Uma ministra com inteligência artificial
Faleceu Ana Nunes, uma das pessoas mais humanas com quem trabalhei. Faltou tomar aquele café, sempre adiado, prometido em conversas de rua quando nos cruzávamos em ritmo acelerado na cidade. Faleceu uma das médicas mais competentes que esta terra viu nascer, que sempre elegeu os cuidados primários como a sua principal batalha, mesmo que isso significasse ir contra as direções clínicas a que pertenceu. Teria dado uma excelente ministra da Saúde. Sempre com um sorriso, sabia dar murros na mesa quando era necessário. Faria certamente um papel muito melhor do que a atual responsável, que adora linhas telefónicas e acha que a saúde se resolve com experiências até ver se dá certo. Não fosse a senhora farmacêutica.
O mais caricato é que esta ministra presidiu ao Instituto de Saúde Baseada na Evidência (ISBE). Mas não é por demais evidente que a saúde em Portugal está em coma?
De que evidência precisa a senhora para perceber que isto não vai lá com telefonemas? Qualquer dia ainda tem a ideia peregrina de solicitar aos doentes que em vez de telefonarem entrem em grupos de wattsapp ou telegram. Este último é fantástico para quem tem falta de vista. Não se vê um boi.
A ministra, que provavelmente só por bênção do avental ainda não foi substituída, mostrou que ter presidido a um instituto que se baseava na evidência ensinou-a que a Inteligência Artificial (IA) era o futuro do INEM. Espero que não use uma versão gratuita do ChatGpt, porque esse muitas vezes fica com a resposta a meio e não dá jeito nenhum numa emergência médica. Imagine-se o chat sugerir que a pessoa deve dirigir-se ao centro de saúde “acompanhado da sua me… para os médicos saberem o que toma”. Pronto, o que para uns pode significar medicação, para outros pode significar levar as suas fezes. Isto, se tiver sorte de o Centro de Saúde estar aberto.
Antes de sair de casa, o melhor é ver os telejornais, porque fazem sempre especiais com os horários de funcionamento das unidades de saúde e das urgências. Ao que isto chegou.
Outra das medidas é aumentar o número de elementos do Conselho Diretivo do Instituto de Emergência. Deve ter sido resposta da IA quando a senhora escreveu: “dá-me duas ou três soluções para deixarem de me chatear com o INEM que sejam divertidas e façam as pessoas rir”. Satisfeita com as propostas, foi a correr ao Parlamento explicá-las. Umas linhas telefónicas resolvem a questão, mas é preciso que a IA distinga sotaques. Como aquilo é feito para lisboetas, os nortenhos e os algarvios que se cuidem ao falar.
Felizmente os madeirenses e os açorianos ainda não têm essas modernices, senão morríamos todos.
Já agora, só um conselho. Se uma estrangeira africana quiser vir ter uma criança a Portugal, como tem acontecido, o melhor é ter um telefone com dados móveis e gps, para não se enganar na maternidade do dia. Como muitas nem conhecem o país, ainda se arriscam a ter o pequeno no Uber conduzido por um asiático que não fala a nossa língua, perdido na capital.