"Decisão histórica para os bananicultores", diz JPP
Em causa está o parecer da Autoridade da Concorrência que recomenda o GR o alívio dos requisitos necessários para o reconhecimento de organizações de produtores de banana na Madeira
O vice-presidente da bancada parlamentar do Juntos Pelo Povo (JPP), Rafael Nunes, leu o parecer da Autoridade da Concorrência (AdC), esta sexta-feira, afirmando que se trata de "uma decisão histórica para os bananicultores, numa luta de anos do JPP". Em causa está o parecer da AdC que recomenda ao Governo Regional o alívio dos requisitos necessários para o reconhecimento de organizações de produtores de banana na Madeira.
"Esperamos que o PSD e Albuquerque percebam agora que têm de rasgar o fato costurado à medida para favorecer a GESBA e prejudicar os agricultores", exorta Rafael Nunes.
Uma decisão inédita da Autoridade da Concorrência (AdC) poderá ditar o fim do monopólio da GESBA no sector da banana. JPP
De acordo com o deputado, a AdC propõe ao Governo Regional a alteração de dois despachos regionais de 2008, a fim de “permitir que outras entidades, nomeadamente Organizações de Produtores (OP’s) no sextor da banana, na RAM, possam vir a surgir, para além da entidade GESBA, e possam ser ‘entidades reconhecidas’, designadamente, para efeitos da possibilidade de recepção e distribuição, pelos produtores, das ajudas europeias e complementares regionais”.
"O parecer da AdC enviado à ABAMA – Associação de Organizações de Produtores de Banana da Madeira – promete dar que falar. Surge na sequência da exposição, exaustiva e fundamentada, apresentada por esta organização, que sempre questionou o modelo exclusivo de gestão do sector da banana na Madeira e a impossibilidade de os bananicultores se poderem constituir em Organização de Produtores (OP’s) alternativa e concorrente da GESBA – Empresa de Gestão do Setor da Banana, Lda. –, cujas normas europeias impede posições dominantes e estabelece a livre concorrência", explica um comunicado enviado pelo partido à redacção.
Na análise dos factos apresentados pela ABAMA, a AdC põe em causa as normas regionais que praticamente impedem a criação de OP’s, nomeadamente os desconformes “requisitos quantitativos” do número mínimo de produtores exigidos para criar novas associações.
"A Autoridade da Concorrência traz à colação a Portaria 393/2020, que estabelece um número mínimo de 100 produtores e um valor mínimo de produção comercializada (VPC) de cinco milhões de euros para que os agricultores possam estabelecer as suas próprias organizações sem terem que estar debaixo do jugo do PSD ou de quem governa", acrescenta ainda o comunicado.
Na comparação das normas vigentes no Continente e Açores, a AdC considera “desproporcionais” e “impraticáveis” as exigências impostas pelo Governo Regional da Madeira, e destaca exemplos: nos Açores, a criação de OPs carece de um mínimo de 50 produtores e 50 mil euros de VPC; no continente são exigidos apenas sete produtores e 15 mil euros de VPC.
A AdC assinala que desde 2008 o Governo Regional designou a GESBA como “entidade reconhecida competente” para proceder à gestão, administração e exploração dos meios de produção de banana da Madeira, distribuição e comercialização, apoiar a produção, recolha junto do produtor, classificação, embalamento e distribuição, conferindo-lhe ainda exclusividade na “recepção e distribuição, pelos produtores, das ajudas europeias e complementares regionais”.
Atenta ao controlo do Governo Regional na gestão das ajudas europeias canalizadas para a GESBA, a entidade da concorrência nota que em 2016 o executivo de Miguel Albuquerque determinou que só os bananicultores que entregassem a produção a “uma entidade reconhecida” beneficiariam dos apoios europeus.
Dado que a “única entidade reconhecida” na Região é a GESBA, logo o Governo “fomentou e continua a proteger o monopólio do setor, discriminando e deixando de fora das ajudas europeias e regionais os agricultores que se recusem a entregar a banana na GESBA”, critica o JPP.
Uma contradição à luz da legislação europeia. Explica o regulador da concorrência nacional que um determinado número mínimo de membros produtores e um VPC mínimo “não devem impedir o reconhecimento das OP’s dedicadas à produção em pequena escala”.
