Será que Cristiano Ronaldo recusou usar uma braçadeira de apoio LGBTQ?
Nos últimos dias, tem circulado uma mensagem em diversas redes sociais que diz que “no Euro 2020, a UEFA ordenou que todos os capitães de equipa usassem” braçadeiras com a inscrição ‘One Love’, “usada como símbolo LGBTQ”, sigla que significa Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgénero e Queer. Os autores da publicação garantem que o capitão da selecção portuguesa, Cristiano Ronaldo, “foi o único capitão que não usou” a braçadeira e manifestam “respeito” pela decisão do futebolista, por não alinhar com uma ideia que é “contra as leis de Deus”. A mensagem é acompanhada de uma foto que mostra o capitão da selecção alemã, Manuel Neuer, a usar uma braçadeira com as cores do arco-íris, enquanto CR7 usa uma braçadeira normal. Será que esta situação aconteceu mesmo?
Esta publicação, escrita em Português do Brasil, ganhou uma difusão impressionante à escala global. Está a ser partilhada essencialmente por grupos que promovem a intolerância e o ódio em relação à comunidade LGBTQ. E gerou milhares de comentários, tanto a favor como contra. Assumiu tal dimensão que mereceu uma análise do site ‘Aos Fatos’, um projecto jornalístico brasileiro que investiga campanhas de desinformação. O projecto norte-americano PolitiFact também se interessou pelo assunto.
Conforme observaram aquelas duas organizações de verificação de factos, a publicação em causa mistura e distorce factos sobre diferentes campeonatos internacionais de futebol, para sugerir que Cristiano Ronaldo se recusou a colocar uma braçadeira do movimento ‘One Love’, associada à luta contra a discriminação no desporto.
A campanha ‘One Love’ foi lançada em 2020 pela selecção dos Países Baixos, cujo capitão utilizou uma braçadeira branca, com um coração pintado com as cores que representam a luta pelo reconhecimento das minorias e comunidade LGBTQI e respeito pela diversidade e liberdade sexual. Em diferentes momentos, outras oito selecções viriam a manifestar simpatia com a causa: Dinamarca, Alemanha, Inglaterra, França, Noruega, País de Gales, Suécia e Suíça.
Especificamente no Euro 2020, apenas três capitães usaram a braçadeira ‘One Love’: Manuel Neuer (Alemanha), Gini Wijnaldum (Países Baixos) e Harry Kane (Inglaterra). Fizeram-no de forma espontânea e voluntária, pois a UEFA não deu qualquer ordem nesse sentido. A foto utilizada na publicação, com Ronaldo a cumprimentar Manuel Neuer, foi captada nessa competição. Na prova participaram 24 selecções e, como já se explicou, o capitão português não foi o único que optou por não usar a dita braçadeira.
A polémica só surgiu em Setembro de 2022, pouco antes do Campeonato do Mundo do Qatar, quando a FIFA, numa alegada cedência ao país árabe que criminaliza a homossexualidade, proibiu a utilização da braçadeira ‘One Love’, ameaçando punir com uma multa e um cartão amarelo quem desrespeitasse tal regra. A proibição acabou por ser acatada por todas as selecções, embora sob protesto. Os jogadores da equipa alemã, por exemplo, taparam a boca no momento da foto oficial antes do seu primeiro jogo, num gesto interpretado como uma denúncia das limitações à liberdade de expressão.
Esta sequência de factos mostra que o conteúdo da mencionada publicação não é verdadeiro. Além do mais, que se saiba, não há registo de posicionamento específico de Cristiano Ronaldo sobre as questões relacionadas com a comunidade LGBTQI. No geral, contudo, o futebolista madeirense tem adoptado uma postura contra a discriminação, designadamente contra o racismo.