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Fact Check Madeira

O cansaço pela realização de eleições leva a uma menor participação eleitoral?

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“Confesso que, depois de ter vivido um ano em sistemáticas campanhas seguidas dos respectivos actos eleitorais, estou cansado de eleições. Eu e creio que muitos dos madeirenses e do resto do povo português.” A fase do Bispo do Funchal foi um dos destaques de uma notícia, desta tarde, publicada na edição on-line do DIÁRIO. De imediato, suscitou muitas reações. Além das pessoas que se lhe opuseram, houve quem tenha vindo confirmar, dando o próprio exemplo e afirmando que já não vai votar.

Mas será mesmo que uma sucessão de actos eleitorais leva a uma menor participação e, naturalmente, a um aumento da abstenção?

Verificar se o que é afirmado é ou não verdadeiro não se afigura tarefa fácil. Comecemos, então, pelo que disseram, recentemente, em Portugal, alguns estudiosos sobre o tema.

Em vésperas de eleições legislativas de Março deste ano, citados pelo jornal ECO, dois professores universitários, um da NOVA e outro do ISCTE, admitiam: “Não é de excluir a hipótese que os eleitores portugueses, com três eleições legislativas em cinco anos, possam ser afetados por uma certa fadiga eleitoral” - João Cancela; “Sabemos que há por vezes um efeito de cansaço e saturação eleitoral quando as pessoas são chamadas muitas vezes às urnas em curtos intervalos de tempo” – José Santana Pereira.

Depois dessas eleições, na Madeira, houve eleições regionais a 26 de Maio e, em todo o País, há uma semana, 9 de Junho, para o Parlamento Europeu. As regionais da Madeira foram as segundas em menos de um ano, após às de Setembro de 2023.

O que se verificou no País, nas eleições para o Parlamento Europeu, foi uma abstenção a recuar a níveis de 2009. Mas centremo-nos no que aconteceu na Madeira.

Nas eleições regionais de Maio deste ano, houve uma participação de 53,4% dos eleitores inscritos. Em Setembro do ano passado a participação foi uma décima abaixo, ficando por 53,3%.

Nas europeias de último domingo (depois das regionais de Setembro de 2023, das legislativas nacionais de Março de 2024 e das Regionais de Maio de 2024), registou-se uma participação de 41,6%. Um crescimento relativamente a 2019, quando a participação atingiu 38,5%.

Estes dados, sugerem que a proximidade eleitoral e a fadiga que possa provocar não são, só por si, determinantes para fazer com que os eleitores vão ou não às urnas.

Depois deste exercício prático, quisemos perceber o que dizem os teóricos destes fenómenos. Uma tese apresentada em 2017, na Universidade Católica Portuguesa, de Lurdes Viana Carvalho sugere: “Convém referir ainda que o número de eleições também poderá ter o seu impacto na taxa de abstenção, pois quantas mais houver, maior será a probabilidade de o eleitor se abster, ou melhor dizendo, quanto maior for a proximidade entre as eleições, maior será a probabilidade de altas taxas de abstenção, pois pode provocar fadiga no eleitor e desincentivar a votar.”

No entanto, não há certeza de que assim seja.

Um estudo publicado on-line pela Cambridge University Press a 30 de Agosto de 2016, What Affects Voter Turnout? A Review Article/Meta-Analysis of Aggregate Research, sobre o que afecta a participação eleitoral, conclui diferente.

O estudo analisou publicações editadas durante 40 anos e não encontrou certezas a este respeito. Certo sobre grandes influenciadores de processos eleitorais foi: a participação eleitoral aumenta sob votação obrigatória (em Portugal isso não acontece); quando as eleições são decisivas e quando são realizadas num país (Região) com uma população pequena.

Sobre a proximidade de actos eleitorais é dito: “O número de eleições apresentou a relação esperada: ou seja, muitas eleições diferentes num curto período de tempo levam à fadiga dos eleitores e a uma menor participação, em pouco menos de metade dos modelos (14 em 33). No entanto, mais de metade dos estudos (19 de 33) indicaram que esta relação é inexistente. Isto realça que a ligação entre a realização de eleições frequentes e a menor participação pode ser menos forte do que a teoria (inicial) esperava (Boyd , RW, 1981, ' Declínio da participação eleitoral nos EUA: explicações estruturais ',American Politics Research , 9 ( 1 ): 133-159).”

Assim, pelas duas análises combinadas – realidade das eleições realizadas no período de um ano na Madeira e as estudadas no artigo referido – se conclui ser muito sensato admitir a existência de uma relação entre número de eleições e participação, mas não há evidência científica consolidada de que isso exista.

Por todas estas razões, avaliamos como imprecisas as afirmações que apontam no sentido de que ‘tantas eleições seguidas fazem com que as pessoas já não votem’.

Tantas eleições seguidas fazem com que as pessoas já não votem – Leitores do DIÁRIO no Facebook