Será que deixou de ser tão compensador para um alemão vir viver para a Madeira?
O canal de televisão alemão ZDF emitiu anteontem uma reportagem que segue o percurso de Nina e Heiko, dois jovens daquele país que se mudaram para a Madeira depois da pandemia de Covid-19. O programa analisa a forma como a nossa ilha se tornou popular como destino de nómadas digitais e descreve os maiores desafios que se colocam nesse processo de mudança, com especial incidência nos custos da habitação. Jessica Szczakiel, autora do documentário, optou por colocar uma pergunta como título do seu trabalho – “Glücklich auf der Insel?”, que se pode traduzir como “Feliz na ilha?”. Isto porque concluiu que só com um bom salário é possível ter uma vida realmente agradável na Madeira. “O custo de vida e os alugueres na ilha aumentaram acentuadamente e são quase tão altos quanto na Alemanha. As casas e apartamentos são agora tão inacessíveis para muitos habitantes locais como para muitos recém-chegados”, lê-se na apresentação da reportagem. Será que é mesmo assim?
A reportagem da ZDF incide bastante sobre os custos da habitação, já que é a principal despesa das famílias. Para comparar a evolução dos preços do aluguer nas maiores cidades alemãs com a realidade regional, desde o período da pandemia até ao ano passado, recorremos a dados de diferentes fontes, com a maior fiabilidade possível – a Direcção Regional de Estatística e o site Statista.com, que recolhe informação junto de relatórios oficiais e comerciais. Optámos por definir um apartamento com 60 metros quadrados como medida-padrão e ter como referência sete grandes cidades alemãs (Berlim, Colónia, Düsseldorf, Estugarda, Frankfurt, Hamburgo e Munique).
Assim, verifica-se que, em 2024, na Alemanha, o preço médio do aluguer de um apartamento com as referidas características variava entre os 752 euros de Düsseldorf e os 1.163 euros de Munique. Já na Madeira, o preço médio do aluguer do mesmo imóvel rondava os 640 euros. No entanto, no Funchal, o preço médio subia para 762 euros por mês, ou seja, mais elevado do que a cidade de Düsseldorf e com valores muito próximos das médias praticadas em Hamburgo (784 euros) e Colónia (790 euros). A média do aluguer da mesma habitação em Portugal era de 480 euros.
Na evolução dos preços no período compreendido entre os anos 2020 e 2024, o custo do aluguer no Funchal aumentou cerca de 88% (passou de 406 euros para 762 euros). A nível de toda a Madeira, registou-se igualmente um agravamento substancial – de 355 euros para 640 euros, o que corresponde a mais 80%. Já a nível de Portugal, o aumento do aluguer foi de 45,5%.
Nas sete cidades germânicas o custo do aluguer teve a seguinte evolução no mesmo período: Berlim +47%, Colónia e Düsseldorf +15%, Hamburgo e Munique +14%, Frankfurt +12% e Estugarda +11%.
Na análise a esta questão há ainda que ter em conta a evolução dos rendimentos dos trabalhadores nas duas realidades em causa. O salário mínimo na Alemanha passou de 1.544 euros no ano 2020 para 1.985 euros em 2024, o que representa um aumento de 29 por cento. No mesmo lapso temporal o salário mínimo na Madeira passou de 651 euros para 850 euros, no que se traduz numa subida de 31 por cento. Ou seja, a evolução do salário mínimo de um alemão foi superior ao agravamento do valor das rendas médias a pagar por um apartamento nas principais cidades do seu país (a única excepção será Berlim), mas não cobre o nível de actualização registado no mercado de arrendamento da Madeira.
Tendo em conta exclusivamente as evoluções das rendas médias no mercado de arrendamento de habitação e dos níveis dos salários mínimos, é natural que haja uma alteração na percepção que os alemães têm sobre o custo de vida na Região e, objectivamente, deixou de ser tão compensador para um cidadão daquele país vir viver para o nosso arquipélago.