DNOTICIAS.PT
Artigos

Frente Cívica: a opção

1. Frente CívicaA Madeira encontra-se num estado de degradação política que não pode continuar. Desde que a Autonomia foi conquistada, esperava-se que esta terra, de história e carácter próprios, se transformasse num exemplo de autogoverno. Contudo, décadas de má gestão, caciquismo e politiquice rebaixaram a Autonomia a uma mera formalidade, uma palavra vazia usada como escudo para encobrir uma governação amadora e desastrosa. As eleições que se aproximam não trazem nenhuma esperança. Pelo contrário, apresentam-nos um espectáculo deprimente de candidatos sem substância, figuras menores preocupadas exclusivamente com a perpetuação do poder pelo poder. A verdade é que a Madeira, tal como está, caminha para um beco.

É neste contexto de urgência que surge a necessidade de uma frente cívica. Uma frente que vá além das divisões partidárias e ideológicas, que reúna os homens bons desta terra, aqueles que ainda têm uma visão clara do que significa governar para o bem comum. Não podemos continuar reféns de uma classe política medíocre, atolada em esquemas e interesses obscuros. A Madeira precisa de uma vaga de fundo, um movimento capaz de restaurar a democracia e renovar a Autonomia. Não uma democracia de fachada, mas uma democracia real, participativa, onde os cidadãos tenham voz e os governantes sejam responsabilizados pelos seus actos.

É preciso compreender que a Autonomia não é um fim em si mesma. Não basta proclamá-la, é necessário demonstrar que conseguimos usá-la para transformar a Madeira numa terra próspera, justa e moderna. Isso implica uma ruptura com o presente estado de coisas. Implica coragem para denunciar e enfrentar os vícios instalados, mas também inteligência e sentido estratégico para construir algo novo. E essa construção exige uma vontade forte, transversal, que una políticos sem rabos de palha, empresários, académicos, trabalhadores, agentes da cultura, e todos os que, independentemente do seu passado e da sua história, reconhecem que o futuro da Madeira está em risco.

Agora, é essencial clarificar que o futuro da Madeira, dos madeirenses, da democracia e da Autonomia não se define pela estéril dicotomia entre poder e oposição. Essa divisão é a armadilha em que nos enredaram os que dominam a política regional, mantendo a população refém de uma disputa sem substância, onde a única constante é a perpetuação dos mesmos interesses e práticas. O futuro da Madeira deve ser encarado como uma questão de opção, e não de oposição. Opção entre o modelo de poder que nos trouxe a este beco — um modelo esgotado, que se alimenta da dependência e do clientelismo — e um modelo novo, disruptivo, reformista, capaz de abrir um caminho de desenvolvimento e riqueza.

A Frente Cívica não deve surgir para ser a mera antítese do poder actual. A sua legitimidade não pode, nem deve, ser baseada em ser oposição. A Frente Cívica terá de ser escolhida por ser uma opção: a opção de quem acredita que a Madeira merece e pode ter um futuro melhor; a opção de quem recusa a mediocridade, o conformismo e a resignação; a opção de quem vê na Autonomia não um pretexto para a sobrevivência política, mas um instrumento de progresso e de dignidade.

A Madeira tem de sair, com urgência, desta lógica chorona e mal-humorada do “quanto pior, melhor”, que se instalou como um vírus no discurso político e cívico. Esse fatalismo preguiçoso, que insiste em amplificar os problemas sem oferecer soluções, não só perpetua o imobilismo como alimenta o descrédito nas instituições e nas possibilidades de mudança. É fácil, comodamente instalado no sofá da crítica inconsequente, apontar os erros, dramatizar os fracassos e esperar que o colapso total venha legitimar novas ambições de poder. Mas o que a Madeira precisa, agora mais do que nunca, é de energia criativa, de uma visão positiva que mobilize os seus melhores recursos, humanos e materiais, para transformar esta crise num ponto de viragem. Quem se limita a explorar o descontentamento e a desconfiança do povo sem apresentar um caminho alternativo não faz mais do que contribuir para o aprofundar o poço em que nos encontramos.

