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Fact Check Madeira

A Madeira estará a perder famílias dada a diminuição da população?

Foto Shutterstock
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Entre 2001 e 2011 a população residente na Madeira aumentou de mais de 245 mil para mais de 267 mil, representando nesse período um crescimento de 9,3%, mas na década seguinte, de acordo com os Censos 2021, a população diminuiu para mais de 250 mil, representando uma quebra de 6,4%. Muita dessa quebra entre 2001 e 2011 deve-se a um saldo natural extremamente negativo e a um aumento da emigração. Contudo, entre 2011 e 2021, mesmo com o saldo natural a continuar negativo, a emigração diminuiu, mas sobretudo a imigração (entrada de estrangeiros) disparou, mesmo assim não contribuindo para aumentar a população residente.

Ora, havendo uma quebra populacional, seria de esperar que os núcleos familiares também diminuíssem. Mas se na década 2001-2011 esta realidade foi evidente, com um crescimento de 73.717 agregados familiares para 92.936, na década seguinte (2011-2021), voltaram a aumentar os agregados familiares da Região Autónoma para 94.950, ou seja mais dois mil agregados em uma década. Significa que nas duas décadas, há um crescimento de 28,8% (mais 21 mil) dos agregados familiares, embora a diferença da população residente entre 2001 e 2021 seja de mais 5.733 pessoas.

Estes números contrastam com a tendência, mas têm tido várias justificações e dados que comprovam porque é que tal acontece.

Nos Censos 2021 lia-se: "Os agregados domésticos privados eram mais comumente compostos por agregados com 1 ou 2 pessoas, representando cerca 23,6% e 29,0% dos agregados domésticos, respetivamente. Quase um quarto dos agregados era composto por 3 pessoas (23,1%) e 16,3% por 4 pessoas. O peso relativo dos agregados numerosos era mais baixo, sendo que apenas 8,0% dos agregados eram compostos por 5 ou mais pessoas. Destaca-se que o número de agregados com 3 ou mais pessoas diminuiu face a 2011. No total dos agregados domésticos privados, 10,9% (10.358 pessoas) diziam respeito a agregados unipessoais de pessoas com 65 ou mais anos."

No Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (ICOR) de 2023, ainda que fora do âmbito temporal aqui analisado, podemos ver que algo deverá mudar no final desta década, muito por culpa do actual contexto económico que quanto mais perdurar no tempo, mais resultados díspares vai revelar. O ICOR indica que "o valor da taxa de sobrelotação da habitação da Região Autónoma da Madeira (RAM) situou-se, em 2023, em 20,3%, aumentando 7,3 pontos percentuais (p.p.) face ao ano anterior (2022)", disse a DREM numa das suas divulgações.

No fundo, os períodos de crise económica acabam por influenciar o aumento dos agregados familiares, levando as famílias a 'fundirem-se' quase que artificialmente dadas as dificuldades - casas mais caras, são neste momento o principal factor, uma vez que em termos de emprego estamos num bom momento. "A carga mediana das despesas em habitação corresponde ao rácio entre as despesas anuais associadas à habitação e o rendimento disponível do agregado, deduzindo as transferências sociais relativas à habitação em ambos os elementos da divisão. Nestas despesas incluem-se as relacionadas com água, eletricidade, gás ou outros combustíveis, condomínio, seguros, saneamento, pequenas reparações, bem como as rendas e os juros relativos ao crédito à habitação principal", explicou a DREM. "Em 2023, a carga mediana das despesas em habitação na RAM foi de 9,7%" e, por sua vez, "a taxa de sobrecarga das despesas em habitação, isto é, a percentagem de pessoas que vivem em agregados familiares em que o rácio destas despesas em relação ao rendimento disponível (deduzidas as transferências sociais relativas à habitação) é superior a 40%, fixou-se, em 2023, em 3,8%. Esta taxa foi inferior em 0,3 p.p. à registada em 2022 (4,1%)".

Recuando a 2021, a taxa de sobrelotação da habitação era bem menor (10,4%), aliás duplicou dois anos depois, mas era mais baixa nos três anos anteriores; a carga mediana das despesas em habitação eram maior (10,5%) face a 2023, mas também era menor aos três anos anteriores; e a taxa de sobrecarga das despesas em habitação também era maior (4,7%), diminuindo em 2023, mas tinha sido bem mais acima em 2019 (6,5%), por exemplo.

