DNOTICIAS.PT
Crónicas

Imunidade Orçamental

1. É revoltante assistir ao desvirtuamento da imunidade parlamentar em Portugal. Esta prerrogativa, que deveria proteger a independência dos deputados e de alguns titulares de órgãos públicos, transformou-se num escudo de impunidade. Políticos suspeitos de corrupção, prevaricação, abuso de poder, participação em negócios ilícitos e até atentados contra o Estado de Direito utilizam este instrumento constitucional para escapar à justiça. E a situação torna-se ainda mais insuportável quando esses indivíduos integram também o Conselho de Estado, usufruindo de uma imunidade dupla que reforça a sensação de impunidade e desrespeito pela lei.

Imagine-se um político eleito para servir o bem público suspeito de aceitar vantagens indevidas. Esta prática, conhecida como corrupção passiva, é uma das mais vis e repulsivas que podem corroer os alicerces da democracia. Quando tal indivíduo se refugia na imunidade parlamentar para evitar ser investigado e eventualmente responsabilizado, trai a confiança dos eleitores e compromete a integridade das instituições.

Prevaricação e abuso de poder são crimes que mostram a arrogância de quem, investido de autoridade, acredita estar acima da lei. Estes indivíduos, ao utilizarem a imunidade para escapar às consequências das suas acções suspeitas, subvertem o propósito desta e desrespeitam os princípios fundamentais do Estado de Direito. Acreditam que a imunidade é uma licença para o comportamento ilegal.

A participação económica em negócios por parte de políticos desvirtua a função e promove o enriquecimento ilícito à custa dos contribuintes. Quando as imunidades são usadas para evitar a investigação e a responsabilização por tais actos suspeitos, transformam-se em protecções de interesses privados em detrimento do interesse público. Esta prática não é apenas ilegal, é também eticamente repugnante e corrosiva da confiança. É inaceitável que os políticos usem a imunidade como uma capa de defesa para os seus esquemas e actividades suspeitas.

As práticas que atentam contra o Estado de Direito são das mais graves ofensas que um político pode ser suspeito de cometer. Ameaçam a própria estrutura da democracia e os direitos fundamentais dos cidadãos. Utilizar a imunidade para evitar a responsabilização é uma traição ao juramento de defender os valores da democracia.

É crucial que os políticos compreendam que as imunidades não são direitos inalienáveis para acobertar ilicitudes, mas garantias para proteger o exercício livre e independente das suas funções. Quando utilizadas indevidamente, estas imunidades comprometem a confiança pública nas instituições e minam os fundamentos da democracia. A imunidade foi concebida para proteger a liberdade de expressão e de exercício de funções públicas, não para permitir que os políticos actuem impunemente.

A renúncia voluntária a estas imunidades em casos de suspeitas de corrupção, prevaricação, abuso de poder, participação em negócios ilícitos e atentados contra o Estado de Direito deveria ser a norma, não a excepção. Os políticos que realmente respeitam os princípios republicanos e a ética pública não deveriam temer enfrentar a justiça. Pelo contrário, deveriam ser os primeiros a abdicar da imunidade, mostrando transparência e compromisso com a verdade. Somente assim podemos restaurar a confiança pública e garantir que a democracia funcione.

Os políticos refugiados na imunidade para evitar a justiça revelam um profundo desrespeito pelo Estado de Direito e pelos cidadãos que representam. É urgente uma reforma que garanta que estas imunidades não sejam sinónimo de impunidade, mas sim salvaguardas da integridade e da independência das funções políticas. A ética republicana deve prevalecer sobre os interesses pessoais e a corrupção. A nossa democracia depende disso. A Autonomia disso depende. Não podemos permitir que aqueles que foram eleitos para proteger e servir utilizem as protecções do sistema para o subverter. A justiça e a integridade devem prevalecer, sempre.

2. Um governo em gestão, a governar em duodécimos, mesmo com as limitações impostas pela Constituição, tem a responsabilidade de manter a administração e os serviços públicos a funcionar. Não ter um orçamento aprovado não deve ser uma desculpa para não governar. É importante entender que são várias as competências que permitem operar de forma eficaz e responsável.

