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Porque mudaste, Cafôfo?

No final da Comissão Regional do PS de domingo, Paulo Cafôfo, em declarações à imprensa, perguntou porque “mudei de opinião”. Não tenho como não devolver a pergunta.

Em dezembro, assinei uma carta aberta neste jornal, dirigida a Cafôfo, em que assinalei a circunstância da discussão interna estar-me completamente vedada, restando-me a intervenção pública para defender aquilo em que acredito. Sexta, após o anúncio da marcação da Comissão Regional que discutiria “eleições” internas e considerando a sua excecionalidade, solicitei, por várias vias, que me fosse dada a oportunidade de lá estar, que me foi negada, porque, segundo Cafôfo, “o PS não é a casa da Maria [diz-se mãe] Joana” - o mesmo Cafôfo que, em 2019, participou, ainda como independente, na Comissão Política Regional de 9 de outubro, por minha sugestão e a convite de Emanuel Câmara, em que acabaria por anunciar a sua candidatura à liderança do PS - insisto, ainda como independente -, como noticiado no dia seguinte nas páginas deste Diário. O mesmo Cafôfo que, à saída da reunião de domingo, repetiu que “os militantes têm direitos, mas não têm o direito de criticar na praça pública e nos jornais o partido e, quando deveriam participar nas reuniões, como estas, não participam e não dão a sua opinião internamente”, negou essa oportunidade a quem preferiu ofender, interna e externamente, à vontade e sem direito de resposta. O Cafôfo de 2019, que anunciou a sua candidatura a líder do PS um mês antes de se tornar militante do partido, não era tão rigoroso no cumprimento dos estatutos como alega ser hoje.

Cafôfo mudou de opinião sobre os direitos de participação nas reuniões do PS, mas não ficou por aí. Na sequência do anúncio de “eleições” internas, fiz mais um pedido: que, considerando a sua excecionalidade - marcadas a menos de 20 dias da sua realização e com apenas 9 para se prepararem candidaturas a Presidente e a 300 delegados ao Congresso -, fosse permitida a participação de todos os militantes, dispensando-os do pagamento de quotas - exatamente o mesmo que Cafôfo defendeu na sua primeira eleição. Cafôfo mudou de opinião e agora é contra: em 2020, era a favor, porque queria muito ser eleito o Presidente do PS com mais votos de sempre; em 2025, é contra, porque só assim garante o controlo total de um partido cada vez mais unânime à sua volta.

Cafôfo mudou de opinião e fez mais ainda: apesar de ter recusado a minha participação, não se coibiu de, dentro e fora da sala, entre outros insultos, lançar a narrativa de que eu teria “ameaçado impugnar as eleições de 2020” - que ajudei a organizar, como secretário-geral do partido. Uma alucinação que dispensa clarificação.

Qualquer um compreende a fragilidade da argumentação de Cafôfo - que não convocou “eleições”; convocou um simulacro de democracia, um plebiscito à sua liderança, que pretende ver “reforçada”, não clarificada em eleições sérias, convocadas a tempo e abertas à participação de todos os militantes. Cafôfo fê-lo agora, não só a pensar nas regionais de março, mas também nas autárquicas de outubro, que pretende condicionar decisivamente. Para Cafôfo, as regras são boas - mas só as suas e para os outros. O mesmo homem que tem sobre a militância e a atividade política a visão redutora de que “nenhum militante tem o direito de falar dos resultados do PS, quando não contribui absolutamente nada para a melhoria desses resultados, porque não participa nem em campanhas eleitorais, nem em eventos”.

Cafôfo foi eleito em 2020 numa eleição adiada duas vezes, em 2023 numa eleição antecipada e em 2025 numa “eleição” relâmpago. Chama-lhe “democracia”, mas o que parece mesmo é a casa da mãe Joana, que funciona ao gosto do freguês. Pelo meio, quando se demitiu em 2021, acusou, neste Diário, Miguel Gouveia de ser o único responsável pela derrota no Funchal e a mim de ser “conspirador”; agora, acusa todos os que dele discordam de fazerem “o jogo do PSD” - como se alguma vez eu fosse aceitar esse recado vindo de alguém com menos de metade dos meus anos de militância no PS. Menos de metade.

Cafôfo terá novamente oportunidade de escolher os seus órgãos internos e, depois disso, os candidatos às eleições que contam: as regionais. Foi Cafôfo que disse, este domingo, que, “com a realização das eleições internas, estão criadas as condições para que o futuro presidente do partido possa ser ganhador numas eleições decisivas para a Região”. Estou certo de que assim será e que, depois disso, Cafôfo poderá dar continuidade ao seu “projeto político para 4 anos” à frente do PS. Ou para 10. No fundo, os que quiser - porque, com a conivência de tantos, por ação e omissão, o partido é todo e só seu. Adiante.