Afinal as pessoas querem ou não querem trabalhar?
Na semana passada ao tentarmos almoçar no Centro do Funchal quase todas esplanadas estavam cheias, até que encontrámos uma com mesas disponíveis. Sentámos e passado alguns minutos uma funcionária veio junto a nós e informou-nos que dado os pedidos que já tinham para executar, o nosso almoço demoraria pelo menos 45 minutos a ser preparado. Perguntámos a razão de tal atraso e respondeu-nos que não era que os pedidos fossem muitos, mas estavam com pouco pessoal tanto para servir como na cozinha finalizando com a afirmação: ”sabe, as pessoas não querem trabalhar”.
Ao ouvir, mais uma vez, esta frase relembrei o que costumava ensinar aos meus alunos nas aulas de Economia do Trabalho. No modelo introdutório simples que lhes apresentava o indivíduo tirava satisfação dos bens que consumia e do lazer (ou ócio) que tinha. Como surgia então o trabalho? O trabalho era uma parte do lazer que o indivíduo vendia no mercado para receber um salário/rendimento que lhe permita comprar os bens que lhe traziam satisfação. Assim o indivíduo perdia satisfação ao reduzir o tempo de lazer, mas essa redução era mais do que compensada pelo aumento do consumo de bens que o salário lhe permitia obter. Neste modelo ninguém quer trabalhar por trabalhar, mas trabalha para ter mais bem-estar do que teria sem trabalhar devido ao nível de vida que o rendimento do trabalho lhe permite ter.
Será que “as pessoas não querem trabalhar”? As ditas “pessoas que não querem trabalhar” estão a dizer que as condições que lhe estão a ser oferecidas não são as necessárias para melhorarem o seu bem-estar começando a trabalhar. Existem dois modos de passarem a trabalhar: 1) melhorando as condições de trabalho com melhores salários (ou menos impostos) ou empregos mais amigos das famílias ou 2) diminuindo o seu bem-estar quando não trabalha, ou seja, havendo uma diminuição dos apoios. Para mim não tenho dúvidas que a primeira opção é a melhor, apesar de constatar que muitos são defensores da segunda, pondo em causa o mínimo de bem-estar que o Estado Social deve garantir.
A teoria económica apresenta exceções ao modelo acima como, por exemplo, o caso dos viciados em trabalho para os quais o bem-estar vem do trabalho e não do lazer, mas estes parecem ser poucos pois das muitas conversas que tive com reformados/aposentados ao longo da minha vida quase todos me referiram que estavam no melhor período das suas vidas. Também as gerações mais novas não me parecem viciadas em trabalho porque procuram cada vez mais o equilíbrio entre o trabalho, a família, o lazer e a preservação da saúde mental. Por isso o correto será dizer: as pessoas não querem trabalhar nas condições que lhes são oferecidas.
Veja-se o caso dos jovens (e outros) que não quiseram trabalhar em Portugal, mas estão felizes a trabalhar no estrangeiro. Afinal estes jovens querem ou não querem trabalhar?