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França impõe estado de emergência na Nova Caledónia devido a confrontos mortais

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O Governo francês anunciou ontem que vai decretar o estado de emergência no território autónomo da Nova Caledónia, no Pacífico, durante pelo menos 12 dias, reforçando os poderes policiais para travar a violência que já fez quatro mortos.

A porta-voz do Governo francês, Prisca Thevenot, anunciou a decisão após uma reunião do Conselho de Ministros hoje à tarde, em Paris. A decisão surge na sequência de dias de distúrbios naquele território do Pacífico sul e daquilo que Thevenot descreveu como "cenários de caos", com quatro mortes registadas, entre as quais a de um agente dos serviços de segurança.

As medidas de emergência conferem às autoridades mais poderes para combater os tumultos, incluindo a possibilidade de colocar em prisão domiciliária pessoas consideradas uma ameaça à ordem pública no território, onde os partidários da independência há muito lutam para se libertarem de França.

"A prioridade é repor a ordem, a calma e a serenidade", disse a porta-voz do executivo francês.

O estado de emergência entrará em vigor às 05:00 de hoje na Nova Caledónia (19:00 em Lisboa).

Mais de 300 pessoas ficaram feridas desde segunda-feira, altura em que os protestos contra uma revisão constitucional promovida por Paris, que altera o recenseamento eleitoral, retirando peso aos povos autóctones, se tornaram violentos. Segundo as autoridades francesas, foram efetuadas mais de 130 detenções.

Há décadas que existem tensões no arquipélago entre os indígenas Kanaks, que pretendem a independência, e os descendentes dos colonizadores, que querem continuar a fazer parte de França.

Foi ordenado o envio de reforços policiais para o território, para ajudar as forças de segurança locais, que se têm confrontado com manifestantes violentos. O Ministério do Interior disse que mais 500 agentes são esperados dentro de algumas horas no arquipélago para reforçar os 1.800 polícias e guardas nacionais que já lá se encontram.

Os distúrbios desta semana começaram quando o parlamento francês debatia em Paris a alteração da Constituição francesa para modificar os cadernos eleitorais na Nova Caledónia.

Hoje, a Assembleia Nacional aprovou um projeto de lei que, entre outras alterações, permite que os residentes na Nova Caledónia há dez anos possam votar nas eleições provinciais.

Os opositores dizem que a medida beneficiará os políticos pró-França na Nova Caledónia e marginalizará ainda mais o povo indígena Kanak, que no passado foi alvo de uma política de segregação rigorosa e discriminação generalizada.

O vasto arquipélago de cerca de 270.000 habitantes situado a leste da Austrália está dez fusos horários adiantado em relação a Paris.

Na capital, o Presidente francês, Emmanuel Macron, sublinhou hoje a necessidade de diálogo político, e os partidos políticos adversários locais emitiram um apelo conjunto para a calma na Nova Caledónia, afirmando num comunicado: "Temos de continuar a viver juntos".

O recolher obrigatório durante a noite na Nova Caledónia foi prolongado até quinta-feira, e as escolas e o principal aeroporto permaneceram hoje fechados, indicou o representante do Governo francês no território, o Alto-Comissário Louis Le Franc, acrescentando que alguns moradores da capital e dos municípios vizinhos formaram "grupos de autodefesa" para proteger suas casas e estabelecimentos comerciais.

A Nova Caledónia tornou-se francesa em 1853, sob o comando do imperador Napoleão III, sobrinho e herdeiro de Napoleão. Tornou-se um território ultramarino após a Segunda Guerra Mundial, tendo sido concedida a nacionalidade francesa a todos os Kanaks em 1957.

Em 1988, foi celebrado um acordo de paz entre as fações rivais. Uma década depois, França prometeu atribuir à Nova Caledónia poder político e ampla autonomia e organizar até três referendos sucessivos.

Os três referendos realizaram-se entre 2018 e 2021, e a maioria dos eleitores optou por continuar a fazer parte de França, em vez de apoiar a independência.

O povo Kanak, pró-independência, rejeitou os resultados do último referendo de 2021, que boicotou por ter sido realizado no pico da pandemia de covid-19.