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Eleições, desinformação e engano

Há já alguns anos, fiquei impressionada com um artigo de Hancock Cornell sobre o engano, intitulado ‘Engano Digital: Porquê, Quando e Como as Pessoas Mentem Online’, que referia que, “segundo alguns estudos, em média, as pessoas contam uma a duas mentiras por dia”, sendo que “essas mentiras podem ser sobre coisas insignificantes ou graves, incluindo enganos que envolvam amigos e familiares, e podem ocorrer no local de trabalho, no poder ou na política”.

Porque vos falo deste artigo? Porque estamos em plena campanha para mais umas Legislativas Regionais e em vésperas de Eleições Europeias. Mais do que nunca, devemos estar atentos à desinformação, que tem como principal finalidade enganar. Como tal, não podemos esquecer a importância de distinguir os conteúdos verdadeiros dos falsos, cientes de que cada um de nós assume um papel determinante na deteção de conteúdos desinformativos.

A página web das eleições europeias do Parlamento Europeu resume que “a desinformação pode ser uma ameaça para a sociedade porque pode comprometer a democracia, distorcer o debate democrático, polarizar a sociedade e dificultar a escolha democrática dos cidadãos sem interferências nem manipulações”.

Então, porque o nosso voto espelha a nossa oportunidade de participação cívica e democrática, não podemos deixar-nos enganar. E seria um engano também decidir pela abstenção, pois, se não comparecermos na mesa de voto, não estaremos a escolher e a decidir, deixando que os outros o façam por nós.

Convém estarmos atentos e, antes de partilharmos qualquer conteúdo, devemos refletir primeiro, verificando a fonte, ou seja, tentando perceber de onde vem aquela informação que nos chegou às mãos. Podem mesmo haver sinais claros de engano que podem ser facilmente detetados através de uma pesquisa em fontes confiáveis sobre o mesmo assunto ou mediante a confirmação da data da publicação. Também podemos procurar imagens nos motores de busca com o intuito de perceber se estas já foram utilizadas noutros contextos. Devemos, ainda, duvidar de conteúdos extremamente sensacionalistas, por vezes demasiado bons para serem reais e com escrita pouco cuidada. Os rumores também são usados para desinformar. Não nos devemos deixar enganar pelo “diz que disse”. É imperativo confrontar as informações e tentar validar o que se ouve.

Muitas vezes, deixamo-nos influenciar emotivamente porque determinados conteúdos desinformativos são partilhados pela nossa rede de contactos confiáveis, seja por mensagem privada ou através de publicações. Mas a proliferação pode dar-se por conveniência, ainda que esta seja inconsciente. Outro aliado da desinformação são os algoritmos, que ajudam as redes sociais, as plataformas e os motores de busca a filtrar os conteúdos, consoante os interesses de quem a propaga. A desinformação pode surgir disfarçada em conteúdos humorísticos que ridicularizam normalmente figuras públicas com o intuito de atingir as organizações, já sejam empresas, marcas ou instituições.

Felizmente, verificam-se alguns esforços no combate à desinformação política. Recentemente, entrou em vigor o Regulamento sobre a transparência e o direcionamento da propaganda política, que determina que a publicidade política deve ser claramente identificada como tal, indicando quem pagou por esta, a que preço e a que processo eleitoral ou legislativo esta diz respeito e se se trata de publicidade direcionada. Desta forma, o cidadão pode identificar a origem das publicações que pretendem influenciar as suas opiniões e decisões políticas, sendo que se proíbe, ainda, a utilização abusiva de dados pessoais e o patrocínio de publicidade proveniente do exterior da União Europeia (UE) nos três meses que antecedem a eleição ou referendo.

Como habitualmente, sobretudo antes de escrutínios, diferentes organismos europeus têm lançado diversas campanhas sobre a desinformação, com ações de sensibilização em todos os Estados-Membros.

Também merece destaque que a Google e o Youtube anunciaram medidas para combater a desinformação nas eleições europeias. A Google Portugal assegura no seu blog que “o nosso objetivo é continuar a trabalhar em conjunto em temas-chave, incluindo a literacia mediática, o envolvimento cívico e a desinformação no contexto da inteligência artificial (IA)”.

Precisamente a utilização de IA na deteção de conteúdos desinformativos tem gerado alguma preocupação. Depois dos alertas de especialistas sobre o perigo que pode constituir o lançamento apressado de soluções de inteligência artificial generativa para a deteção de desinformação, uma vez que estas poderiam pôr em risco processos eleitorais, a Google introduziu mais restrições no seu ‘chatbot’ Gemini.

Infelizmente, pese todas as medidas em prol da luta contra a desinformação, têm sido noticiadas interferências estrangeiras nas Eleições Europeias, nomeadamente da Rússia e da China, e os interesses económicos parecem vir sempre ao de cima quando se trata de receitas advindas de publicidade…