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Extrema-direita é perigo para França e para Europa

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Foto Arquivo/ Global Imagens

O antigo comissário europeu francês Pascal Lamy considerou hoje que o crescimento dos populismos e dos extremismos é um perigo para a França e para a Europa.

Lamy falava à agência Lusa depois de intervir no painel "Pensando no Futuro da União Europeia à Luz do Legado de Jacques Delors", integrado na conferência "Jacques Delors Agora -- A Próxima Geração na Europa", organizado pelo Instituto Jacques Delors, que reúne em Lisboa, até quinta-feira, 130 jovens de 30 países, , além de membros da Comissão, eurodeputados e especialistas em política europeia.

A União Nacional (Rassemblement Nationale, no original francês) foi o partido mais votado na primeira volta das eleições legislativas francesas de domingo, com 33% dos votos, à frente da coligação de esquerda Nova Frente Popular (NFP, 28,5%) e dos centristas Juntos pela República, que integra o partido do Presidente Emmanuel Macron (22%). A segunda volta das legislativas decorre no próximo domingo, 07 de julho. 

Instado a pronunciar-se sobre os resultados da primeira volta da votação, o antigo comissário europeu do Comércio e também antigo presidente da Organização Mundial do Comércio (OMC) frisou que os números registados domingo "não contam".

"Os resultados de ontem [domingo] não contam. O que interessa são os resultados do próximo domingo. E estes continuam a ser extraordinariamente incertos, mesmo que, do meu ponto de vista, a ameaça de um governo de extrema-direita seja real. Não é certo, é possível", respondeu à margem do evento da Academia Nossa Europa.

No entanto, para Lamy, há a possibilidade de se registarem outros resultados, tudo dependendo dos eleitores.

"Mas, evidentemente, sendo eu oriundo de uma escola social-democrata clássica - ao estilo de Delors, se assim posso dizer - estou obviamente muito preocupado com o meu país e sobretudo com as consequências que isto pode ter para a integração europeia", acrescentou.

Em França, prosseguiu Lamy, a RN não defende um "Frexit" [saída da França da União Europeia], como fizeram os britânicos, mas está a pensar em afrouxar gradualmente, lentamente, os laços entre a França e a União Europeia. E a França é um país - e digo-o sem qualquer arrogância, demasiado importante na UE - para que isto não tenha consequências extremamente nefastas a longo prazo", argumentou.

"Por isso, sim, [a extrema-direita, os populismos e os extremismos] continuam a ser um perigo para a França e penso que são um perigo para a Europa", frisou.

"Neste domínio -- defendeu - a UE tem de ser mais forte, e para ser mais forte tem de aumentar as suas capacidades, e para aumentar as suas capacidades tem de aumentar os seus recursos e o seu orçamento. E esta é uma questão muito importante para os próximos anos".

Questão que não se colocava no tempo em que Delors foi presidente da Comissão Europeia (1985/95), a das ameaças às liberdades civis na União está a ser levantada devido à ascensão do populismo e, em particular, dos movimentos de direita e de extrema-direita.

"Essa foi uma questão que Delors não teve de enfrentar quando era presidente da Comissão. Mas no final da sua vida estava muito preocupado com o assunto. De certa forma, estava satisfeito por ver a Europa assumir a liderança em matéria de ambiente, mas entristecia-o ver que estes problemas de perversão, de corrosão dos valores liberais e da democracia, estavam a ocorrer no seio da própria União. Isso preocupava-o muito", lembrou.

Esse foi o tema que hoje o levou a intervir na conferência: o que é que Delors, com o seu aparato intelectual e político, nos diria sobre as questões que a União Europeia terá de enfrentar nos próximos anos.

"É sempre um exercício difícil, mas penso que ele nos diria que a grande questão é como articular a sustentabilidade económica, social e ambiental, que continua a ser a grande questão para os europeus, que, em comparação com o resto do mundo, estão na vanguarda em termos sociais, estão na vanguarda em termos ambientais, mas talvez já não estejam na vanguarda em termos económicos", referiu.

Lamy disse acreditar que o legado de Delors continua a ser totalmente relevante, uma vez que as mudanças ocorreram naquilo que considerava ser a combinação correta entre a subsidiariedade, que consiste em aumentar o poder apenas na medida do absolutamente necessário, e a solidariedade, que ele considerava ser o principal vínculo de uma sociedade.

"É verdade que num mundo mais brutal, num mundo mais perigoso, num mundo que tem de lidar, por exemplo, com as alterações climáticas, a agressão russa na Ucrânia, a rivalidade sino-americana, a União Europeia tem de se tornar mais forte", concluiu.