Analistas admitem maioria à direita inédita no Parlamento Europeu
professor de Direito Europeu Alberto Alemanno considerou hoje que a abertura da presidente da Comissão Europeia e candidata a um segundo mandato quanto aos conservadores abre a porta a uma maioria sem os socialistas, inédita no Parlamento Europeu.
A posição de Ursula Von der Leyen (Partido Popular Europeu, centro-direita, PPE) ficou expressa na quinta-feira, no terceiro e último debate antes das eleições ao Parlamento Europeu, quando disse trabalhar "muito bem" com a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, líder do partido dos conservadores europeus, qualificando-a como "pró-europeia".
Durante o debate, organizado pelo Parlamento Europeu e pela União Europeia de Radiodifusão, a candidata principal do centro-direita traçou as suas 'linhas vermelhas'.
"Penso que é muito importante estabelecer princípios muito claros com quem queremos trabalhar no que toca a deputados do Parlamento Europeu [...], que devem preencher três critérios: ser pró-Europa, pró-Ucrânia - ou seja, anti [Vladimir] Putin [Presidente russo] - e pró-Estado de Direito", disse a 'spitzenkandidat' do PPE, a que pertencem o PSD e CDS-PP portugueses.
Em declarações à Lusa, o professor da HEC Paris considerou que "a abertura de Von der Leyen a Meloni sugere uma reconfiguração da direita e extrema-direita na Europa".
"Isto pode conduzir a uma tentativa do PPE de formar uma maioria sem os Socialistas&Democratas [S&D, que inclui o PS português]", referiu.
Tal significaria, "pela primeira vez", o fim da chamada 'grande coligação' até agora composta pelos eurodeputados do centro-direita, socialistas e liberais (Renovar a Europa Agora) e que, segundo as projeções, conseguirão assegurar uma maioria absoluta no Parlamento Europeu, apesar da previsível subida da extrema-direita nas eleições marcadas de 06 a 09 de junho.
Socialistas e liberais já avisaram Von der Leyen que não apoiarão a sua reeleição caso esteja disposta a cooperar com o ECR -- cenário que complica as suas possibilidades de cumprir um segundo mandato.
Também Sophia Russack, do Centro para Estudos de Política Europeia, destaca a posição de Von der Leyen sobre Meloni como o mais relevante do debate.
"Von der Leyen tentou distanciar-se da ID", considerou à Lusa, mas, quanto à líder dos conservadores europeus, a candidata do PPE "teve de admitir que é uma parceria de confiança e totalmente aceitável" e, portanto, "está disponível para fazer vista grossa ao que acontece a nível nacional".
"Meloni é moderada a nível da União Europeia e não tanto ao nível nacional, e Von der Leyen reconheceu que vê isso, mas que tem de fazer vista grossa de forma a mantê-la como uma parceira confiável a nível europeu", comentou Sophia Russack.
Durante o debate, instada a comentar posições de Meloni sobre direitos das pessoas LGBTI, Von der Leyen apontou ter "abordagens completamente diferentes".
Quem parece beneficiar desta posição da atual presidente da Comissão Europeia, na opinião da investigadora, é o candidato principal socialista, Nicolas Schmit, também comissário europeu do Emprego e Direitos Sociais, que "capitaliza o facto de ela querer cooperar com o ECR e distancia-se, o que é uma boa estratégia".
Numa análise solicitada pela Lusa, o grupo de reflexão Friends of Europe lamentou que "tal como no passado, e ao longo de décadas, parece que a direita e a extrema-direita dominam o debate e definem a agenda do debate, apesar de não estarem presentes".
Os partidos políticos dos Conservadores e Reformistas Europeus (ECR) e da Identidade e Democracia (ID, extrema-direita) não participaram por não terem apresentado um cabeça-de-lista.
"Como sempre, o centro e o centro-esquerda respondem a esta agenda e tornam-se mais restritos e defensivos em questões de migração e direitos humanos. Tendo em conta os graves e significativos problemas económicos, políticos e geopolíticos que a Europa enfrenta, juntamente com o impacto das alterações climáticas e da Inteligência Artificial, nenhum dos debates se debruçou sobre as questões essenciais para as pessoas e as comunidades em toda a Europa", criticou o 'think tank'.
O Friends of Europe duvida também da eficácia destes debates entre 'Spitzenkandidaten' na motivação para os quase 400 milhões de eleitores europeus irem votar dentro de duas semanas.
"É altamente improvável que estes debates tenham qualquer impacto nos eleitores de toda a Europa, até porque duvidamos muito que eles ouçam para além dos primeiros três minutos. Estes debates e os processos que lhes estão subjacentes são mais um lembrete de como a UE está afastada da realidade da vida das pessoas comuns. Existe no sistema da UE a presunção de que é relevante. Infelizmente, estes debates e todo o processo Spitzenkandidat revelam, uma vez mais, que a UE está fora da realidade", comentou.