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As mães

Caro leitor, Hoje, no dia em que lhe escrevo, dá-se a feliz coincidência de ser a celebração do aniversário da pessoa que me carregou durante nove meses com um amor imensuravelmente infinito – a minha mãe. É-me difícil, por isso, não falar das mães deste universo, neste dia em específico.

Num mundo perfeito não haveria finitude possível para o amor que elas – mães – em si carregam, nos escombros de um corpo que suporta outro durante meses a fio, desempenham eternamente até ao dia da sua morte a profissão que mais as enriquece.

São mães, um porto blindadamente seguro onde se amparam todas as quedas com que a vida nos confronta, conscientes da oscilação desmedida que é esta caminhada, têm no seu olhar um conforto inabalável e nas suas palavras uma sabedoria inigualável.

São mães, exemplos desde berço e colo garantido, são eruditas especializadas no sucesso, mas também nos erros, que por isso estão presentes em cada nascer do sol, perpetuam paulatinamente, na obscuridade dos desafios maternais, a ânsia de verem no rosto das suas crias o sentimento mais espinhoso de se alcançar – a felicidade.

São mães, aquelas que trocam a sua satisfação pelo agrado do seu rebento, que vão aos mais altos sacrifícios, ultrapassando medos e fobias, com o único objetivo de suavizar a turbulência da vida daqueles que mais amam.

São mães, maduras dotadas da capacidade mitótica para corresponderem às exigências de um cargo cujas expectativas, por elas próprias criadas, transcendem a possibilidade humana de serem alcançadas, mas que, constante e estratosfericamente, a palavra “mãe” vai além dos limites humanos mais convencionais.

São mães, almas que ensinam os homens do futuro, revestidas de sobro e azinho, vivem na solidão de uma planície alentejana, a cantar o mais deprimente fado que levou Amália às bocas do Mundo, para curar o sofrimento das podas que a vida lhes causou.

São mães, sujeitas cuja responsabilidade é redistribuída por todos os amigos, vizinhos, primos ou conhecidos dos seus filhos. O típico “ah, filhinho” multiplica-se pelos rostos daqueles que acompanham o coração que brotou na sua barriga, gorda e inchada – circunstância só suportável dada a genuinidade de um amor a uma criatura que não tinha ainda sequer conhecido.

São mães, Mulheres que juntas formam uma instituição – legalmente obscura e desconhecida, mas humanamente impreterível; correm o mundo numa cabra para garantir o regozijo da descendência e a paz no coração.

São mães, mesmo aquelas que partiram cedo demais ficaram com a memória sobre si espalmada no asfalto, imortalizada por todos os que consigo lidaram, sobretudo os que viram em si um exemplo que ficará eternizado até que o último que consigo privou parta.

São mães, musas por natureza e guerreiras por vocação, graduadas no conhecimento obtuso dos seus pósteros, cuidam de todos antes de olharem para si, colocam-se para último na sua própria lista de prioridades.

São mães, aquelas que bradam aos céus o orgulho que sentem por todos os que as rodeiam, servem de encosto para cada lágrima vertida, num silêncio ensurdecedor sabem que não é hora de parlar, mas não arredam pé sem ter a verdade – por mais que ela doa, e, às vezes, dói mesmo.

São mães, aquelas que, publicamente, aplaudem tão efusivamente que os desgraçados nem sabem quem não aplaudiu, mas que, em privado, não desperdiçam nem um erro dos discípulos para os recolocarem no tempo e no espaço.

São mães, moças

que enfrentam os desafios com o coração aberto, que têm mais fé do que medo, que parecem ter a certeza de que tudo passa, e que ainda assim continuam a agradecer, com a convicção de que o amor cura.

São mães, eternas adolescentes que não conhecem a palavra “desistir” e que à sétima vez

no chão, são robustas o suficiente para estarem um oitava vez de pé.

São mães, conscientes das curvas e contracurvas da vida, dos seus obstáculos e os caminhos labirínticos, confrontadas com injustiças, decepções e perdas, permanecem mergulhadas numa esperança intocável, com um coração a transbordar de amor e a desejar sempre o melhor – não para si, mas para os outros.

São mães, loiras ou pretas, escanzeladas ou sem aguentarem as carnes, de olhos pretos ou verdes, com um pé partido ou numa cadeira de rodas, com um machado na mão ou saltos altos nos pés, com a pele seca ou com os olhos maquilhados, de cabelo penteado ou com uma mola a prendê-lo, encerram – todas – em si o mais valioso tesouro, que é também o mais fácil de encontrar – o amor de mãe.

“Elas são as mães, ignorantes da morte mas certas da sua ressurreição” – disse Eugénio de Andrade.

Assim são as mães. E a minha.