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Por quem os sinos dobram

Não podemos resvalar para um cenário de ingovernabilidade e há que priorizar o que é fulcral para o normal funcionamento da vida dos cidadãos, empresas e entidades públicas, privadas e do setor social

Como no livro de Ernest Hemingway, hoje começa uma história de lealdade(s), coragem e derrota, face ao combate que se avizinha na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, com a discussão do Programa de Governo Regional e moção de confiança sob um manto de incertezas e com um desfecho cheio de incógnitas.

O debate do Programa de Governo Regional deve ser uma bússola que nos guie em direção a uma Região mais humanista, mais responsável e com o foco numa efetiva mudança, que seja refletida na vida de todos os madeirenses e porto-santenses. Ou seja, um mapa que nos dê as melhores e mais eficazes coordenadas de proteção do nosso futuro comum.

Negociação, diálogo, compromisso, verdade são palavras que não podem ser afastadas da discussão do nosso futuro. Com alianças sérias em prol do bem-estar dos nossos concidadãos e não acordos oportunistas e virados para o umbigo de cada partido, ou pior, para o ego do seu líder. A palavra dada, o não, o sim, têm de ter valor. Não podemos viver num estado constante de desconfiança, de mentiras, de meias-verdades e semânticas ardilosas.

Também não é tempo de vitimização, muito menos de arrogância, provocações, egoísmos, ambições individuais ou pressões. Estes estados de alma são de evitar, pois podem ser o rastilho para a explosão de uma bomba política com consequências terríveis no futuro da Madeira.

É tempo de sentar à mesa das negociações e tentar soluções exequíveis de governabilidade estável. Não podemos resvalar para um cenário de ingovernabilidade e há que priorizar o que é fulcral para o normal funcionamento da vida dos cidadãos, empresas e entidades públicas, privadas e do setor social.

Agora, já não interessa se o Orçamento podia ter sido apresentado em finais de 2023 ou em inícios de 2024 ou mesmo antes da dissolução do parlamento regional. Não podemos viver no passado, é urgente decidir, com clareza e cientes das consequências, o que é melhor no momento presente. Não para o partido A, B, ou Z, mas sim para quem verdadeiramente devia interessar: o povo, ou seja, todos nós.

Há um cansaço crescente perante a dramatização da vida política e de narrativas hiperbólicas de conquistas e sucessos regionais que, mesmo podendo ser verdadeiros, não têm tradução no bolso do povo. O jogo do “empurra-culpas” também só nos faz perder tempo e adensar os problemas. É necessário mudar os trajes velhos que já não servem nos tempos atuais.

Não se pode, igualmente, menosprezar a confiança e segurança que os madeirenses e porto-santenses precisam ter no Governo e, num sentido mais amplo, na classe política no seu todo. Caso contrário, o resultado será tão-somente o descrédito da palavra dos políticos e o alheamento crescente dos eleitores quando chamados a decidirem o futuro da Região.

É premente enveredar por verdadeiros e sérios exercícios de convergência, para que seja possível dar uma resposta efetiva e sustentável às necessidades e problemas das pessoas, que anseiam por decisões com sobriedade e responsabilidade por parte de todos os atores políticos.

Neste atual cenário de contínua instabilidade, torna-se ainda mais importante dar voz à sociedade civil, estimular o debate público e envolver os cidadãos para lá dos partidos políticos. As pessoas estão fartas de discursos e querem ver resultados no seu dia a dia. Querem ser parte da solução e garantir que as políticas estruturais e estruturantes se traduzem num verdadeiro compromisso no tempo, imune às mudanças de governo.

No instável xadrez parlamentar, com imbróglios nas interpretações jurídicas e teias aritméticas emaranhadas, consultem o alinhamento dos astros, peçam orientação ao homem só do epifenómeno político, tornem-se independentes, resolvam os assuntos pendentes, em suma, sejam a solução, não o problema.

Saberemos também se há quem cante o refrão da “Marcha dos Desalinhados” do grupo português Delfins: “Ninguém sabe para onde vou/Ninguém manda em quem eu sou/Sem cor nem deus nem fado/eu estou desalinhado”.

Desalinhados ou alinhados, ninguém está isento de responsabilidade. O atual panorama político é resultado das ações de todos os partidos, dos seus líderes, mas também de todos nós, que tivemos e temos o poder de decidir a vida política com o nosso voto. O que cada um fez e faz com esse poder também o responsabiliza.

Hoje, e até dia 20 deste mês, é tempo de clarificação, de cada um dos deputados fazer o seu melhor, imbuído do espírito que deve presidir à vida política: contribuir para um sentido de futuro com esperança para todos.

P.S: Que, hoje, a seleção portuguesa ganhe à Chéquia, para começar com o pé direito o Campeonato Europeu de Futebol. Força, Portugal! Boa sorte, Cristiano Ronaldo!