Quando falamos de um governo em gestão, referimo-nos a um governo que está em funções temporariamente, ou porque o novo governo ainda não teve o seu programa aprovado pelo Parlamento, ou porque foi demitido e está à espera de ser substituído. Durante este período, a Constituição diz que o governo deve gerir de maneira que apenas os actos necessários para manter a gestão dos negócios públicos devem ser assumidos. Mas isto não significa que o governo deve parar ou fazer apenas o mínimo. Gestão é gerir o interesse público.

Este governo vê os seus poderes reduzidos, focando-se na administração corrente e na continuidade dos serviços públicos essenciais, como educação, saúde, transportes e desenvolvimento regional, sem tomar decisões de grande impacto ou reformas estruturais.

Durante este período de capitis deminutio (poderes diminuídos), um governo de gestão na Madeira deve focar-se na administração corrente dos assuntos da região, assegurando a continuidade dos serviços públicos essenciais sob a sua responsabilidade. Isto inclui a manutenção de serviços, como educação, saúde, transportes e desenvolvimento regional, bem como a continuidade do pagamento de salários aos funcionários públicos regionais e dos apoios regionais, conforme a competência da região.

As questões administrativas do dia a dia devem ser resolvidas sem envolver mudanças significativas de políticas, e a gestão das despesas correntes deve respeitar o princípio da prudência financeira. Em termos de restrições e limitações, o governo de gestão deve evitar tomar decisões de grande envergadura ou que possam ter impactos significativos a longo prazo. As suas actividades são limitadas pela necessidade de manter a estabilidade sem comprometer futuros governos, evitando reformas estruturais que influenciem o cenário político ou económico duradouramente, e restringindo a nomeação ou demissão de altos funcionários públicos regionais, salvo em casos de extrema necessidade.

A limitação na assinatura de novos contratos públicos ou de grandes investimentos é uma característica importante, a menos que sejam absolutamente necessários para a continuidade dos serviços regionais. No que diz respeito à gestão financeira, o conceito de governar em duodécimos aplica-se para assegurar a continuidade financeira. O orçamento total do ano anterior é dividido em doze partes iguais, permitindo ao governo gastar até um duodécimo do orçamento anual em cada mês.

Um Governo de Gestão deve evitar tomar decisões que possam ter impactos significativos a longo prazo ou que vinculem futuros governos. Isto inclui a implementação de novas políticas ou reformas estruturais e a realização de grandes investimentos. No entanto, existem circunstâncias excepcionais em que um Governo de Gestão pode realizar investimentos.

Esses casos incluem, por exemplo, a continuidade dos serviços essenciais. Inclui-se, a reparação urgente de infraestruturas críticas, como hospitais ou escolas, que, se não realizada, poderia comprometer seriamente o funcionamento desses serviços.

Além disso, é permitido o cumprimento de contratos e obrigações financeiras já assumidas pelo governo anteriormente. Se há investimentos aprovados e contratualizados antes do governo entrar em gestão, esses compromissos têm de ser honrados.

São também permitidos investimentos de manutenção, que não envolvam expansão ou novos projetos, mas sim a manutenção e conservação de infraestruturas e serviços existentes.

Ou seja, as IPSS na área da saúde devem continuar a receber o que recebiam no ano transacto, “idem” com os clubes desportivos, os funcionários públicos não vêem as suas remunerações afectadas (embora aumentos salariais possam ser congelados), nem os beneficiários do Complemento Regional de Idosos, e estes casos por mero exemplo. As obras no terreno continuam a ser construídas e até é possível lançar novas, caso sejam de necessidade imediata. As verbas do PRR não são desafectadas de modo algum. A manutenção dos equipamentos públicos tem de ser assegurada.

Retenham que o Orçamento proposto para 2024 era de 2.238 mil milhões de euros e o de 2023 foi de 2.071 mil milhões. A diferença era de 167 milhões de euros. Quer isto dizer que o dinheiro está lá, saiba é o governo gerir bem o que tem e deixar-se de desculpas sem sentido para nada fazer e assim manipular a opinião pública criando medos desnecessários.