Uma vida consciente esconde-se nas respostas às perguntas certas
A (re)conexão connosco e a conexão com os demais é a principal fonte do nosso bem estar e autoestima saudável. Perceber isso faz toda a diferença na maneira como lidamos uns com os outros. É nessa conexão que reside a segurança necessária para podermos aprender, refletir e pensar de forma empática e lógica. Dar lições de moral nos momentos de intensidade emocional só prejudica os relacionamentos. Por isso, primeiro o abraço. A seguir, o diálogo que abre espaço para aprendizagens e transformações. Ou seja, primeiro a regulação, depois a relação
É raro o dia em que não recebo questões relacionadas com parentalidade e educação. Às vezes, chegam de pessoas que leram algum dos meus livros, ou que pretendem ser minhas alunas. Outras, são perguntas de curiosos acerca da Parentalidade Generativa ou então, dos que alegam já terem experimentado tudo só que ‘nada funciona’. Fico sempre muito agradecida por ver que tantas pessoas escolhem partilhar comigo uma área tão essencial das suas vidas. Aquela que, acredito, tem o poder de transformar o mundo num lugar melhor.
Já partilhei noutras crónicas Essencial que os maiores especialistas mundiais na área da educação dizem-nos que as nossas principais mazelas (emocionais) acontecem na infância. As vozes dos nossos pais, inicialmente externas, e que por assimilação e esquecimento tornam-se vozes internas, às quais damos o crédito de verdades absolutas, como se fossem a nossa identidade. Quando nasce um bebé não nasce uma mãe, não nasce um pai. Nós aprendemos sobre parentalidade através da forma como os nossos cuidadores se relacionaram connosco e das práticas culturais na sociedade onde crescemos. E é natural que questionemos hábitos antigos. Só assim é possível nutrir o que funciona e quebrar padrões disfuncionais.
O que noto é que, a intenção comum, de quem me faz perguntas é a de ser melhor mãe, melhor pai, melhor educador, melhor professor. No fundo, melhor ser humano. Na verdade, fazemos sempre todos o melhor que podemos e sabemos, com os recursos aos quais conseguimos aceder a cada momento. É um princípio basilar da neurolinguística (PNL) que, aplicado em consciência, gera mais serenidade e abre espaço a assumir responsabilidade pessoal. Agora, que sabemos isto, o convite da crónica Essencial de hoje, é o de explorarmos juntos quatro questões, das várias que utilizo para responder às perguntas que me colocam.
Antes, dizer apenas que se queremos o melhor dos nossos filhos, alunos, educandos, oferecemos-lhes o nosso melhor. Aliás, é assim em qualquer interação, é válido para qualquer relacionamento! Se queremos receber o melhor dos outros, é bastante claro que ajuda, e muito, se oferecermos também o nosso melhor. E, quando isso acontece, o interessante paradoxo é que também criámos um espaço seguro para o nosso menos bom ou “pior”. Talvez por isso, sejam muitos os que me questionam se o que estão a fazer é certo ou errado. Querem saber quais são as fórmulas e métodos certos e errados para agirem em diversas situações. Só que a Parentalidade Generativa não é sobre fórmulas, não é sobre métodos. É sobre conexão. É um regresso a casa, a quem somos, dentro de nós. À reparentalidade. E, a partir daí, já reeducados, construirmos e nutrirmos relações conscientes, generativas e únicas. Até porque, é na relação (na qualidade da mesma) que reside a solução dos desafios diários. Mais uma vez, isto é válido na parentalidade e em todos os contextos das nossas vidas. Não é ser perfeito, ou até pode ser - sermos perfeitos nas nossas imperfeições.
