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Fact Check Madeira

Há a percepção de que se justifica acabar com bombas e foguetes nas festas da Madeira?

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Duas crianças, de 3 e 5 anos, foram feridas ontem ao serem atingidas por um foguete, numa festa do Estreito de Câmara de Lobos. O acidente provocou quase uma centena de comentários nas redes sociais, a maioria de pessoas que se manifestaram contra a utilização de bombas e foguetes, por os considerarem perigosos.

Haverá indícios de que a inevitável perigosidade associada ao uso de fogo (foguetes e bombas) está a atingir significativamente a população em geral?

De anos a anos, existem notícias de rebentamentos não propositados em fábricas de artefactos pirotécnicos e/ou paióis, normalmente, com feridos graves e até com registo de mortos. Mas esse não é o dia-a-dia dos períodos em que os foguetes e bombas (pequenos petardos) são usados na Madeira. No entanto, os acidentes existem.

Para termos uma ideia mais concreta da realidade e, a partir dela, perceber as razões que assistem a quem pede o fim de tais engenhos, fizemos um levantamento de notícias, publicadas no Jornal da Madeira e no DIÁRIO, sobre acidentes/ferimentos com foguetes e bombas na Madeira. O levantamento não foi exaustivo, apesar de meticuloso.

Encontrámos notícias, em especial, a partir dos anos 60 do século XX. Mas a primeira, que identificámos, foi publicada no Jornal da Madeira do dia 7 de Julho de 1926. Dava conta de um esfacelamento da mão esquerda de um homem, quando lançava foguetes.

A última notícia, que identificámos, anterior à de ontem ao fim do dia, foi publicada no dia 26 de Junho de 2022 e relatava que um homem de 20 anos havia ficado referido com gravidade, na explosão de um foguete.

O levantamento que fizemos tentou identificar notícias que associassem algumas das seguintes palavras (singulares e plurais): foguete; bomba; acidente; esfacelada. Identificámos 25 textos sobre o assunto, três deles sobre a posição da PSP e alterações à lei.

A mutilação das mãos e a perda de dedos é tónica comum aos acidentados.

Nos textos referidos são relatadas as perdas de pelo menos 40 dedos em, pelo menos, 25 mãos. Pode não parecer um número significativo, mas seguramente que o é para os atingidos e para seus familiares, além das consequências sociais que acarretam, algumas a longo prazo.

O fenómeno era muito preocupante nos anos 90 e, pelo menos, até meados dos anos 2000.

A 17 de Dezembro de 2005, vésperas de uso intensivo de bombas e foguetes – Natal e final do ano – o DIÁRIO dava conta da preocupação da PSP, essencialmente, com as bombas ilegais. Era explicado que muitas pessoas estavam “a dar entrada nas urgências do Hospital Central do Funchal e em centros de saúde de toda a Região com ferimentos nas mãos – leia-se dedos esfacelados – provocados pela deflagração de ‘bombas de Natal’ de fabrico artesanal”.

Dois anos mais tarde, o flagelo continuava e um pequeno ‘editorial’ do DIÁRIO referia-se-lhe mesmo como ‘atentados bombistas’.

Entretanto, houve campanhas de sensibilização, a PSP apertou a fiscalização e reprimiu o fabrico e venda de material ilegal e isso teve reflexos na diminuição dos acidentes, pelo menos dos noticiados, o que se pode ler como provável diminuição real. O que não significa que não tenha havido acidentes menos importantes.

Um dos indícios que se extraem do levantamento das notícias realizado é que cerca de 30% dos incidentes envolveram crianças. Várias por brincarem com foguetes não rebentados e abandonados.

Nas últimas duas dezenas de anos, não conseguimos identificar profissionais de comercialização e/ou lançamento de fogo (com carta de estanqueiro), que tenham sofrido acidentes (se existiram ou não foram noticiados ou não conseguimos identificar as notícias).

Como se pode constatar, pelo que que aqui fica esclarecido, a manipulação de artefactos pirotécnicos continua a ser uma actividade de risco, em especial, quando alguém não preparado o faz ou quando os artefactos não são construídos por entidades devidamente licenciadas. As crianças estão particularmente expostas ao risco. No entanto, se usados exclusivamente por profissionais ou por um público a quem os artefactos são destinados, o risco é minorado e os acidentes raros.

Apesar disto, a quantidade de casos ocorridos ao longo dos anos, ainda que em queda, e as consequências graves, perdas de dedos e até de mãos, cria a percepção (mesmo que não abranja toda a população) de se estar perante um fenómeno generalizado e grave e que valeria a pena acabar com os foguetes e com as bombas. Por isso, consideramos a afirmação em análise verdadeira, o que não significa estarmos a defender o fim do uso de bombas e foguetes ou o seu contrário.

Há a percepção de que com tanto acidente com foguetes é preciso acabar com eles - síntese de comentários no Facebook à notícia sobre duas crianças feridas com foguetes