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Fact Check Madeira

Um cantor ganha mais num único espectáculo na Madeira do que em 2 meses no Continente?

Foto Rui Silva/Aspress
Foto Rui Silva/Aspress

Muitas centenas de pessoas quiseram assistir, ontem, ao concerto de João Pedro Pais em Santa Cruz, no âmbito das Festas de Santo Amaro. O cantor e compositor foi muito aplaudido pelo público, no que constituiu um dos primeiros espectáculos musicais do ano na Madeira. No entanto, nas redes sociais, houve quem apontasse para o custo do evento organizado pela Câmara Municipal de Santa Cruz. No Facebook, um cidadão garantia que com este espectáculo, João Pedro Pais “vem ganhar (…) mais do que em dois meses de concertos no continente”. Será mesmo assim?

Para verificar esta afirmação teremos que presumir que a mesma se refere apenas aos contratos com entidades públicas e que constam da respectiva base de dados. Desde o ano 2009, há mais de uma centena de contratos para concertos de João Pedro Pais, a maioria dos quais celebrados entre câmaras municipais e a empresa de que o cantor é sócio-gerente, a ’21 Music Unipessoal’, mas também com outras sociedades de organização de espectáculos.

Tomando em consideração apenas os últimos três anos, verificamos que por 34 vezes as entidades contrataram directa ou indirectamente João Pedro Pais para animar eventos, de uma ponta à outra do país, no que deu os seguintes totais de facturação: 232.180 euros em 2022, 142.200 euros em 2023 e 164.141 euros em 2024. Subdividindo estes valores em períodos de dois meses, dá um valor médio bimensal de 38.697 euros em 2022, de 23.700 euros em 2023 e de 27.357 euros por mês em 2024.

No caso do concerto nas Festas de Santo Amaro, a Câmara Municipal de Santa Cruz contratou um concerto de João Pedro Pais a uma empresa intermediária, a ‘Partyprofile’, por 25.152 euros (valor ainda sem IVA). Em termos nominais, sem considerar outros factores que devem ser tidos em conta na avaliação da receita, este valor fica abaixo das médias bimensais dos contratos por concertos realizados nos anos de 2022 e 2024.

No entanto, mesmo em relação às médias bimensais de 2023, seria sempre abusivo considerar que João Pedro Pais “vem ganhar” mais num único espectáculo na Madeira do que em dois meses de concertos no continente. É que, ao contrário do que acontece nas actuações em território continental, os eventos no nosso arquipélago implicam gastos avultados em transporte aéreo e alojamento do artista e da sua equipa de apoio. Além disso, há que descontar a comissão que sempre será devida à empresa intermediária. O DIÁRIO solicitou à Câmara de Santa Cruz o caderno de encargos do procedimento de consulta prévia para a contratação de João Pedro Pais, mas não obteve resposta. Ainda assim, teremos sempre de concluir que a margem que sobra pessoalmente para o cantor ficará bem abaixo dos 25.152 euros previstos no contrato.

Sempre se poderá dizer que este valor fica bem acima dos 15.839 euros que foram cobrados, em média, por cada espectáculo do mesmo artista nos últimos três anos. No entanto, aquele valor está perto daquilo que o município da Calheta, na ilha açoriana de São Jorge, teve de despender (23.680 euros) para o contratar para um ‘show’ realizado no Verão de 2022. Neste último caso, mais uma vez, saltam à vista os encargos acrescidos inerentes à contratação de um artista não residente para actuar nos arquipélagos portugueses.

Em resumo, as entidades públicas das ilhas gastam seguramente mais para promover espectáculos com músicos nacionais mas não é verdade que estes ganham mais num evento na Madeira do que em dois meses de actuações no continente.

João Pedro Pais "vem ganhar mais [num espectáculo na Madeira] do que ganha em dois meses nos concertos do continente” - Comentário no Facebook