21 gramas
Todo o ambiente, criado pelo filme, leva-nos à reflexão sobre a forma de estarmos no mundo
Dizem que no momento da nossa morte perdemos 21 gramas. É o peso da alma. Foi a ideia sobre esse peso que inspirou o filme de Alejandro González Iñarritú. “21 gramas” é um filme que retrata a angústia sobre a vida e a morte. Leva-nos à reflexão sobre a partilha da esperança e do desespero. O filme conta a história de vida de três pessoas e mostra que estamos todos ligados por uma existência que nos faz cruzar, a todos, mais tarde ou mais cedo, num lugar-comum. Do filme retenho a ideia do peso da alma.
A ideia de peso é logo de início definida como um silêncio. Não se trata de um repouso do sossego, mas de uma nudez interna que se disfarça e dispersa num rosto que se baixa, e no olhar marcado pela opacidade: “a culpa há de consumir-te”. Assim se inicia o filme. O peso da alma.
Esse peso é, também, aquilo que carregamos ao longo da nossa vida. Dos erros, das vitórias e derrotas, do Mal e do Bem, da liberdade e responsabilidade. Basicamente, o peso da mortalidade. Todo o ambiente, criado pelo filme, leva-nos à reflexão sobre a forma de estarmos no mundo. Da vivência da finitude como se fôssemos eternos, da evidência da limitação e de um horizonte de possibilidades.
O desapego com que vivemos e lidamos com os conflitos (“o inferno são os outros”) identificam os passos do futuro. Tendemos para uma queda que não nos deixa espaço. A vaga para pararmos e pensarmos sobre esse peso da alma. Nem perante a ruína do Outro arrepiamos caminho. A vontade, de pelo menos alguns, é a de matar o que já por si está destruído. O último mês foi propício a isso: mostrou-nos bem que os abalos da vida, inclusive em comunidade, podem ter uma significação zero. Inércia. A seu tempo, cada um será chamado a se explicar. No fim, tudo se resumirá ao uso do peso.
Voltemos ao peso da alma. O nosso caminho, à partida, parece ser realizado pela razão e pela virtude. Apesar de estes conceitos, razão e virtude, estarem em desuso continuam a ser as ideias reguladoras que cada um de nós pode perseguir ou rejeitar. Mas, por vezes, a cobiça e a inveja são tão mais fáceis, porque há esse sentimento não de ter o que o Outro tem, mas de desejar que ele não tenha. Imagine o leitor o que será carregar este fardo. É uma forma de culpa que corre por dentro e que esmaga a alma. Aí a única bondade possível é a da pena como percurso.
Vale a pena ver o filme. Por um lado, mostra-nos os custos da infelicidade, mas, também, revela a capacidade que cada um de nós tem em impor e propor a si mesmo escolhas. Uma delas é a de deixar cair tudo o que nos faz mal. Outra é a de nunca se sujeitar à ausência de si mesmo.
“21 gramas” leva-me à pergunta: sempre que nos pesamos será que menos 21 gramas é o peso da morte? Quando foi a última vez que pesaste a tua vida?