Os parasitas
Quando Torga lembrava que “em Portugal, as pessoas são imbecis ou por vocação, ou por coação, ou por devoção” grandes matilhas se revoltavam contra tais declarações, possivelmente por se reverem nelas e, com isso, caírem no estado de virgens ofendidas. A verdade é que os anos passam e cada singela palavra de Torga brota na efetiva e triste realidade. Exemplo disso são os parasitas – muitos deles algozes – que ,por vocação, coação ou devoção, se prestam à fervorosa submissão dos homúnculos que surgem como futuros gerontes do candoroso intelectualismo – rasca, note-se.
A política, a este propósito, não foge à regra – antes pelo contrário. As sirigaitas que proliferam nas fileiras da ação política, e partidária, dissecam todos os valores humanos que trilham uma civilização minimamente decente de seres humanos que, utopicamente, partilham o mesmo propósito – mudar o Mundo. Estes parasitas revertem qualquer sentido humanístico, tomado pelo senso comum, em vinganças pessoais que alimentam os inflamados egos vicejantes em épocas medievais, onde a idiotice serve de modelo para sustentar as suas súbitas irrealidades.
A cultura secular de autossalvação é a primeira das fábricas de parasitas que, quando avistam, no horizonte lunático, a oportunidade de chegarem à boia, resvalam no lamaçal do medievalismo triunfante que nunca seria atingível se a confortabilidade do seu estipêndio nunca tivesse sido posta em causa.
“Gratidão. Sem ela seria a selva” – dizia Rui Rio. O homem que permaneceu no mais ingrato cargo político – líder da oposição – por uns duradouros quatro anos, sabe bem quais os valores e princípios que guiaram todos aqueles que o acompanharam numa navegação turbulenta, contra ventos e mares, contra marés e tempestades, até mesmo quando era loucura apoiá-lo. Não faltaram parasitas em tal época, e, ao que parece, de forma tipicamente cancerígena, migraram e multiplicaram-se pelas águas fétidas do Oceano.
Aqueles que germinaram no auge das lideranças triunfantes, que são hoje imaginariamente contestadas, ou que nelas medraram, ostentam por aí a, agora, abjuração do legado que lhes permitiu serem quem são. Num maniqueísmo primário, em que a frontalidade não conhece lugar no dicionário, há quem prefira remeter a amizade ao silêncio engenhoso, onde os bastidores conhecem a genuína intenção que, até agora, andava confortavelmente enjaulada numa fúria adormecida.
A ebulição da verdadeira essência humana constituirá o caminho mais fácil para conhecer quem realmente caminha lado a lado, ou, em última análise, atrás – predileta posição dos parasitas que lhes permite ter a visão de tamanha traição. Os parasitas são aqueles que, na falta de conveniência, procuram-na, sem dó nem piedade, sem olhar a meios para atingir os fins, ainda que isso configure no niilismo do seu cadáver político.
Os parasitas movem-se em vastíssimos meios, todos aqueles que lhes aprouverem para cumprirem os seus desígnios – mais ou menos reivindicados, mais ou menos justos –, sendo que o nicho criado ao seu redor junta personagens de todo o tipo – uma segunda camada parasitária que aprofunda o lamaçal em que mergulhou o mais obtuso dos parasitas.
A matilha parasitária é a representação, em grande número, do ódio pessoal que os atiça e da perseguição bafienta que os motiva. Ainda assim, os parasitas são merecedores de um líder que, normalmente, corresponde ao típico escanzelado impotente na argumentação e incompetente na dialética, já que toda a sua vida viveu à custa daqueles que o suportavam, ou seja, no fundo, trata-se de uma demonstração absoluta do parasitismo e do logro em que vingam os “imbecis”, quer seja “por vocação, coação ou devoção”.
Não há parasitismo que resista à efabulação de fantasmas que dizem assombrar quem os serve, sem que para isso fiquem plasmados em tempos imemoriais, e, provavelmente, irrepetíveis, uma vingança sem corpo que agracia cobardes e ratos morais ainda que, em degradante medida, constitua uma derrota certa – intrinsecamente, é a encenação teatral mais real do conhecido tiro de pólvora seca, já que não haverá hospedeiro que resista a tamanha insídia. E, com isso, morrerá também o triste parasita.
Acontece que os parasitas deixam morrer todos os princípios morais básicos da civilização, e não carecem do bafejamento das capacidades impostas para a lide da Anta de Paiva, por mais apetitosa que esta seja – ou melhor dizendo, por se tratar do único útero que perpetuaria, temporariamente, a continuidade no proletariado que tivera sido interrompida pelas supostas elites plumitivas. Esquecem-se os parasitas que tudo isso diz muito mais deles do que dos seus maléficos companheiros.
Da minha parte, recuso-me, categoricamente, a ser um parasita.