Rentrée: Censura e Eleições
À oposição recomenda-se agora coragem: coragem para atuar já na Assembleia e para fazer diferente depois, na preparação de uma candidatura conjunta
As eleições regionais de 26 de maio determinaram uma realidade política demasiado clara para possibilitar segundas interpretações: o PSD de Miguel Albuquerque venceu por larga margem em relação ao segundo partido mais votado, apesar do maior caso judicial e político alguma vez enfrentado pelo regime, e competia ao PSD encontrar condições para governar. Foi o que aconteceu: com o apoio parlamentar de CDS, CHEGA e PAN, Albuquerque formou governo e fez aprovar o seu Programa e o Orçamento que muitos consideravam indispensável, por transpor para a Região boas medidas aprovadas pelo Governo do PS no Orçamento do Estado deste ano.
Chegados aqui, em três meses tudo mudou - e mudou porque à primeira dificuldade os madeirenses ficaram a saber que nem têm Governo, nem o PSD tem condições para continuar a governar. A Madeira não tem Governo, como ficou evidente durante os incêndios que assolaram a ilha - e não tem porque quem tinha a responsabilidade política de estar presente e coordenar o combate às chamas contribuiu para aumentá-las, quando rejeitou ajuda, ausentou-se e preferiu atacar politicamente todos aqueles que questionaram as suas opções. A Madeira não tem Governo, como ficou claro também durante os ventos que sopraram vários dias no aeroporto, sem que o Governo fosse capaz, uma vez mais, de contribuir para mitigar as consequências dessa realidade repetida. E o PSD não tem condições para continuar a governar, porque os seus próprios militantes já o dizem e porque os seus parceiros mudaram outra vez de opinião - e tal como aceitaram Albuquerque para governar depois de o terem negado antes e durante a campanha, questionam agora a sua capacidade para liderar o Governo.
Contra aqueles que exigem silêncio nas desgraças, mas só quando está em causa o papel do Governo, a oposição fez o seu trabalho: denunciando as falhas, exigindo soluções e questionando as incongruências. Esse papel terá, e bem, continuidade na Assembleia, através das audições e comissões propostas - mas a gravidade do momento exige que se vá mais longe. Defendo, por isso, que no regresso aos trabalhos parlamentares só resta uma opção à oposição: apresentar uma moção de censura que clarifique posições, fazer cair o que resta deste Governo e preparar-se para eleições. Os madeirenses que voltaram a confiar em Albuquerque são os mesmos que compreendem agora que isto não pode continuar - pela nossa própria vida e saúde. Perante esse cenário, das duas, uma: ou a oposição continua à espera que o Governo caia de podre, enquanto arrasta consigo a nossa realidade social e económica, ou se organiza para dar o pontapé que falta no regime.
A esse propósito, vale a pena recordar o que aconteceu em 2015: com a saída de Alberto João Jardim, a oposição foi incapaz de reunir-se em torno de uma liderança, de uma candidatura e de um projeto político alternativo que mobilizasse os madeirenses para uma verdadeira mudança. Em 2024, o risco que a Madeira corre é ainda pior: ou a oposição se organiza para apresentar uma candidatura que mobilize os madeirenses agora, ou arrisca-se a que, nas próximas eleições, a Madeira volte a ser confrontada com uma versão supostamente renovada do PSD, que mais não será do que o aprofundar da realidade decadente em que vivemos. Nem a Madeira, nem a oposição podem dar-se ao luxo de continuar a esperar: que o Governo caia por si; pelas autárquicas; e pela mais do que previsível reorganização do PSD, enquanto a memória dos madeirenses desvanece.
Confrontados com este cenário, à oposição recomenda-se agora coragem: coragem para atuar já na Assembleia e para fazer diferente depois, na preparação de uma candidatura conjunta, mesmo que liderada por uma personalidade externa às atuais lideranças partidárias, que seja reconhecida pelos madeirenses e que construa um projeto alternativo verdadeiramente mobilizador, capaz de vencer eleições e de colocar a Madeira no rumo certo. Já não é só a política, os partidos, a normalidade institucional e a democracia na Região que estão em causa; já não é acerca do futuro e sobre vivermos melhor - é mesmo para sobrevivermos ao PSD: nós e a Madeira.