras que de tanto serem ditas se tornam verdade.