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Crónicas

Os avós são para sempre

Cada avó, cada avô é um património da Humanidade. Mais ou menos próximos, todos acrescentam na equação de guiar um novo ser humano. Cada um com a sua forma tão especial e tão preciosa. Os avós são a melhor fonte de transmissão de conhecimento e cultura entre gerações. Criam memórias que o tempo amplifica. São tesouros. São para sempre.

Visionária, prática, cuidadora dos seus e dos demais, uma Mulher à frente do seu tempo. Era assim a minha avó Maria Rosa. Uma das mulheres que mais influenciou a vida forma de ser e de viver. Meiga, ternurenta, generosa, um ninho de amor, a minha avó Virgínia. Hummm e o cheirinho a café de cevada e a bolo, acabado de sair do forno, que invadiam aquela cozinha e os sentidos?! Eram as duas tão bonitas. Tive ainda, a benção de conhecer a minha bisavó Rita, que apesar da idade avançada mantinha uma força inabalável e uma determinação ímpar em cada olhar que lançava. Dos meus avôs, Custódio e Jaime, posso dizer que brilharam e iluminaram o palco dos Homens com “H” maiúsculo.

Revejo em mim, valores, comportamentos e gestos de todos os meus avós. Revejo nas minhas filhas exatamente o mesmo, agora dos meus pais (avós maternos) e dos avós paternos. E que bonito é!

Quando moram perto, os avós são uma das principais redes de apoio para mães e pais no cuidado às crianças. É com eles que contamos nas horas boas e sobretudo, nas mais desafiantes. Converso com os meus, todos os dias, e ainda assim, sinto, eu, as meninas e o meu marido, a falta que os meus pais nos fazem por não viverem na Madeira. Esse apoio direto é tão essencial, na correria dos dias.

Há datas que precisamos mesmo de lembrar e Dia 26 de Julho assinala-se o Dia Mundial dos Avós (que na nossa família é de celebração diária). Lembrança feita, avanço para a minha crença de que o mundo parece estar um lugar pouco seguro. Mas a questão não é tanto se o mundo é um lugar seguro. A questão é mais se nós somos um lugar seguro para o mundo que somos. E os avós, os verdadeiros, biológicos ou não, são.

É inegável a contribuição dos avós na educação dos netos. A relação intergeracional que os une, nutre a auto-estima (o sistema imunitário social), oferecendo benefícios para a vida e para toda a comunidade. Estas relações são, geralmente, marcadas por dinâmicas interpessoais significativas. Além da transmissão de conhecimento, cultura e história familiar, amplia-se a percepção da diversidade, de tradições e hábitos entre gerações, de empatia, respeito e admiração, constrói-se uma identidade própria e a noção de pertencimento.

O aumento da esperança média de vida trouxe profundas mudanças para as famílias, com a convivência entre mais de duas gerações a ser comum e mais duradoura nas histórias familiares.

E é engraçado perceber que quando somos crianças, os adultos parecem velhinhos. Mas ser mais velho não significa ser aborrecido, deixar de namorar ou de dançar. A idade não impede que as pessoas sejam surpreendentes, desejem e façam por ser felizes, pelo contrário. Ao promover a relação entre avós e netos, estamos a quebrar os estereótipos sobre a terceira idade e a celebrar esta fase da vida com amor, alegria, ternura e bom-humor. E estamos também, a ensinar aos nossos filhos a importância e o privilégio que é o de termos uma vida simples, na qual é necessário tão pouco para ser feliz e o quão maravilhoso é ser feliz em plenitude quando se faz o outro feliz.

Quando nasce uma avó e um avô, surgem transformações nas relações entre pais e filhos. A relação com os netos é uma oportunidade para reviver e recordar experiências na educação dos filhos e essa reminiscência auxilia no processo de ressignificação das conquistas, satisfações, dificuldades e fracassos que tiveram enquanto pais (Carter & McGoldrick, 1995). Zanatta e Arpini (2017) destacam que os avós podem ser orientadores dos seus filhos nesta nova caminhada: a de serem pais. Destacam, ainda, que os filhos podem voltar a ter um sentimento de pertencimento, que se pode ter perdido com a independência, casamento e saída de casa, e portanto, a chegada dos netos abre as portas a uma reaproximação da família como um todo.

Os avós, por norma, têm mais experiência, mais tempo disponível e do ponto de vista afetivo oferecem as condições ideais para apoiar no crescimento dos netos e desfrutar do convívio com estes, sem o stress e as dúvidas associadas à parentalidade. Por outro lado, os avós, são conhecidos por serem especialistas em quebrar regras e limites desenhados pelos pais. Uma delícia (às vezes em forma de à beira de um ataque de nervos) para os que, como eu, acreditam que crescemos com as diferenças. Estes comportamentos dos avós tornam-se uma espécie de concorrência desleal aos pais. E ainda bem.

Os sorrisos mais bonitos que vejo à porta das escolas das minhas filhas, são os dos avós que vão levar e buscar os netos. Os abraços mais ternos e prolongados, também. Os avós fazem truques e magias. Fazem teatros e contam histórias. Deixam comer doces às escondidas ou mesmo, tantas vezes, à descarada. Às vezes, sinto que os avós, são eles próprios, açúcar. Trocaram a austeridade que vestiram no papel de pais, pela generosidade e amor incondicional. Os bons avós são inspiradores. Não se explica, vive-se. E o que dizer das parecenças físicas, que conseguem ser tão vincadas que há netos a parecer serem filhos dos avós?! A minha filha mais velha tem tantas parecenças com a avó materna que há quem brinque e diga que esta neta é a filha que aquela avó nunca teve. Já a mais nova, é tão parecida com o meu pai, o avó materno.

Os meus pais falaram sempre dos seus avós com amor infinito e gratidão. Eu faço o mesmo. O meu marido, também. E por sermos uma família multicultural, essa riqueza aumenta. Quero aqui agradecer e honrar tudo isto.

Experienciamos a benção das minhas filhas terem vivos os quatro avós e a oportunidade de passarem um bom período de férias de verão, a sós, com os avós maternos. Estão fora da ilha, com os meus pais. Entre idas à praia, piqueniques, visitas a castelos, palácios, museus, exposições, passeios de tuk tuk, experiências gastronómicas, artísticas, caminhadas na serra, por entre ruas e ruelas de Lisboa e arredores… Muito mais do que as atividades, o que elas recebem e oferecem nestas partilhas, de experiência de vida, paixão, generosidade, vitalidade, valores, sabedoria humana e espiritual, é do melhor com que são/ somos abençoados nesta vida. Sinto que elas acreditam que é Natal. No coração dos avós e no meu, é, seguramente.