Porto Santo

Ao chegar, depois da “Travessa” - que era o meu “Cabo das Tormentas” na infância - vendo o longo areal ouvimos imediatamente na cabeça a canção de Max. Ao desembarcar, as memórias voltam. Sair do “Pirata azul” a balancear e conseguir pôr o pé nas escadas lodacentas do cais antigo.

Logo depois de chegar a terra, é atravessar a longa “avenida” a chegar à vila. Vem logo aquele cheiro a ervas secas. Estou de volta!

Tive a sorte de conhecer o Porto Santo desde o meu início. Muito antes de influencers que só agora o descobriram. Por isso, fiquei logo com o “vírus” de “Portosantite”.

A infância e adolescência dos convívios familiares com os meus pais, irmãos, sobrinha, avós, tios, primos.

Porto Santo era a ideal pré-temporada antes de começar o novo ano letivo e como dizia o meu pai: “recarregar baterias”.

Encontrar os amigos que estavam também em férias e beber uns copos ou jantar uma espetada na serra de dentro, no Teodorico.Sair à noite, subir aquela escadaria e jogar matraquilhos no Marítimo do Porto Santo decorado com posters de equipas antigas, depois ir ao “La Siesta” e acabar no “Porão”.

O presente. Ainda se consegue acordar sem confusão barulhenta, até as motas (ainda) são menos ruidosas.

Porto Santo é receber um “bom dia” genuíno de alguém que não conhecemos.

Ir à Biblioteca requisitar uns livros antigos. E, ler o Diário numa esplanada e observar as pessoas no seu dia-a-dia pacato com o seu engraçado dialeto cantado. Vivem mais felizes do que muitos em grandes cidades…

Também é gozar a pacatez do centro e sentar-se nos bancos e ouvir o sino da igreja no centro. O “Times Square” de Vila Baleira.

As eternas cores do amarelo com o azul. Do castanho árido, da terra, da poeira.

Na praia ver os grafismos de água que o mar desenha. Os zilhões de grãos de areia leve que caem entre os dedos e que depois ficam-nos sempre na toalha, sapatos e meias…

Banhos de fim de tarde com a luz rasa de cores quentes, e a água aprazivelmente amena.

E, fotografar os lugares pela enésima vez mas sempre com o mesmo prazer. Ver coisas que há anos e anos estão na mesma. Achamos piada, mas penso que os porto-santenses não acham. O que é legítimo.

As rolas que vão arrolando, os coelhos desconfiados que fogem sempre da objectiva fotográfica! Os gericos infelizmente já quase não existem… E, os caracóis todos pegados e solidários nos cardos. Que depois estilhaçamos sem maldade como o som de bolachas. Coitados, vivem no paraíso e não se apercebem disso.

O tempo corre devagar, muito devagar mesmo, mas isso é um problema? Qual é a pressa (“What’s the rush?”) Como dizia o anúncio de Whisky.

Passear no cais à noite com vento, comer uma lambeca de sabor a pastilha elástica (azul!), e ver os pescadores com as suas canas e baldes com engodo. Ouvir o mar, ver o farol e imaginar histórias dos faroleiros do passado.

Uma verdadeira terra portuguesa com certeza, que ainda mantém a sua portugalidade. Mas que sempre contou mais com a ajuda da ilha vizinha do que do Estado.

600 anos de dureza confirmam a resiliência dos porto-santenses.

Os desafios do futuro. O Porto Santo não pode perder a sua beleza, identidade e sossego.

Valha-nos as casas de salão, moinhos e muros de croché que são património a salvaguardar!

É imperioso que o Porto Santo não se “descaracterize”, encontre um equilíbrio (sempre difícil) entre desenvolvimento e natureza. Criar situações humanas para os locais poderem continuar a viver e ter uma carreira no Porto Santo.

É uma sorte ter esta ilha ao lado. Tão contrastante com a Madeira, será porventura a ilha mais única e diferenciada do que todas as outras ilhas portuguesas!?...

Quando se deixa o Porto Santo, o mar nos leva, mas traz-nos a tristeza. E ficamos já a pensar na próxima vez. Porto Santo é voltar, voltar e voltar sempre…

Rodrigo Costa