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A vergonha das insinuações e suspeições, principalmente dos senhores políticos

Quem anda nesta vida, de a espaços desejar deixar um pequeno cunho pessoal na vida da sociedade civil, cada vez tem mais medo. E medo porque a generalização do escárnio e de mal dizer imperam em todos, principalmente nos políticos e seus caciques.

Teófilo Braga, figura incontornável do republicanismo português, não fugiu a esta discussão, pois apresentou a governação republicana como a única que possibilitaria uma vida coletiva condizente com a ética e a moral, e, como tal, exigida na era da positividade, isto é, reclamada pelo sentido de responsabilidade dos homens elucidados pelo conhecimento científico e de estudo.

Miguel Pedro Araújo, no seu blog escreve o seguinte:

“Quando se transforma a verdade e a coerência, numa narrativa populista e eleitoralista, querendo fazer dos portugueses ignorantes, distraídos e sem memória, coisa que nunca foram, nem nunca perderam (ao contrário do que alguns sempre pretenderam e pretendem fazer crer), balizam-se as estratégicas pela bitola do extremismo e do radicalismo, perde-se a confiança política e degrada-se a confiança nos políticos.” https://debaixodosarcos.blogs.sapo.pt/quo-vadis-democracia-e-etica-926839

Tem toda a razão! Subscrevo

Sou uma pessoa, com algum interesse no bem comum, na forma de estar entre pares. Choca-me e repugna-me a forma de que tantos políticos, ou melhor pseudo-políticos fazem a política. A constante suspeição, meias palavras, e frases como “… desculpe-me que lhe diga, mas..”, E depois uma frase solta entre a suspeição e o descrédito, saem para a rua como soundbites de verdade absolutas. Até o modo de sacristão, e outros de verdadeiros oradores de púlpitos sacerdotais, na maior arrogância e displicência. Uma vergonha.

A constante alteração de fundo das palavras da discussão severa dos assuntos, é miserável. Vi nestes dias até um governante a ser ridicularizado sob a forma de suspeição, de onde teria as suas festas, num debate sobre contas públicas. Incrível, ao nível que se desce. Certamente nem 10% da população percebeu o que foi aprovado no programa de governo ou as verbas que são necessárias para se viver do orçamento regional. Mas todos dizem, “viste o que fulano jogou a cara do secretário? Ele teve festas de borla, bandido!”, ouvi eu isto de dois senhores a falar num café no centro do Funchal. Resultado, o dito governante de uma suspeição leviana de imediato por ter sido dita num hemiciclo, na sua forma e conteúdo, passou a verdade, e do orçamento ninguém entendeu nada de nada! Da defesa do visado, outra vez nada.

Este é um dos muitos casos, que ecoam nesta sociedade mais consumista, mais ávida de sangue e ódio. Basta ver nos reality shows em que para se ser falado temos de fazer dos outros, gato e sapato. Onde é mais importante aparecer do que ser Pessoa, perdeu-se a empatia, a solidariedade e a própria decência da palavra.

Na verdade, custa consciencializar que é este local desprezível em que a sociedade do século XXII se tornou. Daqui decorre irremediavelmente, que quer na política, quer no desporto quer na vida social, os valores da ética estão a cair abruptamente. A culpa é só nossa, pois não conseguimos ser críticos de nós próprios.

Não sou nenhum tolo, nem vivo no mundo de unicórnios. Sei que existiram Isaltino(s), Vara(s), Lobo(s), entre tantos outros (só indico alguns condenados com trânsito em julgado). Mas também existiram pessoas como António Costa, antes dele Jorge Coelho, Miguel Alves e até o longínquo Dr. Henrique Chaves. Gostemos ou não, tomaram atitudes antes da culpabilidade, dentro da ética republicana. E desses, ninguém fala.

O problema, é este e que se afirma hoje num espaço de soundbites. Um qualquer político, no uso da oratória política, usa e abusa de frases soltas, para fazer criar clímax e suspeição. São inúmeros os casos diariamente de produção de sound bites de qualquer ilegalidade ou coisa escondida. Hoje em dia os políticos, usando da semântica, criam frases descontextualizadas, para criar a indignação e suspeição contra os seus adversários. Assim podem fazer, no uso da atividade política, estando defendidos, imagine-se pela lei, e pela vaca sagrada da liberdade de expressão, (levada aos extremos como o tal direito de resposta), quer pelos estatutos próprios quer pela lei de cargos políticos. Numa sociedade, que cada vez consome menos informação esclarecida, e cada vez atribui credibilidade às repetições de frases soltas, a maioria dos receptores fica toldado, e sem um pingo de crítica construtiva, passando de meias-verdade a verdades absolutas.

Estou em crer de que para isto mudar, temos de mudar a forma de ver e estar na sociedade. Tenho para mim que não seria descabido de todo, se aquele que seja sumariamente ridicularizado/enxovalhado, chamado de forma vil ao debate sumário, e que tenha a sua honra abalada, deite mãos dos sistemas judiciais para em sede civil, e não criminal, tentar limpar o seu nome, através da figura de uma ação de simples apreciação negativa. Usando a lei, solicitando que aquele que no debate tenha a ousadia de sair da esfera da dialética republicana, e da honestidade intelectual, prove em sede judicial cível as suspeições que fez sobre o visado a fim de se comprovar a sua honestidade política e a bondade da sua própria oratória.

Assim fizeram no Brasil e noutros países os políticos do centro, colocando ações cíveis, em tribunais, contra os soundbites nas redes sociais em comunicação social, para não serem responsabilizados, mas antes para provarem as suas insinuações. Não conseguindo, devem ser obrigados a pagar um valor a instituições de caridade, assim como mais importante a retratação da sua conduta. Desta forma e aos poucos, quiçá conseguiremos separar o trigo do joio, bem como idealmente e utopicamente dignificamos aqueles que fazem da causa pública a sua própria causa.

Precisamos de quem nos defenda e represente, mas esses têm de se dar ao respeito e fazer-se respeitar, respeitando ainda mais os seus adversários, com elevação, honestidade intelectual e ética republicana, a bem de uma política ativa, eficaz e com a sua medida de desconforto. Cabe aos vencedores e eleitos governar e tomar decisões, cabe aos perdedores serem agentes de fiscalização do ato da Governação, mordazes nas injustiças e eficazes nas demonstrações de alternativas às medidas propostas. O resto é somente campanhas de desinformação, criadas em gabinetes de aspirantes a políticos. Como dizia Robert Lois Stevenson (escritor e poeta), “A política é talvez a única profissão para a qual se pensa que não é preciso nenhuma preparação.”