Não é possível controlar tudo. Vai haver sempre momentos e dias mais fácies, outros mais desafiantes. Há progressos e retrocessos nesta caminhada. Momentos de amor e serenidade, outros de neura, em que questionamos tudo. O que fazemos, o que achamos que sabemos. E é mesmo assim nas relações. É assim na vida. Portanto, tal como não há fórmulas mágicas a aplicar para resolver todos os desafios, também não há crianças iguais (nem adultos). O que há são crianças únicas. Adultos, mães, pais, educadores, professores, únicos. Cada um de nós traz uma impressão digital única, não é por acaso. Há portanto, relacionamentos únicos. E por isso, há também diferentes formas de observarmos, refletirmos, de pensarmos, estarmos e de nos relacionarmos. Não precisamos de salvar os nossos filhos, precisamos apenas de ser porto de abrigo seguro. Cabe-nos por exemplo, oferecer espaço para acolher as emoções desafiantes deles, conversar sobre as estratégias que usaram e que funcionaram, as que não funcionaram e quais podem ser introduzidas da próxima vez. Outro ponto fulcral é o de que: é um facto que a lógica e a razão de pouco ou nada servem na grande maioria dos momentos de real desafio com os nossos filhos. Isso é um mito que nasce de uma necessidade de controlo. Só que quando as emoções intensas tomam conta, perdemos a capacidade de pensar de forma clara e lógica. Nesses momentos, a única coisa que precisamos (todos) é de presença, amor, empatia, gentileza e segurança emocional. Sejamos adultos ou crianças. Agora, partilho quatro perguntas que nos ajudam a refletir conscientemente:
1. Utilizaria a mesma estratégia se o desafio fosse com um adulto?
Quem pratica Parentalidade Generativa integrou a prática da igual dignidade, sabe que todas as pessoas têm o mesmo valor. Todas as necessidades, todos os desejos, todos os pensamentos, emoções, sentimentos e todas as opiniões dos bebés, crianças, adolescentes, jovens, adultos…, têm exactamente o mesmo valor que todas as necessidades, todos os desejos, todos os pensamentos, emoções, sentimentos e todas as opiniões que nós próprios temos. Isto é muito diferente de ser permissivo. Não significa fazer sempre o que a criança (ou adulto) quer, significa só que o valor é o mesmo. A intenção desta pergunta é descobrir qual é a estratégia que nos leva a fazer o que estamos a fazer a uma criança e não a um adulto. Qual é a diferença que faz a diferença? O que estamos a fazer parte do pressuposto que a pessoa à nossa frente tem o mesmo valor que nós? Dir-lhe-íamos o mesmo se fosse um adulto? Davamos-lhe uma palmada? Colocavamos de castigo (disfarçado de ‘time-out’)?.. Se as respostas são ‘não’ é porque existem alternativas.
2. A estratégia está alinhada com os meus valores e com as minhas intenções?
É essencial conhecermos, definirmos e incorporarmos os nossos valores e intenções. Vão guiar-nos nesta caminhada e para sempre. Até porque, só podemos validar se algo é certo ou errado - para nós - quando conhecemos os nossos valores e intenções. Sim, também na parentalidade. A partir daí é fácil perceber se o que estamos a pensar, dizer, fazer está ou não alinhado. Se a resposta for “não está alinhado com as minhas intenções e valores”, procuramos uma forma diferente de fazer.
3. Como é que me sentiria se alguém fizesse o mesmo comigo?
A intenção base desta pergunta vai ao encontro da igual dignidade. Se a resposta for “sentia-me mal, envergonhado, com medo, assustado” ou algo do género, então, está na hora de encontrar outro caminho.
4. Qual é a verdadeira aprendizagem que o meu filho/ aluno/ educando… está a fazer?
Tendemos a utilizar muitas estratégias que condicionam o outro. Têm na base os nossos “achismos” sobre o que é que a criança deveria aprender. Só que, a neurociência e neuropediatria do desenvolvimento infantil já reveleram que as aprendizagens que gostávamos que a criança fizesse, podem não ser as que de facto, está a fazer. Se a criança é colocada de castigo para aprender a não repetir o mesmo “disparate”, aprende, por exemplo, que as suas necessidades não têm o mesmo valor que as nossas, aprende que só tem valor quando se comporta de uma determinada maneira, quando agrada, pode aprender que é melhor mentir do que dizer a verdade, que nem todas as necessidades e emoções são boas, que nem todas são aceites, pode aprender também, que o adulto raramente, ou nunca, se preocupa com os seus estados emocionais, sentimentos e com as suas necessidades e que o comportamento em si, e o que os outros vão dizer é mais importante. Aprende isto e muito mais. Quem bate nos filhos, dá o exemplo e ensina que a violência é adequada e é a solução em diversas situações. Que o mais forte tem o direito de bater e humilhar o mais vulnerável. Se gritamos quando os nossos filhos não fazem o que queremos eles aprendem que pode ser necessário gritarem para conseguirem o que querem. Acontece o mesmo quando é utilizada a estratégia de ignorar o outro. Se ao refletirmos sobre as aprendizagens concluirmos que não são as que queríamos que os nossos filhos fizessem, está na hora de encontrar novos rumos.
Boa investigação!