É proibido andar na rua com uma navalha?
É proibido andar na rua com uma navalha? A questão foi colocada por um leitor na sequência de uma agressão que aconteceu esta manhã no Funchal, em que um indivíduo usou uma navalha que trazia consigo para ferir o outro.
O Regime Jurídico das Armas e suas Munições, a Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, é o que se debruça sobre o tema das armas, incluindo as chamadas armas brancas. São definidas no n.º2 da referida lei como “todo o objecto ou instrumento portátil dotado de uma lâmina ou outra superfície cortante, perfurante ou corto-contundente, de comprimento superior a 10 cm, as facas borboleta, as facas de abertura automática ou de ponta e mola, as facas de arremesso, as estrelas de lançar ou equiparadas, os cardsharp ou cartões com lâmina dissimulada, os estiletes e todos os objectos destinados a lançar lâminas, flechas ou virotões”. Isto significa que as navalhas e facas com menor comprimento de lâmina não entram nesta classificação.
As armas são classificadas segundo o grau de perigosidade, o fim a que se destinam e a sua utilização, estando na Classe A as armas brancas dissimuladas sob a forma de outro objecto; as facas de abertura automática ou ponta e mola, estiletes, facas de borboleta, facas de arremesso, estrelas de lançar ou equiparadas, cardsharps e boxers. São ainda classificadas nesta categoria as armas brancas que não estejam destinadas a uma actividade que justifique o seu uso, nomeadamente e a título de exemplo, a caça, actividade comercial, agrícola, florestal, industrial, doméstica ou desportiva, ou ainda, diz a lei, que “pelo seu valor histórico ou artístico não sejam objecto de colecção”.
São proibidos a venda, a aquisição, a cedência, a detenção, o uso e o porte de armas, acessórios e munições da classe A. Mas estão excluídas da aplicação da presente lei espadas, sabres, espadins, baionetas e outras armas brancas que tenham interesse histórico, técnico, artístico ou estimativo, desde que justificado o seu transporte, posse, venda e aquisição. Estão também excluídas para fins de recriação histórica em eventos devidamente autorizados pela Direção Nacional da PSP, por filiados em associações de colecionadores ou em associações de recriação histórica. Nestes inserem-se a investigação científica e industrial, as produções de cinema, teatro e outros espectáculos.
Incorre em crime de posse de arma quem sem estar autorizado usar ou trouxer consigo uma “arma branca dissimulada sob a forma de outro objecto, faca de abertura automática ou ponta e mola, estilete, faca de borboleta, faca de arremesso, cardsharp ou cartão com lâmina dissimulada, estrela de lançar ou equiparada, boxers, ou ainda outras armas brancas ou engenhos ou instrumentos sem aplicação definida que possam ser usados como arma de agressão e o seu portador não justifique a sua posse”.
Esta última questão é particularmente pertinente para determinar se há ou não crime na posse de determinado objecto cortante. É que estes quando afectos ao exercício de uma actividade ou objecto de colecção têm justificada a sua posse. Se encontrados fora dos locais do seu normal emprego e os seus portadores não justifiquem a sua posse são considerados armas e os detentores incorrem no crime de detenção de arma proibida.
Segundo a lei em vigor, não é proibido ter consigo uma navalha ou faca, desde que tenha menos de 10 centímetros de lâmina (medida desde a ponta e incluindo o ricasso). Excepto se for usada como arma. É na mesma considerada arma se for usada em legítima defesa. Mas este é um terreno com alguma área cinzenta.
A título de exemplo, o Tribunal da Relação de Lisboa num acórdão de 2012, num caso de recurso de condenação pela posse de uma faca de cozinha com lâmina de 13 cm no carro, que não estava a ser usada como arma, veio esclarecer: “Só é absolutamente proibida a aquisição, a cedência, a detenção, o uso e o porte por particulares das armas brancas que integram a classe A”. Para que a detenção ou porte de ‘outras armas brancas’ constitua crime, “impõe o legislador que, cumulativamente, se verifiquem três requisitos: 1) ausência de aplicação definida; 2) capacidade para o uso como arma de agressão; 3) falta de justificação para a posse”. Acrescenta ainda: “O uso desviado das propriedades do objecto não pode servir como critério para o definir como arma proibida”.
Também a Polícia de Segurança Pública recomenda que no caso de utensílios cortantes com lâmina igual ou superior a 10 cm afectos a actividades devem ser acompanhados de documentos e meios de prova que justifiquem a posse. Alerta também a PSP que “para uma actividade doméstica (uma normal faca de cozinha por exemplo) como não existe documento que ateste esta actividade pode a PSP actuar mediante circunstâncias de tempo, local e adequação mediante cada situação em concreto e indícios evidentes”.
Perante isto, é impreciso que seja proibido andar na rua com uma navalha ou faca. É proibido para determinados tamanhos de lâmina, quando fora de determinadas actividades ou sem determinadas autorizações ou fins.