O nevoeiro paira no Ano Novo
Refletir sobre a instabilidade política da Madeira (iniciada há quase um ano), neste Mundo cada vez mais volátil, soa a um bairrismo ensimesmado de curtos horizontes. Contudo, nós, que após 50 anos de Autonomia monocromática, observamos a sua notória erosão, devemos dispensar algum pensamento, a esse mito estilhaçado, sedento de alternância. Talvez por isso, no discurso do Ano Novo por parte do Presidente da República, a Madeira nem mereceu uma breve ou subtil referência, por parte da incontinente jactância verbal do Dr. Marcelo, que mantém no Conselho de Estado, o protagonista da instabilidade madeirense.
Eu gosto de eleições e tolero a democracia. Da mesma forma que a democracia me tolera, resignada, nestas linhas. Nem sempre me vejo representado, mas isso, certamente deve-se ao meu mau feitio, que o recente tempo pré-natalício do Advento, não conseguiu ainda, me moldar. A instabilidade política madeirense já é mais previsível, que o nevoeiro da Choupana. Há madeirenses fartos de políticos, que alegadamente se servem da política para proveito próprio, ou da sua tribo, eternizando-se na sua bolha de privilégios e imunidades.
Foi o que povo expressou representado na Assembleia Regional no passado dia 17 de dezembro, ao viabilizar a Moção de Censura ordenada a partir de Lisboa, perante a sonsa apatia dos agentes políticos locais, que a Autonomia de meia-idade ainda não os emancipou. O parlamentarismo também funciona sem as maiorias absolutas, que mal nos habituaram, por quase meio-século.
Não é razoável ou admissível, que estejam mais de 250 mil portugueses no meio do Atlântico, há quase um ano, reféns de interesses do principal epicentro da desestabilização, chamado Miguel Albuquerque na qualidade de Presidente do Governo Regional da Madeira.
A etimologia da “ética” no exercício das funções políticas, não se compadece com o princípio jurídico da presunção de inocência, nem com o (cada vez mais curto) respaldo popular do “tribunal” do sufrágio eleitoral.
Este enunciado moral não está vertido em qualquer regulamento, mas, foi acolhido pelo próprio Dr. Albuquerque, quando em novembro de 2023, instado a comentar a demissão de António Costa (que nem arguido era), afirmou que a sua demissão era «inevitável (…), sendo muito difícil o Primeiro-Ministro continuar a governar».
Passa já da hora do Dr. Albuquerque se afastar, e de se concentrar na sua defesa como qualquer mortal. Os cemitérios estão cheios de insubstituíveis que, apesar de sucumbidos pela morte, alguns, foram pela sua fé, resgatados. A Páscoa da ressurreição ainda está distante, mas o Carnaval eleitoral já batuca no horizonte enublado num repetitivo “déjà-vu”.
Eu, enquanto insuspeito opositor do “Bloco Central”, anseio que, (dada a instabilidade das lideranças partidárias que por aí se vivem), haja um interregno suficiente na calendarização das prováveis eleições regionais, para que, PSD e PS se apresentem na linha de partida, de face lavada e sem compadres desavindos, a medir lâminas nas costas uns dos outros. Se querem mesmo comemorar os 50 Anos da Autonomia, troquem o novo feriado de abril, por uma insuspeita estabilidade, e dissipai logo, este prolongado e teimoso nevoeiro de incertezas.