Vox populi audita est
A conclusão que muitos madeirenses tiveram destas eleições é que a Madeira é, afinal, um regime parlamentar e não presidencialista, como julgaram até agora
A voz do Povo foi ouvida! Os votos foram contados, os deputados eleitos, o governo nomeado e agora os madeirenses têm uma pergunta legítima: o que mudará com estas eleições?
Vejamos por partes. O PSD venceu estas eleições, mas “vencer” pode ter diferentes significados.
Quando em 2011 fui eleito deputado na Madeira, o Jardinismo vinha de uma anterior vitória esmagadora, perto de 100.000 votos, elegendo 33 deputados. A Troika, o PAEF, as crises regionais e globais fizeram descer para 25 e, depois em 2015, para 24 deputados. Foi a última maioria absoluta social-democrata.
Em 2019, os madeirenses ao darem 21 deputados ao PSD, obrigaram-no a dançar o Tango a dois com o CDS, e depois em 2023, a três com o PAN. Agora com 49.000 votos e 19 deputados, os parceiros de dança obrigatoriamente terão que incluir outros, e o tipo de dança será mais um Flamenco, menos intimista, com mais parceiros.
A conclusão que muitos madeirenses tiveram destas eleições é que a Madeira é, afinal, um regime parlamentar e não presidencialista, como julgaram até agora. Miguel Albuquerque governa certamente, mas existe hoje, tal como na Assembleia da República, uma maioria de bloqueio, aqui formada pelo PS, JPP e CHEGA, que tudo pode decidir na Assembleia. Dir-se-á que o poder hegemónico acabou, o período da negociação e dos compromissos começou. Acabou o tempo da “Casa dos Loucos”, como Alberto João Jardim designava a nossa Assembleia, para termos agora a Casa da Democracia.
O esboço de alternativa apresentado por Paulo Cafôfo foi mais uma “figura de estilo” do que uma proposta com futuro. Foi morta no mesmo dia pela Iniciativa Liberal que a inviabilizou ao designá-la de “Geringalho”, não permitindo sequer o “infante” de dar os primeiros passos. Inclusive, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, o socialista Santos Silva, considera “absolutamente impossível” o entendimento sugerido por Cafofo na Madeira. Afirma que “as condições para a agregação de diferentes forças políticas que permitisse tal maioria são difíceis e estranhas”. Simplesmente falhou porque o PS precisava de ter 14, e não 11 deputados, como teve agora.
Pessoalmente, creio que este esboço terá só servido para o povo madeirense interiorizar que já existem propostas de governo com o apoio de mais deputados, e mais votos, que aquela apresentada pelo PSD.
Houve os ganhadores, Élvio Sousa e José Manuel Rodrigues; os derrotados, Paulo Cafofo e Edgar Silva (muito pelo anacronismo cego que tem no apoio tácito a Vladimir Putin); os resistentes, Mónica Freitas e, indiscutivelmente, Miguel Albuquerque, que foi em certa medida referendado; os adiados, Nuno Morna e Miguel Castro, aguardam serenamente melhores dias.
Se não houver humildade de quem governa, e sentido de responsabilidade de quem faz oposição, esta legislatura será curta e os madeirenses serão chamados a votar mais cedo que tarde. E será interessante ser deputado nestes novos tempos. Quando fui deputado as lides eram outras, o insulto e a descaracterização dos opositores, a falta de transparência, o condicionamento da oposição e eram frequentes os escândalos. A Assembleia é agora um local de respeito e troca mais serena de argumentos. Falta ser um local onde são gerados os consensos.
A Madeira poderá finalmente ter condições para abordar e resolver os seus grandes desafios, aqueles eternamente adiados. Seja a fiscalidade excessiva, o tão desejado Ferry, a mobilidade aérea mais simples, a distópica Lei eleitoral que exclui quem não está na Madeira no dia das eleições, as deficiências e discricionariedades nos apoios sociais, às condições de trabalho que deprimem muitos madeirenses, entre outros. Assim seja!