A educação em Portugal: de bestial a besta
Já lá foi o tempo em que a profissão de professor(a) era considerada nobre, valorizada e respeitada por muitos. Com a mudança do século verificou-se um crescimento acelerado nas novas tecnologias e surgiram novas ferramentas de trabalho. Do quadro negro às máquinas de escrever passamos para os computadores, a internet, os quadros interativos, os tablets, … Sem dúvida que estas inovações trouxeram grandes descobertas e facilitismos no ensino, no entanto, as imagens animadas, os vídeos, as aulas online (consequência da pandemia) e os manuais digitais nem sempre contribuíram para um melhor sucesso académico. A sede do saber e aprender deu lugar à sede do sedentarismo, da prepotência, do “deixar andar”, do abuso do poder, do facilitismo e da comodidade. Das palavras escritas e ouvidas deu-se lugar às palavras estéreis, vazias de conteúdo e significado, à falha na comunicação, ao pouco diálogo, à falta de socialização.
A linguagem dos jovens, hoje em dia, é violenta, agressiva, antipedagógica, lançada como punhais aos mais vulneráveis e sensíveis. Vivemos numa sociedade onde todos pensam que mandam, que só têm direitos e não deveres! Onde não há respeito pelos mais velhos, pelos que detêm o saber e a experiência. Critica-se para humilhar, rebaixar, não para construir ou edificar, com uma maldade e inveja avassaladoras, bem visíveis nas escolas e redes sociais. Depois surgem as depressões, a ansiedade, os comportamentos auto lesivos e outros distúrbios psicológicos (tanto de crianças, jovens como adultos), os sentimentos de culpa, os internamentos e, por vezes, os suicídios.
O telemóvel, objeto fruto deste século, é essa besta, essa “arma ou droga” que está a afastar a humanidade, a afetividade, a reflexão crítica, a cidadania, a motricidade fina, a criatividade, o desenvolvimento cognitivo e social. As competências básicas e essenciais de um ser vivo pensante, sensível e ativo estão seriamente comprometidas. Interfere até, com o relacionamento familiar onde, coabitando no mesmo cubículo ou, habitação, não existe diálogo nem comunicação. O rendimento escolar agrava-se e as relações sociais degradam-se e agudizam-se, cada vez mais. Estes dispositivos digitais e os seus conteúdos são construídos de forma a viciar. “Proporcionam uma exposição constante a estímulos altamente recompensadores, que desregulam a dopamina — um neurotransmissor associado à sensação de prazer. O cérebro habitua-se a esse tipo de sobre estimulação e torna-se cada vez mais difícil envolver a criança ou interessá-la por atividades ou tarefas que envolvam estímulos menos imediatos” (Pedro Bem-Haja, do Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde - CINTESIS). Segundo um último estudo do PISA (Programme for International Student Assessment, a maior avaliação internacional na área da educação) 45% dos jovens de 15 anos disseram sentir-se nervosos ou ansiosos quando não tinham os seus telemóveis por perto. Segundo outro estudo feito com a APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) 93% dos jovens têm acesso, no seu quarto, a ecrãs durante a noite e, 55% referem que costumam aceder imediatamente antes de adormecer.
A todas as instituições e educadores, pais e professores, é importante estarem alertas e conscientes das consequências nefastas do uso contínuo e viciante do telemóvel. A banalização da violência trazida pelos meios de comunicação social e alguns videojogos pode estar a contribuir para uma diminuição da capacidade de empatia que, já se nota em muitos adolescentes e, para os perigos das redes sociais, que funcionam como um “campo aberto para a expressão de emoções negativas” e a não distinção entre ficção e realidade, maldade e bondade, ódio e amor, … a ausência de valores tão fundamentais no crescimento do ser humano!
Os próprios adultos devem repensar a sua ligação com os telemóveis e preocupar-se mais com a relação efetiva, sólida e salutar com os seus educandos e os demais. Todos ficamos a ganhar!
Dalila Vieira