A falta que tu fazes
Já se passaram 10 anos desde a tua partida. Muita coisa tem acontecido desde então. Muitos dos acontecimentos já relatei no livro a Ti Dedicado, lançado em Janeiro de 2020.
Entretanto, passaram-se quatro anos desde o lançamento desse livro e passámos por uma pandemia, que foi um acontecimento terrível. Continuaram a acontecer coisas que, se aqui estivesses, terias de certeza muitas opiniões válidas e, sobretudo, inteligentes, que fazem muita falta no cenário atual.
Infelizmente, o Bloco entrou e saiu do Parlamento em pouco tempo. As pessoas preferiram apostar em outros partidos mais à direita que estão a demonstrar, como já era esperado, que não são alternativa a nada. Comem todos à mesa do orçamento. Vendem-se por pouco ou quase nada.
Não tem havido aposta numa verdadeira alternativa porque o PS continua a considerar que sozinho ganha as eleições. Está cada vez mais pequeno e daqui a dias pode ser “comido” interna e externamente, por outros, que estão ávidos de poder. E assim se vai neste “rame, rame” da política madeirense.
As pessoas que trabalham deixaram de ter voz dentro do Parlamento porque quem os defendia já lá não estão (Bloco e PCP). O debate parlamentar está enviesado e preso na mesma teia de temas, que não atam nem desatam. Tudo está muito mais pobre e mais triste. Imagino sempre como te irias preocupar com esta situação. Tu, para quem os problemas e reivindicações de quem trabalha eram primordiais na tua intervenção parlamentar.
Agora surgiram vários escândalos ligados a redes de corrupção entre os poderes públicos e privados. Tenho me lembrado tanto que tu sempre levantaste esta questão, denunciaste publicamente diversos casos, tiveste processos em tribunal, e nunca sentiste qualquer interesse da justiça em fazer uma investigação séria ao que se passava. Por causa disso, passaste uma grande parte da tua vida a ser arguido com “termo de identidade e residência”. Agora o regabofe é ainda maior, porque o descaramento é de tal forma grande que leva o atual Presidente do Governo Regional a ameaçar e a chamar todos os nomes, que lhe vem à cabeça, com o objetivo de intimidar a justiça e os adversários políticos a não darem continuidade às denúncias.
Não sei o que vai acontecer, até porque a justiça comporta-se de forma confusa. Um dia leva tudo preso e algemado e noutro coloca tudo na rua em liberdade. O simples cidadão/cidadã fica sem saber o que pensar de autoridades que assim se comportam. Até porque, entretanto, através da comunicação social, ficamos a saber duma vasta rede de nomes que estão comprometidos neste processo de tráfico, que inclui fugas de dinheiros públicos para beneficiar privados, incluindo familiares.
Tu, que sempre te bateste para que existisse uma lei clara de incompatibilidades, entre os interesses públicos e os privados, onde fossem definidos claramente os limites das fronteiras entre uns e outros, chegaste a apresentar, por várias vezes, propostas concretas sobre tal lei, denunciaste a promiscuidade no sector da saúde e levaste logo com um processo em tribunal, terias de certeza muitos contributos a dar nos dias de hoje e serias uma voz de respeito, porque sempre foste um exemplo de coerência até à hora de partires, num hospital público cheio de carências em tudo. Nunca esquecerei esse dia e a falta que fizeste, em muita coisa, mas sobretudo na nossa grande cumplicidade em tudo. Passados 10 anos continuas a me fazer muita falta, meu querido Paulo.