DNOTICIAS.PT
Crónicas

Eu acuso

À Madeira, o meu “Jacus”

Exmo. Senhor Presidente do Governo Regional da Madeira,

Dirijo-me a Vossa Excelência com o espírito inquieto de quem não pode mais tolerar o espectáculo decadente em que se converteu a governação desta Região. A Madeira, terra de beleza ímpar, tornou-se palco de uma tragédia política, orquestrada por quem deveria protegê-la, mas que insiste em devorá-la com a voracidade dos que já não distinguem serviço público de interesse pessoal.

Eu acuso Vossa Excelência de perpetuar um regime de aparências, que se sustenta em promessas vãs e na manipulação dos sonhos do povo. Promete-se progresso, mas entrega-se estagnação. Eu acuso o Governo Regional de hipotecar o futuro da Madeira em prol de uma máquina eleitoral insaciável, alimentada por dívidas colossais que os nossos filhos e netos terão de pagar.

Eu acuso o clientelismo endémico que domina as instituições públicas desta Região. Uma terra que deveria ser um exemplo de meritocracia é, em vez disso, um feudo de favores, onde a competência é frequentemente suplantada pela lealdade partidária. Eu acuso a captura do aparelho de Estado por uma elite que governa para si mesma, deixando migalhas para os restantes.

Eu acuso a falta de transparência na administração pública. Acuso os contratos obscuros, os concursos viciados e a incapacidade de prestar contas aos madeirenses. Por que motivo as decisões mais importantes continuam a ser tomadas nas sombras, longe do escrutínio dos madeirenses? Por que a falta de transparência persiste?

Eu acuso a gestão teatral da Saúde. Acuso o Governo de fazer das prioridades uma questão de conveniência eleitoral e não de necessidade social, de não usar com desvelo toda a capacidade instalada de modo a servir com qualidade a saúde dos madeirenses. Eu acuso a gestão politizada do Serviço Regional de Saúde, onde decisões críticas são frequentemente pautadas por interesses partidários e não pelas reais necessidades dos doentes e dos profissionais de saúde.

Eu acuso a ausência de programas de apoio adequados para cuidadores informais, que enfrentam jornadas intermináveis e sacrifícios pessoais para cuidar de familiares sem receberem o suporte necessário por parte do Governo.

Eu acuso a falta de planeamento para uma população cada vez mais envelhecida, eu acuso a demora inaceitável nas listas de espera para consultas, cirurgias e meios de diagnóstico, eu acuso a incapacidade de fixar médicos e profissionais de saúde na Região. Eu acuso a indiferença para com a saúde mental dos madeirenses, tratada como um problema menor ou inexistente. A Madeira sofre, e os governantes não ouvem.

Eu acuso o desrespeito pelas condições de trabalho dos profissionais de saúde, que enfrentam jornadas extenuantes, remunerações inadequadas e a falta de reconhecimento que os desmotiva e leva muitos a abandonar o sistema público. Acuso a passividade perante o aumento do consumo de substâncias aditivas e as suas consequências devastadoras para a saúde pública, uma crise que exige respostas imediatas e integradas.

Eu acuso Vossa Excelência de tratar a Educação como um adereço, algo que se exibe nas estatísticas, mas que se negligencia no terreno. Escolas sem autonomia, degradadas, professores desmotivados, alunos sem esperança. Quem lhes explicará, no futuro, que foram abandonados em nome de um fogo de artifício que durou apenas minutos?

Eu acuso a falta de estratégia económica que transforma os jovens em exilados. Cada geração perdida é uma ferida aberta na Madeira, uma traição ao seu futuro. Eu acuso a política de subsídios que acomoda o presente enquanto aniquila qualquer esperança de independência económica.

Eu acuso o desrespeito pelos pequenos empresários e produtores, sufocados por um modelo económico que privilegia grandes corporações e interesses externos. Onde está o apoio ao comércio local, à agricultura sustentável, aos artesãos que moldam a identidade da Madeira?

Eu acuso a falta de uma visão de longo prazo, que permita planear para o futuro e não apenas reagir às crises do presente. Acuso o Governo de viver de improvisos, alimentando um ciclo interminável de soluções temporárias que só agravam os problemas estruturais da Região.

Eu acuso a omissão no combate à violência doméstica, ao abandono de idosos e à exclusão social. Acuso a ausência de políticas robustas que protejam os mais vulneráveis, deixando estas pessoas ao sabor de caridade ocasional e da invisibilidade institucional.

