Heróis
Segundo o dicionário, herói, no conceito tradicional, é alguém reconhecido pela sua coragem e força de carácter, capaz de cometer feitos notáveis, que o imortalizam.
Desde sempre se recorreu aos heróis para explicar e ilustrar a História. Fosse Viriato, Nuno Álvares Pereira, Afonso de Albuquerque ou mesmo o soldado Milhões, houve sempre uma necessidade de heróis para alimentar a nossa imaginação e para inspirar a juventude. Daí os apontar como exemplo a seguir, como fazem os educadores.
Talvez por desgaste do conceito, tem vindo a aparecer, desde o Cinema e TV à Banda Desenhada, uma nova figura: o Super-Herói. Normalmente alto e espadaúdo, escassamente vestido, ostentando músculos salientes (desconhecidos dos compêndios de Anatomia), capaz das mais inverosímeis proezas, faz as delícias das camadas jovens, e não só.
Esse arquétipo quase nunca corresponde aos heróis reais. A título de exemplo, Napoleão tinha 1,57 m de altura; se fosse hoje, nem teria entrado numa Academia Militar.
Essa fixação tem também raízes na tradição greco-latina, a dos deuses e semideuses que povoam a literatura clássica, dos quais o mais conhecido é Héracles/Hércules. Para não falar de fenómenos mais recentes, como a invenção do super-homem, imaginado pelo filósofo Friedrich Nietzsche e levado à prática pela ideologia nazi, através do modelo ariano, representante do Herrenvolk, o Povo de Senhores, com os resultados que se conhece.
Pois o dia-a-dia traz-nos outras perspectivas, e novos e diferentes heróis vão surgindo, nomeadamente aqueles que não enfrentam exércitos nem matam dragões, mas fazem face a inimigos igualmente perigosos. Entre eles, os grandes deste Mundo, que não gostam de ser contrariados.
Há dias, o recém-empossado Presidente Donald Trump esteve presente num acto religioso na Catedral Nacional de Washington, celebrado pela bispa Mariann Edgar Budde, da Diocese Episcopal de Washington (Igreja da devoção do Presidente, como se sabe). Na homilia, a bispa ousou discordar do novo líder sobre a legislação saída contra pessoas LGBTQ+ e sobre migrantes e outros desfavorecidos. “Tenha misericórdia”, disse a bispa, falando mesmo do medo que, segundo ela, é sentido em todo o país.
Ficou a imagem para a História daquela figura frágil, feminina, vulnerável, antítese do herói clássico, mas com a coragem e a firmeza que os candidatos a super-heróis não costumam ter.
Não gostou o visado, que declarou que “Ela e sua Igreja devem um pedido de desculpas”. Ainda assim, melhor que o deputado republicano Mike Collins, da Geórgia, que escreveu: “A pessoa que faz este sermão deve ser adicionada à lista de deportações”.
Fim de citações.
Mas este triste episódio tem um lado bom.
Permite aos educadores ter um herói real, humano e próximo, capaz de servir de exemplo aos seus educandos.