Outro indicador revelado recentemente, após o período analisado, é o Inquérito às Condições de vida, Origens e Trajetórias da População Residente em Portugal (ICOT) 2023, realizado no primeiro semestre de 2023, junto de uma amostra representativa dos agregados familiares, cuja amostra na Região Autónoma da Madeira (RAM) "foi constituída por 1.530 alojamentos, inquirindo-se apenas um indivíduo entre os 18 e os 74 anos de idade que residia há pelo menos um ano em Portugal ou cuja intenção de residência era de pelo menos um ano". Conclui-se que: "Tendo por base as estimativas anuais da população residente a 31 de dezembro de 2022 (base Censos 2021), estima-se que na RAM residiam 190,1 mil pessoas entre os 18 e os 74 anos, a maioria (88,0%) com nacionalidade portuguesa. Na RAM, 85,8% das pessoas entre os 18 e os 74 anos não têm background imigratório (163,1 mil pessoas), estimando-se que entre as que têm background imigratório (14,2%; 27,0 mil), 22,7 mil pessoas são imigrantes de primeira geração, correspondendo a 12,0% do total."

Este facto é concretizado com estes dois indicadores

  • "Em 2022, a população residente na Região Autónoma da Madeira (RAM) foi estimada em 253.259 pessoas (119.062 homens e 134.197 mulheres), representando um acréscimo da população residente de 566 pessoas face a 2021. 
  • A taxa de crescimento efetivo foi positiva, 2,2% (3,1% em 2021), resultado de uma taxa de crescimento migratório positiva (7,6%) que se sobrepôs à taxa de crescimento natural negativa (-5,3%).

Ou seja, o contributo da população estrangeira para o aumento da população residente e, por consequência, dos agregados familiares, é evidente nos últimos anos e deverá continuar a contribuir para um fenómeno expectável. A população madeirense aumenta com o contributo de novos residentes 'importados', em detrimento do aumento da natalidade e, em consequência, do saldo natural.

E mesmo que os resultados do IDF 2022/2023, apontem a que "a despesa total anual média por agregado familiar dos residentes na RAM foi de 24.363 euros, representando um aumento de 33,8% em comparação à despesa total anual média de 18.204 euros apurada em 2015/2016", a verdade é que têm aumentado os agregados familiares a viver na RAM, com excepção dos concelhos de Santana e São Vicente, que confirmam a desertificação também neste indicador, quiçá ainda não chegou a esses territórios a 'importação' dos novos residentes que ajude a aumentar a população residente.

O quadro seguinte resume esta realidade municipal e a sua evolução entre 2001, 2011 e 2021.

Mais ao pormenor, note-se a dimensão do problema nalgumas freguesias, quiçá já com população a mais, ao contrário de outros onde falta gente. Dois exemplos: São Martinho e Santo António têm 9 a três vezes mais agregados familiares do que concelhos como Porto Moniz (que ainda assim cresceu entre 2011 e 2021), São Vicente, Porto Santo (que também cresceu) e Santana. Números que um crescimento desequilibrado da população residente e, sobretudo, uma distribuição centrada cada vez mais a sul.

A acrescer a todo este cenário, há o indicador das famílias de uma só pessoa, que crescem significativamente. "Nos municípios do Porto Moniz (34,4%), São Vicente (29,6%) e Santana (28,6%) a proporção de agregados unipessoais era mais elevada", muitas delas compostas por idosos, é certo. "No município de Câmara de Lobos a proporção de agregados com 5 ou mais pessoas era superior (13,2%), seguindo-se os municípios da Ponta do Sol (9,2%) e Ribeira Brava (9,0%)", concelhos que contrastam com essa realidade tendencialmente desértica.

Os números que a DREM tem publicado mostram que, de facto, viver sozinho ou apenas o casal, sem filhos, é uma tendência crescente. "Dos agregados domésticos privados apurados em 2021, 78,1% (74 077) correspondiam a núcleos familiares. Desses núcleos, 28,2% diziam respeito a casais sem filhos (25,3% em 2011), 48,0% a casais com filhos (55,0% em 2011), 20,7% a mães com filhos (17,4% em 2011) e 3,1% a pais com filhos (2,3% em 2011), destacando-se, assim, um aumento da expressão de núcleos familiares sem filhos e de núcleos familiares monoparentais".

Os números revelam que, apesar de a população madeirense estar a diminuir, a verdade é que tem aumentado o número de núcleos familiares. Contudo, cresce o número de agregados domésticos constituídos por apenas uma pessoa, além do aumento de famílias com background imigratório. Os únicos concelhos que, entre 2001 e 2021, perderam núcleos familiares foram Santana e São Vicente. Por isso, respondendo à pergunta do título...