Eu acuso a política de transportes, que mantém os madeirenses reféns de um sistema insuficiente e caro. Acuso uma mobilidade sem sentido que nos amarra ao paraíso, sem nos facultar a mais do que merecida facilidade de aproveitar a continuidade territorial. Um sistema de apoio à mobilidade aérea que complica mais do que facilita, uma mobilidade marítima inexistente, uma mobilidade terrestre que está longe de ser a que os madeirenses merecem.

Eu acuso o desrespeito pela nossa cultura, transformada em mercadoria para turistas, continuamente a confundida com entretenimento, enquanto as tradições autênticas e a identidade madeirense são desfiguradas em nome de uma estética comercial. Eu acuso o desinteresse pelo património histórico da Madeira, que se deixa degradar ou vende ao melhor licitante. Acuso o Governo de permitir que edifícios históricos se transformem em ruínas ou se abastardem, enquanto o betão avança sobre a memória coletiva da Região.

Eu acuso a incapacidade de enfrentar a desertificação, o abandono das nossas zonas rurais, a destruição do património natural em nome de um desenvolvimento que só serve a especulação imobiliária. Acuso a negligência com que a agricultura e a pesca, pilares da nossa identidade, são tratadas, deixando comunidades inteiras entregues ao desespero e à emigração.

Eu acuso o seu Governo de transformar a sustentabilidade ambiental numa bandeira vazia, enquanto aprova projectos que devastam ecossistemas e comprometem as gerações futuras.

Eu acuso a cultura do medo instaurada, onde a crítica é abafada, onde o poder intimida os que ousam discordar. Acuso as práticas autoritárias que colocam o Governo acima do povo, como se este último não fosse soberano, mas servo. Eu acuso o silêncio cúmplice de uma oposição fraca, que deveria ser o bastião da democracia, mas que se limita a existir, apática, nos interstícios do regime.

Acuso a manipulação das inseguranças individuais para intimidar quem ousa pensar diferente, espalhando a ideia de que criticar é sinónimo de traição ou ingratidão. Eu acuso o uso do aparelho do Estado como arma para ameaçar adversários políticos, cidadãos insatisfeitos ou vozes incómodas, transformando a democracia numa caricatura onde o debate é substituído pela intimidação. Acuso a perpetuação de uma narrativa de dependência, onde se insiste que fora do atual regime não há alternativa, como se a Madeira fosse refém de quem hoje governa, incapaz de prosperar com ideias novas e lideranças diferentes.

Eu acuso a instrumentalização do medo económico, usada para condicionar populações mais vulneráveis, fazendo-as crer que questionar o é arriscar perder os escassos apoios a que têm direito.

Eu acuso a exploração do patriotismo madeirense para mascarar as falhas gritantes do Governo. A identidade da Madeira é usada como bandeira para justificar desmandos, como se amar esta terra fosse aceitar a sua pilhagem. Acuso o uso indecoroso da propaganda para perpetuar uma narrativa falsa de progresso, enquanto a Madeira real se afunda na desigualdade.

Eu acuso a banalização da cultura democrática, transformada numa pantomina de aparências. As eleições não são mais do que um ritual de confirmação de um poder viciado, onde o pluralismo é uma ilusão e o debate público é reduzido a um eco vazio.

Acuso Vossa Excelência de governar para as elites, esquecendo aqueles que mais precisam. A pobreza, que deveria ser combatida com todas as forças, é ignorada enquanto as festas e os eventos brilham nos orçamentos. Acuso o Governo de ignorar os sem voz, os que trabalham incansavelmente e nada recebem em troca.

Acuso a manipulação da memória coletiva, que insiste em reescrever a história para glorificar os governantes de hoje e apagar as lutas daqueles que, no passado, ousaram desafiar o “status quo”.

Eu acuso, por fim, o Governo Regional de confundir liderança com controle, de governar através do receio e não da confiança, de não respeitar o povo da Madeira. Esta política do medo é uma ferida aberta na democracia madeirense, e é hora de curá-la com coragem, transparência e liberdade.

Senhor Presidente, a Madeira merecia mais. Merecia um governo digno, à altura do seu povo e do seu potencial. Merecia uma liderança corajosa, capaz de enfrentar os desafios do presente sem sacrificar o futuro. Mas o que temos é uma governação que brilha no efémero e apodrece no essencial.

A História não se calará. Os madeirenses não se esquecerão. E eu não deixarei de acusar. A verdade, tal como Zola proclamou, está em marcha. E nada, nem luzes artificiais, nem discursos vazios, poderá detê-la.

Viva a Madeira, Viva a verdade — livre de opressão, de corrupção e de mediocridade!