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O (novo) ajudante

No cada vez mais complexo e exigente trabalho clínico, em especial cirúrgico, uma característica sobressai, a multidisciplinariedade e o trabalho em equipa. Entre médicos, enfermeiros, técnicos, auxiliares e administrativos que colaboram nas cirurgias, há um que é pouco conhecido, embora importante, o ajudante. A Ordem dos Médicos define a equipa médica cirúrgica em intervenções com anestesia geral como constituída por dois elementos - o cirurgião e o seu ajudante, mais o anestesista. Tal como um piloto, o cirurgião necessita do seu “copiloto”. Ao ajudante cabe contribuir para a segurança e precisão da cirurgia, ajudando o cirurgião nos procedimentos, mas também ter sentido crítico sobre os procedimentos, muitas vezes recentrando a atenção do cirurgião nos protocolos, aquando de fases de maior stress e dificuldade, nas quais o foco pode mudar.

O ajudante pode ser um médico mais experiente, que ajuda e ensina um cirurgião em fase de treino; ou menos experiente, mas ajudando o cirurgião; ou, como me acontece muitas vezes, de igual experiência, o que é enriquecedor pois a dupla cria uma sintonia que permite melhorar a performance e manter um saudável sentido crítico.

A crescente complexidade cirúrgica, no entanto, exige um novo patamar de precisão e complexidade. Com decisões que integram raciocínio matemático com cálculos dos melhores trajetos a usar na cirurgia, e a integração constante de dados e imagens de TAC e ressonância, entre outros exames. Com controle externo dos procedimentos efetuados para garantir uma precisão absoluta. E ainda com decisões em tempo real integrando todas estas nuances. É aqui que entra em cena o que se chama de cirurgia assistida por robótica, na prática um novo ajudante do cirurgião.

No longínquo ano de 1984 no Canadá foi usado, pela primeira vez, um robot numa cirurgia, no caso o Arthrobot que facilitava a cirurgia ortopédica. Um longo caminho foi percorrido desde então, tendo-se tornado mais fiáveis, seguros e com resultados reprodutíveis e homogéneos. Não substituem o cirurgião que continua a tomar as decisões e, em caso de avaria, cabe a este terminar a cirurgia de forma clássica, sem a ajuda robótica. Nas cirurgias, o robô pode guiar o cirurgião a fazer um procedimento, indicando em tempo real o melhor trajeto ou sequência de ação. Pode, em vez disso, limitar a ação do cirurgião para que este não ultrapasse os limites de segurança ou, até mesmo, fazer o próprio procedimento sob supervisão do médico. Certos braços robóticos têm uma precisão de corte inferior a um milímetro, bem mais que qualquer cirurgião treinado. Mais, a integração de imagens de exames em tempo real permite ao cirurgião saber precisamente onde está o seu instrumento de corte, com mais precisão que aquela que os seus olhos permitem. Adicionalmente, a presença na sala operatória de um técnico, que controla e monitoriza esta precisão, responde às questões do cirurgião e regula constantemente as variáveis, permitindo mais segurança nas cirurgias complexas. Outras vantagens são a menor perda de sangue, cicatrizes menores, menos dores e menos tempo de hospitalização bem como menos complicações. Adicionalmente, não se pode descurar o efeito agregador, motivacional e o prestígio para os prestadores de saúde que oferecem este tipo de cirurgias. No entanto, a cirurgia assistida por robótica não pode ser usada em todos os pacientes ou todas as doenças pois ainda tem uso restrito, tem custos mais elevados, têm uma longa curva de aprendizagem e uma logística por vezes complexa.

Há hoje muitos sistemas robóticos no mercado mas as nuances da investigação e desenvolvimento dos mesmos, as patentes que restringem o uso alargado das inovações a certos sistemas, o uso restrito a poucos procedimentos que certas opções robóticas têm, limitando o número de utentes potenciais, o marketing que, por vezes, distorce a correta percepção da sua utilidade real, bem como a precipitação em adquirir equipamentos sem o historial de utilização alargada e certificada por inúmeros estudos científicos credíveis, pode levar a más opções de investimento dos diferentes sistemas de saúde. Como em qualquer decisão de gestão, o segredo é o correto equilíbrio entre prudência e ponderação, não esquecendo a indispensável auscultação dos profissionais envolvidos bem como o sentido de oportunidade. A tecnologia já existe, está a evoluir, mas haverá a visão necessária para a tornar útil à nossa sociedade?