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Joana Marques Vidal

Joana Marques Vidal deixou uma marca importante na Justiça em Portugal. Na sua serenidade firme construiu um percurso que muito dignificou e credibilizou o Ministério Público, instituição que liderou desde 12 de outubro de 2012, data em que foi nomeada pelo Presidente da República Aníbal Cavaco Silva para o cargo de Procuradora-Geral da República. É, sem dúvida, uma figura ímpar da Justiça.

Tive o gosto e o privilégio de a conhecer pessoalmente em 2015, numa visita que fez à Comarca da Madeira e que acompanhei como Presidente do Conselho Regional da Madeira da Ordem dos Advogados. Mantivemos sempre uma relação de grande respeito e de “colaboração institucional e pessoal”. Concedeu-nos, depois, no dia 1 de fevereiro de 2018, a honra da sua presença na inauguração da nova sede da Ordem dos Advogados na Madeira, um momento importante no qual a advocacia madeirense cumpriu a sua história. Joana Marques Vidal deu uma atenção especial à Madeira e manifestou sempre enorme respeito pela advocacia que assumiu como essencial à administração da Justiça.

Sempre simples, segura, discreta, independente, imperturbável, revolucionou serenamente a Justiça com incursões corajosas em terrenos que muitos achavam proibidos. Mostrou que, para a Justiça, não há intocáveis. Acreditou e fez acreditar. Tratou todos por igual. Sabia que a sociedade precisava muito disso. O “seu” Ministério Público foi corajoso, assertivo e nunca teve medo. Investigou, com consistência, um antigo primeiro-ministro, ministros e antigos ministros, altos quadros da política e dos negócios, banqueiros e a banca, militares, negócios com Angola. Investigou relações perigosas e negócios pouco claros no mundo do futebol. Investigou Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa. Despertou a Justiça em Portugal. Trouxe uma nova esperança.

A sua coragem ter-lhe-á custado o lugar que era naturalmente seu. Sabia que tinha muito caminho. Foi incompreensivelmente afastada do cargo por uma decisão de António Costa acordada com Marcelo Rebelo de Sousa. Na altura, era Ministra da Justiça Francisca Van Dunem que, antes, havia trabalhado no Ministério Público com Joana Marques Vidal, tendo sido Procuradora-Geral Distrital de Lisboa.

Joana Marques Vidal assumiu que “muita coisa ficou por fazer”. Pedro Passos Coelho, num texto de opinião, denunciou a falta de “transparência” nos motivos que levaram à substituição de Joana Marques Vidal no cargo de Procuradora-Geral da República. Ao contrário do que muitos tentaram fazer crer, a renovação do seu mandato não dependia de uma revisão constitucional. Prevaleceu a intromissão política. Todos sabemos.

Mas Joana Marques Vidal estava acima de tudo isto. Foi sempre superior, porque as pessoas grandes não dependem de designações, de nomeações estratégicas ou de qualquer tipo de escolha. Dependem apenas do que são, do que amam e das causas que abraçam com coragem, sem mais nada.

Por todas as razões, não podia, pois, deixar de prestar aqui esta homenagem a uma mulher admirável que encarnou a Justiça verdadeira, que me inspirou e que me inspirará sempre. Infelizmente partiu no passado dia 9 de julho de 2024. É uma perda tremenda. Obrigado por tudo Senhora Procuradora-Geral da República!