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Explicador Madeira

Vai e vem dos auxílios de Estado

União Europeia tem mecanismo para recuperar benefícios indevidos

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Portugal perdeu ontem o recurso no Tribunal de Justiça da União Europeia sobre as ajudas de Estado concedidas a empresas da Zona Franca da Madeira, auxílios dados entre 2007 e 2014 e considerados ilegais pela Comissão Europeia. A Região também já tinha perdido o recurso em Junho do ano passado. Esta nova decisão significa na prática que os benefícios terão de ser devolvidos pelas empresas. É aqui que entra a recuperação de auxílios estatais ilegais da União Europeia.

A recuperação de auxílios estatais ilegais tem por base um conjunto de regras e procedimentos com vista a corrigir irregularidades e a repor a normalidade do mercado interno. Estão definidos no Regulamento Processual (Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho).

A decisão de recuperação surge na sequência de a Comissão Europeia identificar um auxílio estatal em violação das regras e exigir a restituição desse montante através do Estado-membro. Os países têm obrigação de dar seguimento a esta medida e cooperar na investigação e no esforço de recuperação. A determinação de que o auxílio é ilegal leva a que a Comissão Europeia seja obrigada a ordenar a recuperação do auxílio.

Em 1973 o Tribunal de Justiça da União Europeia deu à Comissão poder nesta matéria, tendo em 1999 um primeiro regulamento com as regras básicas sido criado. Além do Regulamento Processual, em 2007 foi explicada a política e a prática sobre recuperação de auxílios numa comunicação. Mais recentemente, em 2019, houve uma nova comunicação relativa ao tema, que é a fonte deste trabalho.

O principal objectivo da recuperação de auxílios estatais ilegais é corrigir as distorções que prejudicam a igualdade das condições de concorrência no mercado interno. O Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia impede os Estados de conferirem vantagens financeiras que levem a distorcer a concorrência e a recuperação das verbas constitui “o corolário necessário da proibição geral de concessão de auxílios”, segundo o Tribunal de Justiça Europeu.

“Ao restituir o auxílio ilegal, o seu beneficiário perde, efectivamente, a vantagem de que beneficiou relativamente aos seus concorrentes”, sublinha a Comunicação. A este montante são acrescidos também juros até à data efectiva da recuperação, uma forma de garantir que não há vantagens acessórias pelo tempo em que o dinheiro esteve disponível, indevidamente, na empresa.

Para os Estados-membros, diz a Comunicação, a recuperação de auxílios estatais “não constitui uma sanção, mas sim uma consequência lógica do facto de estes terem sido considerados ilegais”.

O artigo 16.º do Regulamento Processual estabelece que a recuperação “será efectuada imediatamente e segundo as formalidades do direito nacional do Estado-Membro em causa, desde que estas permitam uma execução imediata e efectiva da decisão da Comissão”. No artigo seguinte diz que tem um prazo de prescrição de dez anos, a contar da data em que os fundos foram concedidos. No caso de reduções fiscais, começa a contar para cada exercício fiscal na data na qual o imposto é devido.

Falando ainda de tempo, a Comissão dá dois prazos aos Estados-membros envolvidos no processo. Um primeiro para enviar informações precisas sobre as medidas que planeou e já empreendeu com vista à recuperação (geralmente, no prazo de dois meses a contar da sua notificação); e depois um segundo, geralmente de quatro meses a contar da sua notificação, para cumprir a obrigação de recuperação.

“As medidas adoptadas pelo Estado-Membro não podem apenas visar a execução imediata e efectiva da decisão de recuperação, mas devem efetivamente consegui-la”, destaca a Comunicação, publicada no Jornal Oficial da União Europeia.

A legislação Europeia sobrepõe-se à nacional, o mesmo acontecendo nesta matéria. E no caso específico aplica-se o princípio da autoridade do caso julgado, cujas decisões já não podem ser postas em causa. Mas reconhece também a “existência de circunstâncias excepcionais que tornem absolutamente impossível” a um Estado-Membro executar uma decisão de recuperação. Nestes casos, o Estado “deve demonstrar que tentou, de boa-fé, recuperar o auxílio e deve cooperar com a Comissão”. Dizer que tem dificuldades jurídicas, políticas, práticas ou internas não é aceite, esclarece o documento. A falta de legislação no país sobre a matéria também não é aceite e a situação deve ser imediatamente alterada. “O Estado-Membro em causa pode ter de adoptar novos actos jurídicos, incluindo legislação, ou revogar disposições do direito nacional que não permitam a eliminação rápida das dificuldades encontradas”. Além disto, as tentativas de recuperação “devem ser exaustivas e devidamente substanciadas com provas”, determina a Comunicação.

A obrigação de recuperação de auxílios estatais ilegais também não tem em conta a situação financeira da empresa, a menos que tenha sido liquidada, esclarece.

Cabe aos Estados designar a entidade responsável pela execução da decisão de recuperação e o procedimento nacional de execução é livre, desde que leve ao objectivo. Os Estados podem pedir a prorrogação do prazo de recuperação à Comissão, mas é aceite apenas em circunstâncias excepcionais.

Depois de notificado o Estado-membro há uma reunião para partilha de informação e orientação por parte da Comissão. A recuperação de auxílios estatais ilegais prevê a recuperação dos benefícios não apenas directamente da empresa que os recebeu, mas indiretamente através de outras do grupo, de vendas, participações. Nesta fase, caso ainda não tenham sido, são identificados os benificiários, os montantes a restituir e as formas planeadas para o fazer. Caso esteja em processo de insolvência, entra na lista de credores.

O processo contempla duas fases de encerramento. O provisório é quando decisão de recuperação foi provisoriamente executada por um Estado-Membro, mas não pode ser considerada como definitivamente executada, neste caso o país deve informar a Comissão uma vez por ano do andamento do processo. E há o encerramento definitivo. Mas “nem o encerramento provisório nem o encerramento definitivo de um procedimento de recuperação impedem a Comissão de proceder de novo a uma análise mais detalhada da questão ou de reabrir o processo”, lê-se na Comunicação.

Diz também o documento oficial, um guia para estes processos com vista à reposição da normalidade, que se o Estado-membro em causa não tiver dado cumprimento à decisão ou não tiver conseguido demonstrar a impossibilidade absoluta de recuperação, a Comissão pode dar início a um processo por infração. “A obrigação de recuperação é uma obrigação de resultados”, esclarece.