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Crónicas

Nas costas dos outros, vemos as nossas

Deixamos os nossos próprios objectivos para procurar aquilo que achamos que os outros querem ver

Passamos a vida a olhar para trás. Sempre com receios e dúvidas do que os outros pensam de nós. Muitas vezes vivemos em função disso. Deixamos os nossos próprios objectivos para procurar aquilo que achamos que os outros querem ver. Somos prisioneiros de uma fábula que nós próprios criamos para agradar. Injetam-nos metas desde pequenos, dizem-nos que é por ali ou por acolá, muitas vezes como reflexo do que os nosso pais não foram mas gostavam de ter sido. E nós lá vamos atrás, muitas vezes sem pensar, outras sem medir as consequências. Umas vezes somos nada e outras tudo, na procura desenfreada do que os outros desejam para nós. E nem sempre, mesmo com a melhor das intenções, o que desejam para nós é o que verdadeiramente nos faz sentido. Só nós sabemos.

Nessa caminhada profissional a que nos submetemos, muitas vezes por imposição social, também vai enrolada a nossa construção pessoal. O que somos e para onde vamos, o que nos vem de trás mas acima de tudo a nossa verdadeira noção do que é certo ou errado. Às vezes é duro perceber olhando para trás que chegámos a defender bandeiras que não eram as nossas que lutámos por pessoas que nem valiam a pena. Essa capacidade de nos encontrarmos no presente é também o melhor elogio que podemos alguma vez fazer a nós próprios. Aceitar que mudámos de opinião, assumir erros, entender a razão das coisas, perceber que quando pensamos em determinado assunto chegamos a uma conclusão bem diferente do que nos tentaram impor. E nada disso deve ser pesado em nós. É uma razão de inteligência colocar temas em prespectiva e sentir o que nos move. Interrogarmo-nos acerca do que nos rodeia. Porque é que pensamos assim? Qual é a razão para defendermos aquilo?

Neste complexo emaranhado de “porquês”, vamos desenvolvendo relações. Pessoas a quem nos afeiçoamos, gente de quem gostamos ou com quem nos identificamos por isto ou por aquilo. Esses que nos acompanham são parte fundamental do que somos. Sem querer acabamos por nos aproximar dos que pensam da mesma forma, dos que num determinado momento vivem o mesmo registo. Seja ele bom ou mau. Talvez por isso não sejamos realmente donos da nossa escolha e inconscientemente acabamos por nos inserir em grupos e tribos que nos puxam para um pensamento coletivo. Esses que se formam à nossa volta como bolhas acabam por nos identificar para os outros. “Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és” já dizia o ditado popular. Dentro dessa amalgama de sentimentos, paixões e desilusões, acabamos por perceber em razão do tempo que sobram muito poucos. São exatamente esses poucos que nos podem fazer a diferença. Se andamos tranquilos na rua ou se intrigas e mesquinhices nos consomem a cabeça. Se temos a certeza de que quem ficou é quem gosta ou se nos perdemos em falsas ilusões. Se fomos atrás do que era para nós ou do que achávamos que nos acrescentava.

É nesse espaço temporal que olhamos para trás das costas. E é lá, muitas vezes que vemos os outros a falarem de nós. Quem são esses que se dizem nosso amigos e que falam dos outros desta ou daquela forma. É ali que conhecemos os que nos querem bem…