Hegemonia e Derrota
Os ataques pessoais, nas redes e nos media, apenas servem para causar danos duradouros à própria missão política e evidenciam quem é que não pode liderar
A reflexão sobre estes dois conceitos parece-me fazer sentido numa altura em que tudo é confuso e carece de argumentação sensata. A política não pode ser reduzida à pessoalização dos que, mesmo postos à margem, também querem participar na vida democrática da sua região. É bastante penoso apreciar o pensamento dos que um dia eram contracorrente e que recusavam a hegemonia do pensamento. Eram eles que, não tem muito tempo, enchiam o balão da Esperança. Os mesmos que no passado gritavam por mudança são os mesmos que, agora, recusam o direito de outros a desenharem a possibilidade da diferença.
Isto terá alguma relação com a ideia de hegemonia? Da sua relação com a derrota? Veja-se, por exemplo, a visão de Gramsci. O autor entendia que a hegemonia não é um estado fixo, mas um processo dinâmico e contestado. A derrota política, segundo o autor, pode ocorrer quando uma classe ou grupo não consegue manter ou construir a hegemonia cultural e ideológica necessária para sustentar o seu poder político. No entanto, ele também via a possibilidade de se aprender com essas derrotas para ajustar estratégias e construir uma contra-hegemonia mais eficaz. Trata-se de resistência.
A hegemonia reflete interesses sociais, relações culturais e ideológicas que subordinam e marginalizam os outros modelos de ação, inclusive dentro do seu próprio modelo, e exclui pela sujeição os membros divergentes. Serve-se do discurso ideológico para construir significados em função da conveniência política, económica e social. É a dissimulação das ideias nos pressupostos práticos. O poder da persuasão torna-se maior que o poder crítico porque, uma vez permeado no campo da ação, a ideologia encontra-se no campo da hegemonia. A hegemonia “diz respeito a um grupo organizado de significados e práticas, ao sistema de significações central, efectivo e dominante, valores e acções vividos” (Apple).
Para Gramsci, a derrota política caracteriza-se por ser uma etapa do processo constante de luta pela hegemonia. Ou seja, a derrota deveria ser entendida como uma oportunidade para análise, aprendizagem e rearticulação de estratégias. A bem da verdade, a derrota, em alguns casos, não tem servido para aquilo que lhe é inerente: ser movimento político que une o grupo em blocos de luta mais amplos que desejam a transformação social.
Deveríamos (o leitor decidirá quem) estar a rearticular estratégias que compreendessem as causas das derrotas políticas e a criar sistemas de mobilização que indiquem a direção a seguir. Só assim se reconfiguram alianças e só desta forma é possível a superação dos atos insucedidos. Os ataques pessoais, nas redes e nos media, apenas servem para causar danos duradouros à própria missão política e evidenciam quem é que não pode liderar. É urgente encorajar a participação de todos, mostrando que não basta se se sentir incluído, mas que é preciso sentir-se bem-vindo. Se assim não for, de pouco valerá aos perdedores a hegemonia. Ela será sempre uma forma de derrota.