DNOTICIAS.PT
Artigos

Chamas da Autonomia

A chama da nossa Autonomia é, afinal, um retórico instrumento incendiário.

Mais de cinco mil hectares consumiram a ilha, enegrecendo a paisagem e a alma das populações na Serra de Água, Curral das Freiras, Jardim da Serra e Ponta do Sol. Houve evacuados, desalojados e muita perda de património. Aquele património pelo qual a Madeira encanta e atrai. Tal como nos cofres de abertura retardada, faltam ainda as consequências historicamente conhecidas, advindas de um solo mais vulnerável que também aflige, destrói e mata.

A teoria do “fogo posto” foi veiculada convictamente por Albuquerque, que tal como o pároco da Serra de Água, convenientemente distanciou-se da teoria do foguete, tão desculpabilizante, até porque, há sempre sepulturas vagas no vasto talhão onde jazem as culpas celibatárias.

Observámos o fogo desenfreado, perante a desvalorização do seu progresso, da recusa e posterior reforço de meios, daqueles, aos quais compete, a proteção civil provir. Faltou a presença serena duma governação tardiamente arrancada da espreguiçadeira do Porto Santo. Assisti incrédulo, a uma comunicação incendiária, de bizarra arrogância, encimada por Albuquerque e do seu inarrável secretário Ramos, que, ressuscitados ao quarto dia, metralharam com soberba, a “abutre” oposição e os “treinadores de bancada”, que ousavam questionar tamanha altivez encrespada, difundida ao país, que condescende sempre com a habitual boçalidade do exotismo político local.

O condicionamento e restrições do trabalho jornalístico na cobertura destes incêndios, sinalizados por alguns profissionais da classe, revela como é fácil perder a “mão”, não só no combate às chamas, como na filtragem comunicacional anacronicamente exercida.

A Madeira tão escudada na sua Autonomia e modelada politicamente na sua acérrima defesa, recusou em 2020 integrar o Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais (2020 – 2030). Quando nos julgamos assim tão autossuficientes, é suposto agirmos em conformidade com essa expectativa e exigência. Mas, não. Com a Autonomia na lapela, corremos atrás do escaldante prejuízo.

Falar apenas em “mato queimado” neste rescaldo, é ultrajante, e é negar as idiossincrasias do nosso território, do agora verde cartaz Natureza queimado, que só em dois anos, segundo a Associação Insular de Geografia, arderam mais de dez mil hectares de área vegetal.

Qualificar de “sucesso”, a estratégia inicial adotada, é saborear “lambecas” com a testa.

A Autonomia pressupõe confiança e segurança, tal como quando acolhemos doentes do hospital de São Miguel em 2024, ou infectados por COVID oriundos de outras regiões em 2021.

A humildade democrática não apaga a chama da Autonomia, mas, mitiga as petulantes labaredas dos egos, já notoriamente cansados, e que cada vez mais, nos repugnam.