Os dilemas dos partidos políticos

Nas eleições de 26 de Maio, os eleitores manifestaram a sua vontade: querem o PSD a governar, mas com uma rédea muito curta, nas mãos do parlamento regional.

A vontade dos eleitores até é muito saudável, do ponto de vista democrático. Só que essa vontade choca com outra realidade: a coabitação de um governo do PSD, com a atual configuração de forças no parlamento regional, é muito difícil, ou, no limite, mesmo impossível - salvo se, entretanto, acontecer algo inesperado.

A ser verdade o que dizem os partidos, o programa do governo será chumbado, teremos um governo de gestão e vamos ter de esperar por eleições antecipadas - com todas as consequências negativas, na vida das famílias e das empresas. Será ainda possível evitar o cenário da falta de um orçamento? Difícil, mas não impossível.

Pelo menos em teoria, ainda não se encontram esgotadas todas as vias de solução. Quer o PSD, quer a oposição, podem, se quiserem, viabilizar o governo. 0 PSD tem ainda na mão uma solução de último recurso: sacrificar Miguel Albuquerque (MA) e avançar com outro nome para presidente do governo. A oposição tem ainda a opção de fazer tábua rasa das suas linhas vermelhas e votar ao lado do PSD.

O problema destas soluções é que 0 custo político é demasiado alto para 0 proponente. Quer o sacrifício de MA, quer o recuo dos líderes da oposição, pode provocar instabilidade interna nos respetivos partidos. Algum deputado mais descontente pode chegar ao ponto de quer passar a “independente” - para poder votar em liberdade. Nem o PSD, nem a oposição, estarão disponíveis para arriscar tanto.

A existir uma solução para a crise, esta passará por alguma negociação discreta de bastidores - que criará a ilusão de que todos são vencedores.

O PSD está numa situação delicada. Mesmo que o programa seja aprovado, o futuro próximo de MA advinha-se um inferno. Negociar, medida a medida, com um parlamento hostil, é o pior cenário de governação possível - sobretudo para quem estava habituado a ignorar a oposição.

MA pode ficar alérgico a qualquer coleira que os partidos da oposição lhe queiram pôr no pescoço. Por mais maquiavélico que possa parecer, pode até já preferir o cenário mais radical: eleições antecipadas. Assim, teria a possibilidade de culpar a oposição pela falta de orçamento e, com o desgaste desta, esperar por uma maioria absoluta nas próximas eleições.

Do lado da oposição, a situação também não está fácil. Inviabilizar o governo pode significar pagar um preço muito alto. Por outro lado, esquecer as linhas vermelhas - para viabilizar o governo do PSD - também parece ser um tiro no pé. Venha o diabo e escolha.

Com o passar dos dias - e o que esta a acontecer no parlamento da República - a balança parece estar a inclinar-se, ligeiramente, para o lado de, para já, deixar passar o governo. PS e/ou JPP - ponderados todos os prós e contras - podem, contra todas as probabilidades, montar uma operação de resgate a MA, como forma de, também, salvar a própria pele. É arriscado, mas poderá a ser a única forma de não arcar com o ónus de não haver orçamento.

Não esquecer que, para alem dos partidos políticos, há outros atores em jogo. Perante o eventual chumbo do programa do governo, o Representante da República terá ainda uma palavra a dizer. Fora da esfera política, o Ministério Público também poderá - com um pequeno parágrafo num comunicado - baralhar todos estes cenários.

Manuel Pereira