Julgamentos de caráter
A bondade e simpatia não são uma vacina que impeça uma pessoa de cometer atos ilícitos, fora da lei vigente.
A benevolência não é uma caraterística de inimputabilidade, de incapacidade de culpa. Essa condição de caráter não isenta ninguém de culpa penal, não cria imunidade à infração.
Ser boa pessoa não pode impedir que a mesma seja julgada pelos delitos cometidos; como também não se pode esperar que apenas as pessoas de quem não se gosta sejam levadas à Justiça. Os tribunais não julgam o caráter; julgam condutas e ações. O uso da expressão “justiça cega” serve precisamente para nos referirmos à imparcialidade da mesma.
Erradamente, as pessoas confundem as duas coisas e fazem julgamentos públicos de caráter, sem a isenção da racionalidade factual e fazem-no na perspetiva individual, carregada de subjetividade e emoção. Diga-se, que a exposição mediática e o tratamento sensacionalista dos casos contribuem para acessões precipitadas e para os julgamentos públicos, o que deveria ser evitado, dados os impactos pessoais, sociais, familiares e profissionais no cidadão visado.
Ao longo da vida as pessoas passam por diferentes contextos e situações que podem favorecer determinados comportamentos passíveis de censura. E devem responder por esses comportamentos e atos. É o ato que é julgado e não a sua moral. Um ser humano que comete um ilícito não passa necessariamente a ser um monstro e um perigo para a sociedade.
Não é por conhecermos as pessoas, por serem pessoas próximas a nós ou que nos são queridas, que os seus atos incorretos devam ser relativizados. E se os mesmos atos forem praticados por pessoas desconhecidas ou de quem não gostamos, teremos o mesmo julgamento?
E isto serve para qualquer cidadão, seja um cidadão bondoso, esforçado e simpático, seja para um cidadão detestável e insensível.
Por mais bem-intencionado que seja, um cidadão, sujeito moral público no conceito de Max Weber, que assume cargos públicos deve conhecer os limites da sua ação, de modo que não comprometa a sua responsabilidade social e não crie injustiça. Aqui, a ética da responsabilidade representa o conjunto de normas e valores que orientam a decisão do político a partir de sua posição como governante ou legislador. No nosso país, um sistema com regime democrático, a ética da responsabilidade assenta em princípios universais dos direitos humanos, portanto, a igualdade e a justiça prevalecem.