Chefias, mas pouco!
Recentemente tive uma conversa informal com amigos de longa data. Curioso foi o tema ter escorrido para a pergunta: “como construir uma boa liderança?” e, a sua antítese, “como lidar com um chefe tóxico?” …
Estas linhas são resultado da reflexão após essa frutuosa conversa. Mais do que escrutinar os chefes que tive na minha vida profissional, ou cívica, ou os diferentes chefes que todos nós temos na sociedade, encaremos este como um mero exercício abstrato, mas que, certamente, cada um poderá adaptar à sua realidade pessoal.
Li um artigo interessante de Vítor Ferreira no Público em que concluía: “tóxico é o chefe que fica com os teus louros, por norma sem te agradecer; tem uma postura que muda consoante quem está na sala, subserviente com a hierarquia, mas autoritário quando está com os seus colaboradores; é um controlador, muitas vezes assimétrico, criando injustiças”.
Nesta altura certamente o leitor estará à procura de “cabeças” a quem caiba este “barrete”, tal Cinderela e o sapato!
No meu trabalho como médico é frequente ter inúmeros desabafos de utentes sobre as suas chefias distópicas, desalentadoras e no fundo ineficazes e, não raramente, serem a causa de doenças psicossomáticas no trabalhador. Este é certamente um assunto importante e, conjuntamente com outros, está no cerne da produtividade que temos na nossa nação.
Muitos chefes parecem esquecer que eles mesmos estão na “Dependência” dos trabalhadores que gerem e que a sua gestão é feita pelo “Exemplo” que eles mesmos dão aos seus colaboradores. Daí decorre que LIDERAR significa trabalhar as ferramentas da confiança e respeito mútuos, enquanto que CHEFIAR resume-se apenas à administração do medo e temor entre os colaboradores. Daí decorre outra clivagem importante, os LÍDERES contestam de forma fundamentada a sua hierarquia com o intuito de inovar e fazer avisos sérios à navegação da empresa ou entidade, enquanto que os CHEFES obedecem cegamente aos seus superiores e dedicam-se a administrar o “status quo”.
Olhemos à nossa volta. Qual a empresa ou entidade onde após um desaire com consequências graves o chefe assume o erro? Não ouve outras opiniões ou, ouvindo, nunca as aplica? Não cumpre o prometido? Ou cumprindo, só o faz sob pressão? Critica os subordinados, mas não ensina a melhorar o desempenho ou cria mecanismo de apoio? Não dá incentivos ao bom desempenho? Não agradece pessoalmente a quem merece e diz-lhe o porquê? Contrata mais barato esquecendo trabalhadores com dezenas de anos de casa? Tem alguns colaboradores “protegidos” independentemente do seu mérito objetivo? Não inova? Não partilha o poder? Sonega informação? Não permite a transparência dos processos? Mente? Assedia, seja na forma ou na intenção?
Reconheço que definir com critérios objetivos aquilo que é um bom ou mau chefe é difícil e dependente da perspetiva em que cada um de nós se encontra. Mas creio que identificar um é bem mais fácil.
Muitas vezes ouvimos críticas sistemáticas aos colaboradores. Indiscutivelmente algumas têm toda a assertividade. Mas quem os forma, gere e seleciona os colaboradores são de fato as hierarquias. A qualidade e a visão de quem lidera uma empresa, uma entidade ou um país é o melhor instrumento para o seu sucesso na economia e num mundo cada vez mais competitivo.