Kosovo critica Conselho da Europa por não promover votação sobre a sua adesão
O Kosovo criticou ontem a decisão do Conselho da Europa de não promover a votação sobre a sua adesão, ao argumentar que retira "ao seu povo e minorias étnicas os instrumentos democráticos" disponibilizados por esta organização pan-europeia.
A adesão do Kosovo ao Conselho da Europa não foi incluída na agenda de trabalhos da reunião de hoje do Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros dos Estados-membros da organização, e após diversos dos seus membros terem pedido ao Kosovo para aceitar a formação de uma associação de municípios sérvios no norte do país, onde são maioritários, antes de uma eventual votação.
A ministra dos Negócios Estrangeiros kosovar, Donika Gervalla-Schwarz, disse que diversos países optaram pela posição da Sérvia após "uma campanha lobista contra a adesão do Kosovo".
Na quarta-feira, o Presidente francês, Emmanuel Macron, o chanceler alemão, Olaf Scholz, e a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, consideraram que a iniciativa do Kosovo para aderir ao Conselho da Europa era "inapropriada" e que a sua adesão à organização de defesa dos direitos humanos "arrisca" não ter sucesso.
"A bola está no vosso campo", advertiram os três dirigentes europeus numa carta enviada ao primeiro-ministro kosovar, Albin Kurti, com data de quarta-feira e hoje confirmada pelo Eliseu (presidência francesa).
Apesar de se ter comprometido na criação da associação de municípios, Pristina ainda não legitimou o projeto de estatuto redigido no âmbito do diálogo com a Sérvia.
O acordo foi assinado por Belgrado e Pristina em 2013, mediado pela União Europeia (UE), e prevê a criação de uma associação de 10 municípios onde os sérvios são maioritários. No texto, prevê-se uma autonomia nas áreas da saúde, educação e cultura, entre outros setores.
Albin Kurti, que não ocupava o poder em 2013, tem argumentado que o acordo implica a concessão de um estatuto de autonomia à minoria sérvia do Kosovo -- atualmente cerca de 120.000 dos 1,7 milhões de habitantes --, e o respetivo enfraquecimento do governo central de Pristina.
Na quinta-feira, e num último esforço para convencer os países ocidentais a promoverem a votação, Donika Gervalla-Schwarz enviou uma carta a Theodoros Rousopoulos, que dirige a Assembleia parlamentar do Conselho da Europa, onde sugeria a apresentação de um ante projeto-lei "para a criação de um mecanismo de autogestão, de coordenação e de cooperação dos municípios de maioria sérvia no Kosovo", mas que não foi considerado.
Na ocasião, a Sérvia, que se opõe ao reconhecimento internacional do Kosovo, a sua antiga província do sul, criticou de imediato a proposta kosovar.
Em comunicado, o chefe da delegação negocial sérvia, Petar Petkovic, acusou Albin Kurti de pretender "evitar o cumprimento das suas obrigações" incluídas no acordo de 2013 e de atuar de forma unilateral.
O Kosovo, uma província autónoma do sul da Sérvia, autoproclamou a independência em 2008, nunca reconhecida por Belgrado, e a permanência das tensões poderá comprometer as ambições das duas capitais sobre uma futura adesão à UE.
As tensões entre a Sérvia e o Kosovo permanecem muito elevadas 15 anos após o final da guerra, na sequência de uma intervenção militar da NATO contra Belgrado em 1999, suscitando receios sobre o reacender do conflito e a abertura de uma nova frente de desestabilização na Europa enquanto prossegue a guerra na Ucrânia.
A normalização das relações entre a Sérvia e o Kosovo, mediadas pela UE, permanece num impasse, em particular após os confrontos em setembro passado entre uma milícia sérvia e a polícia kosovar que provocou quatro mortos e agravou as tensões na região.
Na sequência deste incidente, a Kfor, a força multinacional da NATO no Kosovo e presente no território desde 1999, reforçou a sua presença no terreno e possui atualmente cerca de 4.800 efetivos.
O Kosovo independente -- que a Sérvia considera o berço da sua nacionalidade e religião -- foi reconhecido por cerca de 100 países, incluindo os Estados Unidos, que mantêm forte influência sobre a liderança kosovar, e a maioria dos Estados-membros da UE, à exceção da Espanha, Roménia, Grécia, Eslováquia e Chipre.
A Sérvia continua a considerar o Kosovo como parte integrante do seu território e Belgrado beneficia do apoio da Rússia e da China, que à semelhança de dezenas de outros países (incluindo Índia, Brasil, África do Sul ou Indonésia) também não reconheceram a independência do Kosovo.
O Conselho da Europa foi criado em 1949 para defender os Direitos Humanos, a Democracia e o Estado de direito e integra atualmente 46 Estados-membros, incluindo todos os países que compõem a UE.