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Crónicas

O pai moderno saberá…

Que pai sou eu, para inspirar os valores e qualidades que quero que cresçam nos meus filhos? É que pais: a forma como lidamos connosco dá o tom para todas as relações que temos na vida.

A parentalidade é um dos temas mais atuais. Se para muitos é a melhor experiência da vida – pode até ser o melhor curso de desenvolvimento pessoal do mundo - para outros, a exigência é demasiada e traz consigo muitas dúvidas, receios e inseguranças. E neste último grupo incluem-se sobretudo, pais, homens. O meu convite, hoje, é que possamos refletir juntos sobre o papel dos pais da era moderna. Essencial na construção da sua própria identidade, na dos filhos, na harmonia e bem-estar do todo. Antes de continuar, quero apenas lembrar que não existe um manual de instruções para nos tornarmos “mães e pais perfeitos”. Até porque, a parentalidade não é sobre perfeição, é sobre conexão. É sobre maturidade emocional.

Em pouco mais de duas décadas, acompanhando a tendência de muitos sectores sociais, muita coisa mudou no que se refere à parentalidade. Há 20 anos, a maioria das mulheres não trabalhavam fora de casa e acumulavam a educação dos filhos. O pai era uma figura mais ausente e que, quando em casa, tendia a exercer comportamentos mais autoritários. Hoje, na maior parte dos casais, a educação dos filhos é muito mais partilhada. Mesmo quando o casal se divorcia (sempre que exista essa consciência).

Este foi um dos primeiros temas a abordar na nossa família, por sermos uma ‘família recomposta’, além de multicultural, onde o meu marido tem um filho e eu duas filhas, frutos dos primeiros casamentos. As meninas vivem connosco, em permanência, o filho, por estar a estudar em Lisboa, só está (fisicamente) connosco nas férias e pausas letivas. Lembro-me das primeiras conversas de casal que tivemos e foi acerca de quais os valores que ambos queremos ver crescer nos nossos filhos: Aceitação? Inclusão? Cuidado? Respeito? Integridade? Empatia? Tolerância? Pensamento inovador e crítico? Resiliência? Responsabilidade? Partilha? Paciência? Auto-cuidado? Motivação? Empreendedorismo? Não-julgamento? Curiosidade? Tudo isto e mais… Pais emocionalmente maduros sabem que os filhos aprendem pelo exemplo e não pelas palavras que escutam. São pais que sabem que os filhos constroem as suas crenças e valores à medida que observam. De ouvidos à escuta, olhos bem atentos e coração aberto.

Ao pai atual pede-se, por isso, mais responsabilidade e consciência para entender que estar com os filhos não tem a ver com a quantidade de tempo, e sim, com a qualidade de tempo e presença que lhes dispensa. É uma questão de prioridades. Pais (e mães) devem estabelecê-las e, em certa altura da vida, a sua prioridade deve ser estar com os seus filhos. Ponto.

Ao pai da era moderna pede-se que seja intencional, que esteja muito atento aos filhos, acompanhando o seu desenvolvimento em toda a plenitude, apoiando-os, guiando-os de forma a que cresçam mais autónomos e criativos. Uma postura que se diferencia do papel tradicional em que o pai era muitas vezes o censor. Hoje, ao pai pede-se mais flexibilidade e menos rígidez. Que seja um pai atento às necessidades dos filhos, que viva em autenticidade, igual valor, dignidade, integridade e com responsabilidade.

O pai moderno reconhecerá os desafios e saberá que uma das melhores ferramentas que poderá utilizar para lhes responder é remover o peso das expectativas da equação, vendo os filhos e as situações exactamente como são. Aqui e agora. Sem cargas emocionais extra.

Além disso, estenderá os braços aos filhos para nutrir a autoestima dos mesmos… para que estes ganhem ousadia e coragem para serem eles próprios e incentiva-os a seguirem as atividades onde se sintam bem, fisica e emocionalmente, e não aquelas que o pai (ou a sociedade, em geral) considera serem as melhores.

O pai moderno protegerá, sem ser ‘helicóptero’, e procurará compreender as opções dos filhos e apoiá-los-á na suas escolhas. Não lhes dará tudo o que querem, mas oferecer-lhes-á tudo o que precisam a cada momento. E essa é a diferença que faz a diferença. É a diferença entre ser um pai generativo, consciente, e um pai permissivo. É que o comportamento dos filhos não é quem eles são e é sempre uma forma de comunicação de necessidades não preenchidas. Alterá-lo sem o compreender, apenas cria maior desconexão entre pais e filhos. E maior desconexão da criança consigo própria.

“Ama-me quando menos mereço, porque é quando mais preciso.”

Sobretudo para os homens, pais, orientados desde cedo a proteger e a resolver problemas, é urgente a consciência de que quando algo perturbador acontece - mesmo que pareça insignificante para um adulto -isso faz com que a criança/ adolescente, sinta medo, tristeza, raiva ou uma combinação de tudo isso. Instala-se no sistema nervoso a insegurança e o corpo é inundado por hormonas de stress o que impossibilita o acesso à calma. Sem ajuda, este ser fica cada vez mais stressado e pode chegar ao colapso total. A ciênciademonstra que uma criança ou adolescente que faz ‘birras’ regulares não está a passar por ‘uma fase’, não está a ‘manipular’, nem está a ‘portar-se mal’, está apenas preso num ciclo de stress e precisa de ajuda para sair dele. Viver frequentemente, níveis de stress elevados é assustador e à medida que o mundo à volta começa a recorrer a cada vez mais estratégias de controlo de comportamento e opressão, aumenta o risco de colapso. Este ciclo pode ser uma experiência muito stressante para o adulto, já que parece que qualquer coisa pode desencadear uma explosão. Os nossos sistemas nervosos são sensíveis um ao outro e por isso, estarmos perto de alguém desregulado pode facilmente desregular-nos. Portanto, que fique claro: o que parece ser uma birra, é tão só o sistema nervoso a tentar comunicar que está fora de controlo – que está a procurar ajuda para se sincronizar, para se regular e acalmar. Quando um filho está num estado de desregulação (vulgar birra), não precisa de ser corrigido, precisa de ser ajudado. Precisa de ter as suas necessidades preenchidas. Ou seja, suprir necessidades, sem ceder aos desejos.

O pai moderno saberá que a tomada de consciência do que se passa dentro de si próprio, e uma imensa curiosidade em conhecer os filhos - são os pontos de partida para uma transformação profunda na qualidade da relação entre pais e filhos.

Para concluir, o pai moderno não terá sempre de concordar com a mãe dos filhos, mas terá sempre o dever e o exemplo de dialogar e de a respeitar (e vice-versa). É, também assim, assim que os filhos aprendem sobre humanidade e amor ao próximo. Amor gera amor. O que queremos que os nossos filhos deem ao mundo, pais?