A inversão de valores nos dias actuais
A ilegalidade começou por traficarem o animal e o retirarem do seu meio ambiente e a responsabilidade iniciou-se logo aí
Atravessamos uma época de rápidas transformações sociais, de enormes avanços tecnológicos e de mudanças culturais muito significativas. Isto, tem muito de positivo!
No entanto, pesem todas essas evoluções damo-nos conta de um conjunto de fenómenos, muito preocupantes e em muitos casos contraditórios: - A inversão de valores!
Ou seja,
Por um lado, crescemos e evoluímos enquanto sociedade, por outro estamos a colocar em causa e a questionar valores tradicionais e éticos, que durante muitos anos foram pilares e suporte dessa mesma sociedade, distorcendo-os ou até abandonando-os para abraçar novas perspectivas, tendências e comportamentos, alguns deles e para ser meigo, muito discutíveis e até questionáveis, especialmente, para as gerações mais antigas. Aqui, e do meu ponto de vista estamos decididamente a andar para trás.
Então vejamos, qual a razão por que me lembrei disto!
Recentemente tivemos duas situações aqui na Madeira, que de alguma forma, convocaram a nossa atenção e a muitos o seu empenhamento e interesse. 1 - A hipotética construção de um parque de estacionamento no Largo do Colégio para 500 carros e 2 - o aprisionamento de um animal selvagem que estava numa situação ilegal, devolução aos donos e posterior morte do mesmo. Parece que se chamava Bores!
Ambas as situações provocaram o aparecimento de petições públicas com recolha de assinaturas. Eis aqui, o motivo do meu espanto e admiração!
A do parque de estacionamento conseguiu recolher 1.600 e tais peticionários ...
A do Bores 21.702 ...!
Eu fiquei no meu canto, tipo "cada macaco no seu galho" ...!
Confesso que não assinei nem uma nem outra; mas, ainda que sendo duas situações que não podem ser comparáveis, não deixa de me causar alguma perplexidade o interesse pela causa do Bores, ser manifestamente mais apelativo e interessante que um problema que pode mexer com o nosso património histórico e com o futuro da Cidade do Funchal. É o que é! O nosso compromisso com a Cultura de maneira geral é muito fraco …!
Tenho ouvido e lido muita coisa sobre os dois assuntos, e em relação ao estacionamento retive três opiniões que despertaram a minha curiosidade e me ajudaram a formar a minha posição e convicção sobre o mesmo.
O Dr. Raimundo Quintal que é uma voz muito respeitada frontalmente contra, com argumentos robustos e profundos que sustentam com muita solidez a sua posição.
O Sr. Cónego Marcos Gonçalves figura de muita relevância e valor na Igreja da Madeira com uma opinião muito favorável, sendo um dos seus argumentos que as pessoas passarão a ter muitos lugares para estacionar e poderem ir à Missa...
Permita-me um desabafo sincero: - Sou um católico praticante, que "é uma espécie" perigosamente ameaçada de extinção, que vê com muita apreensão o esvaziamento progressivo da Igreja de há alguns anos a esta parte, que tenho ouvido as mais diversas explicações e motivos para não ir à Missa, mas, o que é facto e verdade seja dita, nunca encontrei ninguém que me dissesse que não o fazia porque não encontrava sítio para estacionar o carro ... Antes fosse esse o problema!
A Senhora Presidente da Câmara Municipal do Funchal, pessoa que muito prezo e que não esqueço, o que foi o seu trajecto à frente da Associação Comercial e Industrial do Funchal, que explicou:
- O compromisso eleitoral
- O dever e abertura de estudar novos caminhos para a Cidade, pois para isso foram eleitos.
- A certeza e promessa da Câmara só avançar, ou não, com uma solução devidamente estudada, ponderada e segura.
Acreditei e para já, fico mais descansado!
Ao longo da história foram muitas as situações que provocaram polémica e até algum desconforto social inicialmente, por decisões mais arrojadas e diferenciadas, que até se vieram a revelar excelentes opções urbanísticas no final.
Seria um bom exemplo o Dr. Fernão de Ornelas que marcou a Cidade do Funchal, que foi um grande Presidente da Câmara e a rua que hoje transporta o seu nome.
Não quer dizer que este seja o caso, mas, há que ter abertura e visão!
Estamos a falar de uma época em que as prioridades eram outras, bem como a preocupação das pessoas em relação aos mesmos assuntos completamente diferente. É factual, não se trata de achar isto ou aquilo!
Quanto ao assunto do Bores, li páginas, com todas as explicações e pontos de vista relativamente à temática e:
- Estamos no domínio das emoções.
- Opiniões e "achismos" de todos os quadrantes.
- Vários partidos políticos e estou-me a recordar do RIR, CHEGA, PTP, além do PAN que é a "sua praia" a cavalgarem e a se interessarem pelo assunto.
- Um comunicado esclarecedor da Ordem dos Veterinários onde me chamou a atenção a referência e utilização da palavra CRIME..., que é o que se chama "dar nome aos bois" ...,Name names em inglês ...
- A procura incessante e indiscriminada de culpados e responsáveis, indo ao ridículo alguns, de responsabilizar a GNR e até o Ministério Público pelo problema e desfecho.
Terminaria dizendo em relação a este tema o seguinte:
- Eu que não assinei (embora lamente a situação e especialmente o infeliz desfecho), e muitos dos que assinaram a petição do felino e que não o conhecíamos de lado nenhum, felizmente, tivemos a sorte de nunca o encontrar e por qualquer capricho do destino, mau humor repentino ou necessidade alimentar, ele decidisse privar o "nosso corpinho" de alguma parte mais necessária e especialmente para que, alguns pudessem continuar a utilizar a caneta para assinar petições ... Os animais selvagens têm dessas coisas e manias e por vezes resolvem comer mãos, braços e quando o apetite é mais voraz e a envergadura o permite, até pessoas ...
- E se de repente o Ministério Público resolve "agarrar o touro pelos cornos" e vai ao cerne da questão, começando por saber:
1 - Qual a origem do animal e como foi a aquisição?
2 Como é que entrou na Madeira?
3 - Quem foi o/os veterinários que o trataram, sem denunciar e como era sua obrigação o problema e a situação?
4 - Etc.? Etc.?
A ilegalidade começou por traficarem o animal e o retirarem do seu meio ambiente e a responsabilidade iniciou-se logo aí ...
Acredito que ele era muito mansinho e que dava e tinha muito carinho da família que o acolheu, mas, não é disso que se trata; convém não esquecer, que é de UM CRIME que estamos a falar e enquanto a lei não mudar não pode ser tratado de outra forma! Quer-me cá parecer!