Turismo, um mal necessário
Não tendo muita matéria prima para produção e exportação, a Madeira vê-se obrigada a sobreviver do turismo devido ao seu clima ameno nas quatro estações do ano. Todavia não estamos preparados para turismo de massas. Embora tenhamos capacidade de resposta em alojamento começamos a sentir as nossas limitações no que respeita às nossas estradas, às nossas serras e ocupação de lugares comuns. Obviamente não estou contra o turismo, a maior fonte de receita desta região, todavia urge repensar seriamente no futuro dos indígenas que prepararam a ilha para que hoje possamos ter turismo e agora estão a ser relegados para segundo plano porque a economia não olha a meios para atingir objetivos económicos. Quem sabe, desterrar-nos para as Desertas ou Selvagens para que os turistas se sintam bem. Subrepticiamente o turismo, com o seu poder económico, foi criando uma ilha para ricos onde os locais continuam pobres. Alguns lançarão um “flyer” com o slogan que se não fosse o turismo morríamos de fome, contudo com o turismo apenas a Região enriqueceu.
A exiguidade dos lugares turísticos ocupados pelos turistas, como o Pico do Areeiro, a levada das 25 fontes, a vereda da Ponta São Lourenço, as queimadas etc, não deixam espaço para os locais porque estão superlotados pelos turistas. As rent-a-car, pelas mãos dos turistas têm invadido as nossas estradas criando filas enormes, os estacionamentos abusivos diabolizam o dia-a-dia dos condutores profissionais e amadores da ilha. Os bens alimentares encarecem porque os hotéis absorvem tudo para o turismo e o ilhéu nunca poderá competir com o poder de compra dos hotéis para alimentar os turistas que nos visitam. O AL absorveu as habitações para arrendar e os “vistos gold” inflacionaram desmesuradamente o m2 de terreno o qual está a preços proibitivos para os locais.
Se por um lado precisamos do turismo porque gera empregos, por outro está a tornar a vida impossível aos residentes. Lembro-me quando a Madeira e o Porto Santo eram “cantinhos do céu” onde podíamos usufruir de privacidade, paz e sossego mas o progresso, base da economia, cada vez mais tornam esses pequenos privilégios impossíveis de alcançar. Não sendo retrógrado sou saudosista desses momentos embora saiba que, devido à evolução planetária, jamais voltarão.
Se o turismo é um mal necessário compete aos nossos governantes pensarem seriamente no futuro. Como? Quem sabe, evitando o turismo de massas ou “pé-descalço”, que pouco contribuem para a nossa economia, e condicionando a entrada a quem não tenha um hotel por destino. Afinal, somos ou não um destino de excelência? Outro mal necessário foi o AL que permite o turismo de massas. Em suma, se como é óbvio não podemos matar a galinha dos ovos d’ouro, crie-se condições para os locais, pois não queremos ser estrangeiros na nossa própria terra ou expulsos para que os turistas se sintam à-vontade.
Por outro lado os nossos meios de socorro, bombeiros, socorristas de montanha e helicóptero, são confrontados, quase diariamente, com uma grande azáfama devido à incoerência de turistas irresponsáveis que apenas por uma “selfie” colocam a sua vida em risco, além dos custos para a Região pago com o nosso dinheiro. Depois ainda têm a ousadia de criticar a sinalização perigosa e a prontidão do socorro como aconteceu no caso da italiana Margherita Salvucci que lamentavelmente perdeu a vida por incúria na Poça das Lesmas no passado mês de junho. Precisamos de turismo? Sim, sem dúvida, mas um turismo responsável.
A taxa turística que foi largos anos vista pelos (ir) responsáveis governantes como óbice à entrada de turista, hoje já é necessária e vista como justa e de 0 euros há dois ou três anos, passou para 2€ e já se aprontam para aumentar para 4€, por dormida. Mais vale tarde que nunca, pois injusto seria 250 mil madeirenses pagarem taxa de saneamento básico, resíduos sólidos, de consumo de água, de eletricidade para conforto de mais de 1 milhão de turistas que nos visitam todos os anos.
Poucos são os que, por enquanto, se atrevem a apontar o dedo ao tema turismo pois é “pecado” falar mal da única fonte de receita da Madeira e Porto Santo, porém chegará o dia em que não poderemos ignorar ou contornar o assunto.
Ilustro este tema com outra opinião hilariante tornada pública em que alguém sugeria que bastava que os madeirenses evitassem visitar os locais mais frequentados pelos turistas para evitar congestionamentos. Como vêm não é exagero quando ponho por hipótese que no futuro seremos escorraçados da nossa ilha para que os turistas se sintam bem. Já nem nos é permitido “ir de férias cá dentro”.