DNOTICIAS.PT
Fact Check Madeira

Será que uma lei negociada por Jardim impede o PSD de ter maioria absoluta?

None

O antigo dirigente social-democrata Miguel de Sousa afirmou, domingo à noite, na RTP-Madeira, que o PSD só não conseguiu agora uma maioria absoluta de deputados no parlamento regional devido à lei eleitoral negociada em 2005 por Alberto João Jardim e o PS nacional (então liderado por José Sócrates). “O dr. Alberto João Jardim ganhou eleições durante 40 anos com outro sistema eleitoral, que era concelhio. Eu era eleito por Santa Cruz, que era o meu círculo eleitoral. Essa lei eleitoral permitia que agora, com estes votos, o PSD tivesse maioria absoluta”, afirmou o ex-presidente do Governo e da Assembleia Legislativa da Madeira. Será mesmo assim?

O diploma que actualmente regula as eleições para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira é a Lei Orgânica n.º 1/2006, que foi aprovada por unanimidade na Assembleia da República a 15 de Dezembro de 2005 e promulgada e referendada pelo Presidente da República Jorge Sampaio e pelo primeiro-ministro José Sócrates a 27 de Janeiro de 2006. Este diploma veio introduzir duas alterações de fundo: o número de deputados a eleger para o parlamento regional passou de 68 para 47 deputados; e passou-se de um sistema com 11 círculos concelhios e com 11 listas separadas (cada localidade municipal elegia os seus deputados) para um único círculo regional e uma só lista de candidatos.

O DIÁRIO submeteu os resultados do passado domingo ao sistema de regras da anterior lei eleitoral e constatou que o resultado seria um reforço do número de deputados dos dois maiores partidos e a perda de mandatos das restantes forças. O PSD sairia particularmente beneficiado, pois alcançaria a maioria absoluta. O PSD elegeria 26 deputados (mais 7 do que com a actual lei), o PS 12 (mais um), o JPP 6 (menos 3) e o Chega 3 (menos um). O CDS, que tem agora dois deputados, não elegeria nenhum e Nuno Morna (Iniciativa Liberal) e Mónica Freitas (PAN) também não seriam eleitos.

A nova lei eleitoral penaliza efectivamente os maiores partidos e dificulta a formação de maiorias absolutas no parlamento regional. A sua aprovação há 19 anos foi muito contestada por várias figuras do PSD-Madeira. A negociação foi feita em segredo na Assembleia da República, nas costas dos sociais-democratas madeirenses. Guilherme Silva, mandatado por Jardim, e o líder parlamentar social-democrata Marques Guedes acertaram tudo com os socialistas Jacinto Serrão e Alberto Martins.

Ainda hoje há quem não compreenda os motivos por que Jardim alinhou na alteração de uma lei que prejudicou o PSD-Madeira, indo mesmo contra a vontade dos seus companheiros na Região. A esse propósito, atente-se ao comentário de Miguel de Sousa na noite de domingo: “O Jorge Sampaio convenceu o dr. Alberto João Jardim, não sei bem porquê, nunca percebi que negociação foi feita, e através da mudança da lei eleitoral o PSD deixou de ser um partido hegemónico e passou a ser um partido em dificuldade para ganhar em maioria absoluta”.

Também anteontem, Jardim procurou justificar a opção que tomou em 2005: “Eu assumo a responsabilidade disso [da alteração da lei eleitoral], porque entendo que a obrigatoriedade de haver pelo menos dois deputados pelo Porto Santo e pelo Porto Moniz significava que o voto do eleitor do Porto Santo e do Porto Moniz em percentagem do total de eleitores valia mais do que um do Funchal. Eu sei que prejudicou o PSD. E sei que beneficiou os partidos mais pequenos. Mas toda a minha vida pública foi pela Madeira e não pelo PSD”.

Já ontem, também na RTP, Jardim voltou ao assunto, desta vez para “corrigir uma coisa que foi dita” por Miguel de Sousa e que, no entender do ex-líder do PSD, era “grave”, por tinha a ver com um suposto acordo que fizera com o Presidente da República para mudar a lei eleitoral em 2005. “Nada disso” aconteceu, assegurou o antigo governante, que explicou que o acordo foi feito com o então líder do PS (Jacinto Serrão), já que ambos entendiam que “o sistema anterior era injusto”. “De facto, era mais fácil para o PSD e para o CDS manter o sistema anterior que levava quase praticamente a apagar os restantes partidos do mapa. Por uma questão cívica, ambos chegámos a um acordo para fazer força em Lisboa. O que se conseguiu e é justo”, rematou.

Conclui-se, pois, que Miguel de Sousa tem razão quando diz que os resultados do escrutínio de domingo permitiriam ao PSD ter maioria absoluta no parlamento regional caso a anterior lei eleitoral estivesse em vigor.

“A anterior lei eleitoral permitia que agora, com estes votos, o PSD tivesse maioria absoluta” – Miguel de Sousa, antigo dirigente social-democrata, em comentário na RTP.