António Trindade defende entendimentos entre os dois maiores partidos
"Há um momento onde, efectivamente, o grande centro se deveria concentrar", e que seria "fundamental para poder garantir estabilidade" governativa, tanto no país como na Madeira
O empresário António Trindade, cuja experiência e análise da actualidade política, pode chegar mais longe, entende que, tanto no país, como na Madeira, terá chegado a hora de os dois principais partidos que estão mais ao centro no espectro político e são, por sinal, os mais votados e representados nos parlamentos nacional e regionais, se deveriam entender para evitar que a estabilidade política e governativa seja posta em causa. Para Trindade, a ideia de Bloco Central nunca foi tão premente.
Reagindo ontem à noite aos resultados das legislativas regionais na Madeira, começou por analisar o facto de a abstenção não ter baixado, ou seja que "metade da população madeirense não votou", constata. "Sobre os resultados, já era relativamente espectável esta situação de descida do PSD, manutenção do PS e subida do JPP. Porque, na realidade, estes resultados reflectem muito o que foram, efetivamente, partidos que se afirmaram pela contestação, como é o caso do Chega que, julgo, atingiu o seu limite. E, sobretudo, os partidos que tenham exercício do poder, e vemos geograficamente o JPP com uma Câmara de Santa Cruz forte, o PS em Machico com a capacidade de exercício do poder, isto reflete-se em relação ao madeirense, algo que é um estigma que vem de há muitos anos", analisa.
Recuando no tempo, recorda que "Alberto João Jardim soube, efectivamente, garantir sempre esta relação da confiança no poder. E isto tem-se projetado sempre ao longo do tempo. E é por isso, digamos, que apesar do decréscimo do PSD, Miguel Albuquerque vai-se servindo deste argumento do exercício do poder para se manter no poder", acrescenta.
Mas deixa claro: "Evidentemente que isto vai ser muito complicado, porque estamos a falar de o PSD ter que ir recorrer a um partido anti-sistema para governar. E aqui já não será, propriamente, uma dependência de uma deputada de um PAN, mas sim de um partido que é, efetivamente, contra-sistema. E aí, para mim, é a grande dúvida de uma garantia de continuidade do exercício do poder."
Questionado se saíamos destas eleições pior, em termos de possibilidade de estabilidade política, do que ocorrera oito meses antes, António Trindade concorda que o 'xadrez político' fica pior "porque está dependente de um partido anti-sistema. Eu julgo que antes de definirmos se é mais direita ou menos direita, temos que ver qual é a mensagem, que são mais mensagens de protesto e a mensagem natural anti-sistema que o Chega sempre trouxe. Isto, apesar de tudo e de certo modo, a existência dos dois deputados do CDS, poderão eventualmente minorar, criar aqui uma relação tripartida no exercício do poder, embora descompensada", acredita.
Mas, "para mim o que é mal para a Madeira é, efectivamente, esta dependência de alguém, de uma estrutura que não joga as mesmas regras de jogo democráticos que os outros partidos de uma democracia portuguesa, de uma democracia madeirense, praticam". Daí que o que se segue exige, ou deveria exigir, da parte dos partidos do sistema democrático outa postura, entende, sobretudo porque Miguel Albuquerque, desta vez, não teve uma solução para apresentar na noite eleitoral.
"Não tem solução salvo seja", adverte, pois "a governação tem solução com um partido anti-sistema. Agora, Miguel Albuquerque vai ser confrontado amanhã (hoje), evidentemente, com uma informação do Chega que, efectivamente, não votará, não aceitará coligar-se com o Miguel Albuquerque. E aqui, evidentemente, Miguel Albuquerque terá uma posição particularmente difícil porque com os votos do PSD e os votos do CDS, terá um tempo de vida sempre muito complicado na Assembleia regional, porque com 21 deputados não se faz efectivamente uma maioria no Parlamento".
Quase em espelho, a Madeira ficou igual ao que aconteceu a nível nacional, pós-eleições Legislativas nacionais de 10 de Março último e é aqui que António Trindade deixa a ideia para reflexão. "Há muito tempo a esta parte tenho defendido que para grandes momentos, grandes decisões deveriam ser tomadas. Julgo que o ter-se pensado e ter-se discutido, a exemplo do que aconteceu na Alemanha, do que está a acontecer agora na Holanda, que há um momento onde efectivamente o grande centro se deveria concentrar. E a existência de um Bloco Central, quer em termos nacionais, quer em termos regionais, seria o grande momento da afirmação, mesmo que se os dois grandes partidos do centro tivessem que admitir que havia franjas que iriam efectivamente perder", calcula.
E consubstancia com um sinal para as partes e um alerta. "Mas nós estamos a perder, em termos nacionais e em termos regionais, esse momento fundamental para poder garantir estabilidade. E convenhamos, ao que me parece, é que quer em termos nacionais, mesmo em termos regionais, o que possa efetivamente aproximar um PSD de um PS é manifestamente maior do que possa aproximar um PSD de um Chega, por exemplo. E é esta contradição que se teme em levar por diante, que evidentemente pode fazer perigar a continuidade do exercício da governação regional", adverte.