Floresta Laurissilva não deverá ser ameaçada
O incêndio que lavra desde quarta-feira na Madeira pode ter um impacto ambiental significativo na zona sul da ilha, mas não deverá ameaçar a floresta Laurissilva, segundo perspetivou hoje o professor universitário e ex-presidente da Quercus Hélder Spínola.
"Neste momento, a floresta Laurissilva está particularmente nas encostas viradas a norte. São um espaço mais húmido. A própria floresta Laurissilva é muito mais resistente aos incêndios do que esta floresta exótica, com muitos elementos invasores", referiu Hélder Spínola à agência Lusa, em jeito de balanço sobre o incêndio.
O académico explicou que onde o fogo lavra com maior intensidade (zona sul da ilha da Madeira) predominam sobretudo "espécies exóticas e invasoras", ainda que com alguns "elementos nativos próprios".
"Isto não quer dizer que as perdas não sejam relevantes. São, sem dúvida. Estas zonas afetadas pelos incêndios estavam a recuperar os seus elementos naturais, ao longo dos anos. Estamos a falar de incêndios que são cíclicos", apontou.
Hélder Spínola referiu que os ecossistemas mais bem preservados da ilha, do ponto de vista da biodiversidade, estão nas encostas viradas a norte e que, "felizmente ainda não estão a ser afetadas pelos incêndios, nomeadamente a floresta Laurissilva.
"O que nós temos assistido em anos anteriores é que estes incêndios têm tendência a descontrolar-se nas encostas viradas a sul, onde as condições são mais propícias, atingem fortemente as zonas mais altas e, em algumas situações, acabam por começar a afetar as encostas mais voltadas para norte. Mas, quando isso acontece, perde força, devido à humidade da Laurissilva, e, felizmente, tem atingido apenas as zonas limítrofes da floresta", apontou.
Segundo referiu o antigo presidente da Quercus, a reincidência dos incêndios vai contribuir para uma "degradação dos elementos naturais" da flora da ilha da Madeira e para a "erosão dos solos."
"Estas paisagens afetadas pelo incêndio vão perdendo o seu solo, vão ficando mais frágeis. Com as chuvas, os materiais que compõem os solos vão sendo arrastados e os solos tornam-se mais pobres", alertou.
No que concerne à prevenção de novos incêndios e à gestão florestal, o académico defendeu a necessidade de tanto os municípios, como o Governo Regional, desenharem planos de defesa da floresta.
"Os planos em si, como documentos, não mudam diretamente nada da realidade do território, mas são essenciais para planear um caminho e ao longo do tempo seguir um percurso que permita mudar a realidade da paisagem", defendeu.
O incêndio rural deflagrou na quarta-feira nas serras da Ribeira Brava, propagando-se no dia seguinte ao concelho contíguo a este, Câmara de Lobos, e, já no fim de semana, ao município da Ponta do Sol, através do Paul da Serra.
Até domingo, 160 pessoas foram retiradas das suas habitações por precaução e transportadas para equipamentos públicos, mas muitos moradores já regressaram ou estão a regressar a casa.
O combate às chamas tem sido dificultado pelo vento, agora mais reduzido, e pelas temperaturas elevadas, mas não há registo de feridos ou destruição de casas e infraestruturas essenciais.
O fogo mobiliza perto de duas centenas de operacionais (inclusive do continente e dos Açores) e algumas dezenas de viaturas, além do meio aéreo do arquipélago, com as atenções centradas sobretudo nos concelhos da Ribeira Brava e da Ponta do Sol.
O presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, afirma tratar-se de fogo posto, mas as causas ainda não foram divulgadas.