É imperativo que se construa uma Autonomia virtuosa, uma Autonomia que não seja apenas uma palavra repetida em discursos vazios, mas sim um modelo de governação assente em princípios de responsabilidade, transparência e mérito. Uma Autonomia que potencie as singularidades e os recursos da Madeira, que promova uma economia diversificada, robusta e sustentável, capaz de criar riqueza sem depender eternamente de subsídios e transferências. Esta Autonomia virtuosa tem de ser, acima de tudo, um pacto de confiança entre governantes e governados, onde os interesses colectivos prevaleçam sobre as ambições e onde a política deixe de ser um jogo de sobrevivência para se tornar um verdadeiro serviço público. Não se trata de um idealismo ingénuo, mas de uma necessidade histórica. A Madeira só conseguirá afirmar-se como uma região verdadeiramente autónoma e próspera quando a sua Autonomia deixar de ser sinónimo de desperdício e compadrio, para se transformar num exemplo de eficiência, justiça e desenvolvimento.

Este é o momento de romper com o velho paradigma e apresentar aos madeirenses uma alternativa real, concreta e mobilizadora. Não uma mudança de fachada, mas uma transformação profunda que restabeleça a confiança nas instituições, que promova o desenvolvimento económico e social, e que devolva aos cidadãos a esperança num futuro de liberdade e prosperidade. A Frente Cívica é esse caminho, não por oposição ao que existe, mas, repito, porque é a única opção que se coloca perante quem tem o dever moral de pensar na Madeira do amanhã.

Chegou o momento de agir. O tempo de lamentar passou. Este é o instante em que se decide se a Madeira continua refém de um sistema apodrecido ou se escolhe um novo caminho. Que os madeirenses saibam estar à altura deste desafio histórico.

A alternativa é o abismo.

2. Uma ponte para lado nenhum

E por falar em abismo, eis que chega uma ponte para lado nenhum, a ponte pedonal na Ponta do Pargo, o mais recente monumento à genialidade visionária de Miguel Albuquerque, esse grande arquitecto do disparate. Alguém que, ao olhar para os problemas reais da Madeira — hospitais em agonia, jovens a fugir da ilha, famílias esmagadas pelo salário mínimo que minimiza a vida de cada vez mais madeirenses, conclui que o que realmente falta é uma ponte suspensa, pendurada no vazio, tal qual o próprio governo.

1,6 milhões de euros. Uma ninharia, dirão os iluminados que gravitam à volta do poder, sempre prontos a justificar a mais recente extravagância do chefe. E para quê? Para ligar absolutamente nada a coisa nenhuma. Mas não sejamos ingratos: esta obra promete transformar o já vibrante turismo da Ponta do Pargo numa irresistível meca de selfies para meia dúzia de influencers e turistas incautos. “Atracção turística”, proclamam com ar grave, como se a falta de uma estrutura de aço a balançar ao vento fosse o que impedisse a Madeira de entrar numa nova era de prosperidade.

E depois há o processo, sempre tão característico desta governação iluminada. Tudo decidido nas costas do povo, claro, porque não se pode esperar que a plebe perceba o brilhantismo destas ideias. Consultas públicas? Para quê, se a opinião popular é uma mera inconveniência? Decisões estratégicas destas são para ser tomadas em jantares discretos, acompanhadas de um bom vinho e assinadas com a habitual subserviência às construtoras. Miguel Albuquerque manda e as construtoras riem-se, enquanto os cofres públicos se esvaziam.

Ironia das ironias, esta ponte nem sequer será pioneira. A tentativa patética de replicar a ponte de Arouca é o equivalente arquitectónico de um miúdo a copiar os trabalhos de casa do colega. Só que Arouca, ao contrário da Madeira sob este governo, pelo menos teve o bom senso de justificar o investimento com um retorno turístico sólido. Aqui, a ponte será apenas mais um cenário para alimentar o marketing político de um regime obcecado por obras de fachada, enquanto a realidade apodrece todos os dias.

Esta ponte é uma metáfora perfeita para o estado da Madeira sob a governação de Albuquerque: uma construção dispendiosa, inútil e a balançar precariamente sobre o abismo. Um verdadeiro “cartaz turístico” de um governo que já só merece figurar nos livros de história como um caso de estudo sobre má gestão, megalomania e desperdício crónico.