O regulador refere o Regulamento da UE 1308/2013 que cria um quadro transversal para o reconhecimento de OP’s, aplicável a multisectores, entre os quais o da banana: “Uma pessoa colectiva ou parte claramente definida de uma pessoa colectiva, que solicita o seu reconhecimento como uma OP, deve reunir um número mínimo de membros e/ou representar um volume ou valor mínimo de produção comercializável (VPC), a determinar pelo Estado-Membro interessado, na sua zona de atividade; tais disposições não impedem o reconhecimento das OP’s dedicadas à produção em pequena escola.”
Pelos vistos, o Governo Regional tem outra leitura da norma comunitária. A fim de ultrapassar as limitações impostas legalmente, mas contrárias num mercado de livre concorrência, a AdC propõe que seja alterada a Portaria 298/2019 para “garantir que o valor de cada um dos critérios (número mínimo de produtores e VPC) a preencher para o reconhecimento de OP’s é adequado e proporcional”.
A referida Portaria nacional consagra o direito de as regiões autónomas da Madeira e Açores adoptarem regras regionais para a designação das “entidades competentes”, estabelecerem o número mínimo de produtores, do VPC e o reconhecimento de OP’s, normas que se encontram plasmadas na Portaria regional 393/2000.
De acordo com o parecer da AdC, o problema está precisamente na adaptação que a Região fez da Portaria 298/2019. O regulador alega que o Governo Regional “estabelece requisitos mínimos quantitativos, em termos do número mínimo de membros produtores e do VCP mínimo, muito díspares daqueles constantes na legislação nacional e nos Açores para o mesmo sector” da banana.
Refere ainda que “todos os valores mínimos devem ser fundamentados”, mas nota que, no caso da Portaria regional 393/2020, “não consta tal fundamentação”.
Nesse sentido, a AdC propõe que “o decisor público regional altere o Despacho (RAM) n.º 88/2008 e o Despacho (RAM) n.º 120/2009, no sentido de permitir que outras entidades, nomeadamente, OPs, no sector da banana, na RAM, que possam vir a surgir, para além da entidade GESBA, possam ser ‘entidades reconhecidas’, designadamente, para efeitos da possibilidade de recepção e distribuição, pelos produtores, das ajudas europeias e complementares regionais, alterações que eliminariam os eventuais conflitos de interesse que possam surgir”.
“Em face do exposto, a AdC propõe ao decisor público regional da RAM que reavalie os limiares mínimos quantitativos para o preenchimento da condição relativa ao reconhecimento de OPs, constantes da Portaria 393/2020, revendo-os no sentido de permitirem, de forma adequada, necessária e proporcional, o preenchimento da condição relativa ao reconhecimento de OPs, no setor da banana, na RAM”, refere o partido relativamente às conclusões da Autoridade da Concorrência.
O vice-presidente do Grupo Parlamentar do JPP, Rafael Nunes, saúda a “histórica decisão da AdC” e assinala o “simbolismo” que tem para “um punhado de estoicos bananicultores, escravizados durante anos pela política errática do PSD, mas que nunca se deixaram intimidar pelas ameaças e pressões de Miguel Albuquerque”.
O parlamentar diz que o “tempo deu razão” à luta dos produtores de banana, e recorda que o JPP esteve desde o princípio envolvido com a ABAMA em todo este processo. “É uma vitória dos bananicultores e uma derrota para o PSD e Miguel Albuquerque”, sublinha.
Além das acções políticas constantes no terreno para denunciar o monopólio da banana e a falta de transparência da empresa pública GESBA na gestão do sector, o JPP promoveu reuniões, em Lisboa, com a AdC, realizou audições parlamentares na Assembleia Legislativa da Madeira (ALM) com a ABAMA, e a AdC só não foi ouvida no Parlamento regional “porque o PSD chumbou todas as iniciativas nesse sentido”, refere o dirigente partidário.
Recorde-se que a Lei n.º 19/2012, número 1 do Artigo 5.º, refere que “o respeito pelas regras de promoção e defesa da concorrência é assegurado pela Autoridade da Concorrência (AdC), que, para o efeito, dispõe dos poderes sancionatórios, de supervisão e de regulamentação estabelecidos na presente lei e nos seus estatutos”.